Coloquei abaixo o trecho de um email, que escrevi a uma dessas listas de discussões inúteis (porque, claro, fui provocado), apenas porque nele cito um diálogo imperdível do imperdível filme Waking Life. (E, de quebra, um trecho da Ode à Alegria, de Schiller, musicada por São Beethoven na Nona.) Já o assunto principal da discussão não vem ao caso…

O EMAIL

(…)

Quanto a Deus pôr ou não virtude no mundo, Paulo, não é assim que acontece. Nesse ponto a Andréa tem razão. Simplesmente porque o Cara não impõe nada, oferece. Virtude? Quem a aceitar aceitou, quem não a aceitar dançou. (Ohohohohoho!) Viva o livre arbítrio! E, aliás, um dos melhores textos a falar sobre isso é aquele roteiro, que você mesmo me enviou, do excelente Waking Life. (Quem não assistiu a esse filme tem que assistir.)

– So I’m walking along, and Lady Gregory turns to me and says, “Let me explain to you the nature of the universe. Philip K. Dick is right about time, but he’s wrong that it’s 50 A.D. Actually, there’s only one instant, and it’s right now, and it’s eternity. And it’s an instant in which God is posing a question, and that question is basically, ‘Do you want to be one with eternity? Do you want to be in heaven?‘ And we’re all saying, ‘No thank you. Not just yet.’ And so time actually is just this constant saying No to God’s invitation. That’s what time is, and it’s no more 50 A.D. than it’s 2001. There’s just this one instant, and that’s what we’re always in.” Then she tells me that actually, this is the narrative of everyone’s life. That behind the phenomenal differences, there is but one story, and that’s the story of moving from No to Yes. All of life is like, “No thank you, no thank you, no thank you,” then ultimately it’s, “Yes, I give in, yes, I accept, yes, I embrace.” That’s the journey. Everyone gets to Yes in the end, right?

– Right.

Pois é, até o Douglas aí, que escreveu aquele livro ateu sobre Deus, aquele que o Papa usa pra acender a lareira, saca?, pois é, até o Douglas um dia vai dizer YES, SIR!! (Ohohoho!)

Outra coisa, Paulo, não há o menor sentido nisso que você disse: “Deus (…) não se esqueça (…) do Yuri, que tem tanta certeza de sua existência que talvez vc saia célere da cabeça dele sem olhar pra trás”. Isto tampouco existe, Pauleira, dizer sim pra Deus, quando sincero, é definitivo, é como dizer EU SOU e, quando se é, é-se apenas com Ele, sacou?

Pra encerrar esse papo, leiam esse trecho do poema do Schiller (Ode à alegria), que São Beethoven musicou no quarto movimento da Nona. (E que eu estou, desafinadamente, e para desespero da Cássia, aprendendo a cantar. Falando nisso, o Calaça aí deve estar com saudade das minhas cantorias lá da UnB, né não?)

Froh, wie seine Sonnen fliegen
Com alegria, como os corpos celestes
Durch das Himmels pracht’gen Plan,
Que Ele colocou em seus cursos pelo esplendor do firmamento
Laufet, Bruder, eure Bahn,
Então, irmãos, sigam seus caminhos
Freudig wie ein Held zum Siegen.
Alegres, como um herói rumo à conquista.

Freude, schöner Götterfunken
Alegria, linda faísca divina!
Tochter aus Elysium
Filha de Elysium
Wir betreten feuertrunken,
Inspirados pelo fogo, nós marchamos
Himmlische, dein Heiligtum.
Divino, Teu santuário
Deine Sauber binden wieder,
Tua magia reúne
Was die Mode streng geteilt;
O que o costume severamente separou
Alle Menschen werden Brüder,
Todos os homens se tornam irmãos
Wo dein sanfter Flügel weilt.
Sob o suave balanço de Tua asa.

Seid umschlungen, Millionen!
Milhões, um abraço à vocês!
Diesen Kuß der ganzen Welt!
Este beijo é para todo o mundo!
Bruder – uberm Sternenzelt
Irmãos – acima da cúpula estrelar
Muß ein lieber Vater wohnen.
Deve morar um Pai que nos ama.

Ihr stürt nieder, Millionen?
Milhões, vocês se ajoelham?

Ahnest du den Schopfer, Welt?
Vocês percebem o Criador, Mundo?
Such ihn uberm Sternenzelt!
Procurem-No nos céus!
Uber Sternen muß er wohnen.
Ele deve morar além das estrelas.

Pronto, já fiz a pregação do semestre. Agora só em Janeiro.
Milhões, de vós me despeço!
Abração
Yuri

[Ouvindo: 9th Symphony (4th) Presto, All – Beethoven]