Começou a desejar muito tornar-se amigo do tempo.

Antes, tinha atrás o passado, que mirava com nostalgia, e adiante o futuro, incerto oceano de ansiedade e risco. No romance retrospectivo, cada passo adiante fora uma perda. De acúmulo, só o descarte, o que não tinha, as bifurcações abandonadas. Nas mãos, um imenso vazio. O presente se convertera em um buraco sem beira nem fundo que terra nenhuma poderia preencher. O futuro, um infinito monte de terra sem buraco à vista.

Mas depois entendeu que o tempo, o tempo mesmo, é só o presente, o aqui e o agora.
Entendeu que o tempo podia ser amigo, ou antes, que o tempo era ele mesmo – ponte, salto, curto-circuito, fagulha, arremesso, passe, marioneteiro, equilibrista equilibrando dois pratos sobre as varetas.

Ficou mais calmo.