Lula será reeleito. Dito assim parece até um vaticínio do Jucelino – farei um post sobre essa tara do pessoal por metafísica barata um dia, podem esperar! -, mas é o que indicam as pesquisas neste final de campanha. Até o obstinado Reinaldo Azevedo já derrubou o rei. Segundo os mais alarmados, viveremos dias sombrios nos próximos anos, cercados pelo mal e governados por uma quadrilha de imorais. Dá quase para se ouvir: “a única saída é o aeroporto”. Quer saber? Morro de preguiça desse tom apocalíptico.
Mais interessante é pensar as estratégias para o que virá. E ao fazê-lo, devo exercer meu quinhão de “pensamento crítico”, embora o velho iluminismo não esteja lá muito em voga por estas bandas, sufocado que está pelo neo-obscurantismo tupiniquim. O velho relojoeiro cego novamente a rabiscar seus desígnios nas areias do tempo.
Chega de proselitismo. Com o fim da campanha, acaba também o clima para a enfadonha clivagem moral construída pela retórica do conflito. Reinaldo Azevedo é exemplo perfeito: “votar contra o PT é uma obrigação moral”. Como se fosse possível avaliar a moralidade de um sujeito unicamente pela decisão em votar neste ou naquele candidato. A moralidade é um sistema complexo de valores cuja atualização se dá na relação com o outro a partir da ação individual. No voto pensa-se estrategicamente e não eticamente, porque as decisões estão pautadas pelas necessidades economicas imediatas dos indivíduos, e não meramente políticas (deixando barato o fato de que há controvérsias a respeito da relação entre ética e política). A dimensão ética possível neste contexto refere-se à idéia ou conceito de Nação e tem uma perspectiva futura e coletivista e não atual. Assim, quem vota em Lula é imoral porque não age pautado pelos interesses da Nação; ameaça o futuro em nome de um ganho imediato.
O problema é que projeções para o futuro são especulações abstratas com pouco apelo ao presente. O futuro é uma possíbilidade, sempre será. Sua plausibilidade está vinculada à forma como observamos este futuro. É, no máximo, um cálculo de risco.
Só que o eleitor não pensa assim, ele pensa estrategicamente – o que quer dizer: o que eu ganho com isso? Em linguagem mais técnica, ele procura sempre um jogo de soma positiva, buscando maximizar seus ganhos ou diminuir suas perdas. E ele trabalha sempre de uma perspectiva individual. Belo paradoxo: a única coisa capaz de garantir a vitória de Alckmin (ou uma vitória do liberalismo) é apelar para o senso de coletividade dos indivíduos, vinculando a ação atual não ao ganho individual imediato, mas ao ganho futuro; futuro este apenas identificável quando encarnado na idéia de Nação.
Na verdade toda campanha política esforça-se para colocar um preço no futuro. Procura encarecer as opções do adversário e baratear suas próprias. Este é o contexto de toda e qualquer eleição. Para os indivíduos significa uma possibilidade de melhorar sua vida, e o que é importante na vida de milhões de brasileiros? Viver melhor: integrar-se mais ao sistema, consumir mais e melhor – incluindo aí saúde, educação, lazer, etc. É um paradoxo semelhante à questão ambiental: é necessário pagar hoje o preço pelo futuro. Contudo, convencer as pessoas a fazer isso é que são elas.
Dito de outra forma: a possibilidade do Alckmin ganhar está vinculada à capacidade dos indivíduos beneficiados pelas políticas assistencialistas do governo votarem contra seus ganhos imediatos em nome de um possível futuro para o País. Repito: a vida de determinada camada da população melhorou e estas pessoas não estão dispostas a arriscar este ganho imediato em nome do futuro. Mesmo porque elas sabem que daqui a quatro anos terão nova oportunidade de refazer a escolha.
Para terminar, uma informação de bastidores: no primeiro turno a maioria dos eleitores de Goiás votou em Alckmin; ao que tudo indica, neste segundo turno, Lula é quem vai ganhar. Prometo uma cobertura da apuração de domingo aqui no Garganta. Fiquem ligados.