blog do escritor yuri vieira e convidados...

O que é religião?

1ª resposta: olhando por fora:

O que é religião? Como responder essa pergunta sem orar a pedir a ajuda de Deus? Talvez possamos começar nos perguntando o que há de comum entre todas as religiões. Se fizermos essa investigação — e não é tão difícil —, descobriremos, talvez surpresos, que o que há de comum a todas elas curiosamente não é Deus. Ele está de fora de algumas e é plural em outras. Porém, existe uma coisa, um elemento comum que não está de fora de nenhuma religião conhecida, e é ele que nos fornece a chave para compreendermos todas as religiões, inclusive a nossa, caso tenhamos alguma. Trata-se do “depois-da-morte”. Os deuses das várias religiões, divergem infinitamente. Tente comparar, por exemplo, o deus do judaísmo com o deus do cristianismo e você ficará convencido de que jesus e moisés falavam de seres diferentes. No entanto, compare o inferno judaico com o inferno cristão e você verá muita semelhança. Curiosamente, o inferno cristão também se parece bastante com o hades. Mas, pouco importa se eles se parecem ou não, o que importa é o seguinte: o discurso sobre o que há depois da morte está presente em todas as religiões. Todas. Depois da morte há o céu e o inferno, depois da morte há a reencarnação, depois da morte há uma segunda vida, não importa, no momento, qual a sua opção, o que importa é que todas as religiões respondem à questão sobre o que há depois da morte. Assim chegamos a uma definição segura. Não corremos mais o risco de encontrar uma religião e não sabermos mais com o que estamos lidando: religião é um discurso sobre o que há depois da morte.

2ª resposta: olhando por dentro:

O mais interessante é notar que essa definição, não é coerente apenas quando olhamos as religiões de fora, mas também quando as olhamos de dentro. Note só: quem poderia saber o que há depois da morte? Ou alguém que esteve lá ou alguém que conversou com quem esteve lá. Ora, mas todas as religiões são fundadas em experiências nas quais o sujeito, ou vai para o “depois-da-morte”, ou conversa com alguém que está lá. Moisés conversou com Deus, e Deus estava no “depois-da-morte”, por isso mesmo ele podia dizer o que havia lá. Jesus era o próprio Deus e por isso sabia o que havia depois da morte, pois ele mesmo fez aquele lugar. Maomé falou com um anjo, e, sendo anjo, ele também habitava o “depois-da-morte”. Alan Kardec falou com espíritos e eles estavam no depois da morte. Swedenborg falou com anjos e eles estavam no depois da morte. Toda religião é fundada numa experiência sobre-natural na qual o sujeito fundador fala com algum ser que sabe o que há depois da morte, ou então esse sujeito fundador é ele mesmo transportado para o depois-da-morte e volta para nos contar o que há lá. O cristão não vai negar que sua religião lhe revela o que há depois da morte. O judeu também não, o budista também não, o muçulmano também não, etc. E o filósofo ateu também não vai negar que a religião diz o que há depois da morte, com a ressalva de que ele talvez não acredite nisso. Então, quando eu digo que “religião é um discurso sobre o que há depois da morte” não quero reduzir as religiões a isso, pois elas são, obviamente, mais do que isso; quero mostrar qual o traço distintivo da religião, aquilo que ela tem que outras áreas do conhecimento não têm e que a torna o que ela é. Essa definição, como já disse, funciona quando olhamos as religiões a partir de dentro, acreditando nas suas premissas, e funciona quando a olhamos de fora, quando não acreditamos. Você pode não crer em nenhuma religião ou crer simultaneamente em mais de uma, o que você não pode é negar que as religiões – inclusive a sua – dizem o que há depois da morte. E como a morte é um princípio auto-evidente – alguém aí duvida que vai morrer? – podemos dizer que essa definição é filosófica.

Religião e ciência

Agora que sabemos o que é religião fica fácil distingui-la da ciência. Também fica fácil perceber que uma nunca vai substituir a outra. A ciência busca conhecer os fenômenos naturais de forma que seja possível prevê-los com cada vez mais detalhes. A ciência deve ser consultada quando você precisa fazer uma coisa concreta, como construir um navio ou ter um filho. Os cientistas nada podem dizer sobre o que há depois da morte. Aqui termina o domínio deles, e eles mesmos vão correndo consultar sacerdotes se tiverem alguma dúvida sobre isso. Vocês já notaram que os cientistas não gostam do papa mas estão o tempo todo consultando sacerdotes budistas? Isso é porque eles não têm idéia nenhuma do que há depois da morte e sobre isso sabem que precisam consultar alguém de outro domínio. Qualquer ser humano mergulha num terrível estado de ansiedade se não tiver uma resposta — ainda que vaga, ainda que enunciada em termos simbólicos — a essa pergunta. Aliás, é por isso que podemos dizer, com a certeza mais tranqüila do mundo, que, se a religião deixar de existir, ela vai ser rapidamente reinventada. Alguém vai aparecer com uma vaga idéia do que há depois da morte, e como não toleramos a ignorância a esse respeito, vamos acreditar nele – desde que ele nos mostre que essa idéia nos beneficia de alguma forma.

Neste momento lamento muito não me lembrar do nome de um livro que li há algum tempo de uma psiquiatra norte-americana que tratava de jovens viciados. Ela contava que seu maior “concorrente” – concorrente entre aspas, porque ela era paga pela prefeitura e seu cargo não estava sob questão – era um pastor protestante, que também trabalhava na recuperação de jovens drogados. Muitos jovens consultavam a ela e ao pastor, e, depois de um tempo acabavam escolhendo se tratar exclusivamente com o pastor, para espanto e frustração da jovem profissional. Curiosa, ela foi conversar com o pastor e perguntar sobre os métodos dele, e descobriu que, na prática os métodos eram absolutamente os mesmos. No entanto os jovens confiavam mais no pastor, porque ela admitia francamente não saber e nada poder dizer sobre o que havia depois da morte, ao passo que o pastor tinha uma descrição clara e segura desse fenômeno. Por isso volto a dizer: se a religião deixasse de existir, ela seria simplesmente reinventada. Ela atende a uma necessidade básica humana. Você talvez tenha se formado em filosofia e deseje que o estado patrocine o estudo de filosofia nas escolas públicas – assim você terá emprego garantido – porém, mais cedo ou mais tarde você vai admitir que ninguém vive sem religião. Uma vaga noção do que há depois da morte é necessária à vida.


A religião, a ciência e as leis morais

Mas você deve estar dizendo: e as leis morais? As religiões não são também grandes repositórios de leis morais? A resposta é sim, mas esse não é um traço exclusivo delas. As filosofias e a própria ciência também podem propor leis morais. A diferença é que a religião é a única que pode dizer que, se você as cumprir, você terá um lindo lugar depois da morte, ao passo que a ciência e a filosofia podem apenas demonstrar que, se todos as cumprirem, haverá estabilidade social e psíquica. Muitos filósofos modernos propõem que as leias morais sejam pregadas apenas com princípios filosóficos e não com princípios religiosos. E isso pode ser feito? Meu Deus, é claro que pode. Até mesmo uma ciência limitada como a psicologia – digo limitada sem nenhum desprezo, apenas descrevo um fato – pode explicar os 10 mandamentos. Basta você imaginar que está dando essas ordens a pessoas próximas a você. O que você diria a alguém que está perto de você: ame o seu próximo ou odeie o seu próximo? O que você diria a seu empregado: você me roubará, ou você não me roubará? O que você diria a sua amada: você me trairá ou você não me trairá? Basta isso para você entender filosoficamente os dez mandamentos. Eles são apelos retóricos, não no sentido de que sejam falsos, mas no sentido de que são descrições de desejos e não descrições de fatos. Em outras palavras, nós pregamos os dez mandamentos porque queremos que os outros os cumpram, não porque queiramos cumpri-los. É claro que acabamos por cumpri-los também, porque intuímos, nem que seja vagamente, que se todos os descumprissem nossa vida seria um caos. As pessoas tendem a imitar umas às outras: se você roubar, vão roubar também, e uma hora você vai ser o objeto e não o sujeito do ato. É por isso que procuramos não roubar ou, se roubamos, fazemos de tudo para que nosso ato não seja público. Essa é a lei da “multiplicabilidade dos atos humanos”. As pessoas são mais ou menos capazes das mesmas coisas, por isso tendemos a praticar um ato que, se for repetido, resultará em benefício, não em malefício para nós. Note que explico as leis morais recorrendo ao conceito de “multiplicabilidade dos atos humanos”, ou seja, explico os atos morais com base num conceito filosófico, sem recorrer ao que há depois da morte. Por isso volto a dizer: uma moral pode ser facilmente pregada com bases filosóficas ou científicas. O que o filósofo ou cientista não consegue fazer é defender uma moral com base na idéia de que, se a cumprirmos, teremos um lindo lugar depois da morte. A morte é o limite da filosofia e de qualquer ciência, e o início da religião.

Oposição entre ciência e milagre

Por isso não existe oposição entre ciência e religião. Como vimos, cada uma versa sobre coisas totalmente diferentes e tem domínios diferentes. Einstein pode falar da quarta dimensão, Hawking pode falar à vontade do Big Bang e dos buracos negros, mas se você perguntar a um deles: o que vai me acontecer quando eu morrer?, eles dirão estupefatos: ora, como vou saber? Porém faça a mesma pergunta a um padre e ele te responderá com a tranqüilidade de um elefante.

No entanto é inegável que várias contradições surgem na cabeça do estudante que tenta compreender simultaneamente o discurso religioso e o discurso científico. Mas isso não ocorre por causa da veracidade ou falsidade intrínsecas desses discursos, e sim por causa do modo como eles se apresentam. O discurso religioso normalmente se apresenta por uma linguagem poética, enquanto a ciência arrisca a expressão literal. Se você acha que o autor do Gênesis queria dizer que Deus moldou o barro e fez o homem como eu e você fazemos um bonequinho de argila, então é claro que você vai ver oposição entre esse discurso e o de Darwin. Mas, se você entender o barro como a matéria e o sopro de Deus como a inteligência, então os dois discursos já não ficam assim tão opostos, e quanto mais você decupar as várias camadas de sentido do discurso poético usado pela religião, mais verá que pelo menos algumas dessas camadas se adequam perfeitamente ao discurso científico sem prejuízo de nenhum dos dois lados. O problema é que muitos sacerdotes negam algumas interpretações do discurso religioso, contudo não acredito que isso ocorra por má fé ou por ignorância, mas porque se sabe perfeitamente que alguns trechos de discursos religiosos, se isolados do seu contexto e interpretados literalmente, podem ser usados até para pregar o mal. Como as religiões se concentram sobretudo em preocupações morais, elas procuram a todo custo evitar que seu discurso caia nesse tipo de vício.

Outra aparente contradição entre relgião e ciênca surge quando pensamos nos milagres. Segundo alguns cientistas eles não poderiam ocorrer, pois o universo segue leis constantes – talvez criadas pelo próprio Deus – e ele mesmo não poderia infringir essas leis. Assim, se um dado fenômeno acontece de alguma forma, ele continuará a acontecer dessa forma, e Deus não vai interferir causando um evento “sobrenatural”. Se esse argumento fosse cientifico, de fato, haveria grande oposicao entre ciência e religiao, pois a ciencia não aceitaria os milagres, e eles são a base dos discursos judeu e cristao. No entanto temos que lembrar que esse argumento não representa a totalidade da ciência, mas apenas uma parte bem chinfrim dela: o determinismo. Segundo o determinismo as leis que regem o universo estão dadas e uma infração dessas leis não seria possivel nem pelo próprio ser que as criou. Ora, mas essa ideia é tão bobinha que não pode ser sustentada por um sujeito que pensou no assunto por mais de dezoito minutos (não precisa que esses minutos estejam no mesmo dia). Uma rápida olhada em qualquer história da ciência mostra que coisas que antes eram impossíveis hoje são perfeitamente possíveis e explicáveis. O que há com relação à ciência é um progressivo aumento do que é conhecido, e consequentemente um progressivo aumento do que é visto como possivel. Só o determinismo é que tenta fixar o limite do possvel dentro da estreita visão do seu tempo, e não seria justo colocá-lo como representante da ciência como um todo. A rigor – rigor científico – não há razão para afirmar que semana que vem não saberemos como curar cegos e ressucitar pessoas que morreram há pouco tempo, e que o trabalho de Jesus não se tornará banal como uma ligação de celular. É claro que o milagre é um pouco mais do que isso, pois no milagre o evento “sobrenatural” é sempre feito em benefício de alguém, nunca em malefício. A Igreja nunca canonizará o sujeito que, por meios sobrenaturais, conseguiu fugir da prisão e matar alguém. Ou o sujeito que conseguiu roubar por meios milagrosos. Mas não vamos entrar nesse detalhe agora. O importante é lembrar que também não há contradição entre ciência e milagre, mas apenas entre determinismo e milagre, e, de fato, se vc tiver razoável sanidade mental, não conseguirá acreditar nos dois ao mesmo tempo. Eu já fiz minha opção, faça a sua.

As conversões e o futuro das religiões

Mas ainda não respondemos à pergunta lançada por Julio Borges. Deus tem futuro?

Vimos que certo discurso sobre o que há depois da morte sempre terá futuro. Se esse discurso desaparecer do universo cultural, ele é reinventado (ou redescoberto) e se espalha com a rapidez de um ventilador. Vimos que o milagre tem presente e, se não temos razão para negá-lo no presente, a princípio nada impede que ele tenha futuro. Mas e Deus? Deus tem futuro?

Ora, Deus sempre terá futuro, pois Deus é qualquer coisa, e qualquer coisa sempre tem futuro. Pergunte a um cientista e ele dirá que Deus é a ordem que organiza o universo e o torna inteligível. Pergunte a uma mãe e ela dirá que as relgiões estão erradas, pois deus é o amor de mãe. Pergunte a um arquiteto e ele dirá que Deus é o arquiteto que fez a beleza do universo. Pergunte a um guerreiro e ele dirá que Deus é o senhor dos exércitos, pergunte a uma jovem apaixonada e ela dirá que deus é o amor conjugal, e por aí vai. Pergunte aos pecadores e eles dirão que deus é o ser que perdoa. Pegunte a um sujeito que sofreu uma injustiça e ele dirá que deus é o ser que pratica a justiça, etc. Deus é um ser no qual projetamos o que há de melhor em nós mesmos, ou, no mínimo, uma possibilidade de melhorar. Por isso Deus tem futuro e sempre terá. Deus é simplesmente o que de melhor podemos enxergar no momento. Ele se adapta a qualquer coisa, a qualquer cultura, a qualquer sociedade, a qualquer tempo, a qualquer criança, a qualquer adulto, etc. É mais uma idéia que, se fosse destruída, seria simplesmente reinventada. Não toleramos a idéia de que as coisas não podem melhorar. Precisamos acreditar que a vida será melhor no próximo mês, mesmo com os juros altos; e o que mais nos daria essa esperança senão uma idéia que não pode ter seus limites definidos? Deus é simplesmente uma necessidade humana, como o oxigênio e a água. Não podemos definir nossas próprias necessidades, podemos apenas aceitá-las e viver com elas. Quando nos damos conta disso, a pergunta do Julio fica mole. Deus tem todo o futuro do mundo. Ele pode até mudar, de nome, mas vai estar sempre lá.

Mas e o Deus cristão?

Se perguntarmos se o Deus cristão tem futuro, aí a questão já ganha uma conotação diferente. Já estamos perguntando se o deus de uma cultura em particular vai prevalescer. A princípio poderíamos achar que não, por uma questão meramente matemática. Os muçulmanos, os budistas, os xintoístas se reproduzem muito mais que os cristãos. Os cristão já são minoria no mundo, e, se tudo continuar como está, serão minoria ainda maior num futuro próximo. Então, movidos por princípios matemáticos, poderíamos supor que eles logo entraram em extinção. Mas isso não é verdade. Se restar um cristão no mundo, cem ateus e cem muçulmanos, ainda existe a possibilidade de esse cristão converter 20 ateus e 45 muçulmanos, então teoricamente o número de cristãos no mundo não conta muito para a permanência do cristianismo. E digo mais: quando exposto junto com as outras religiões, o cristianismo tende a ganhar, e isso porque ele promete muito mais que as outras. Maomé não curou cegos e estéreis, Moisés também não, mas Cristo curou cegos, estéreis, paraplégicos, transformou água em vinho e ainda ressucitou um morto que devia estar muito feliz por ter se livrado da chata da sua mãe. Cristo era bom filho, por isso as mães induzem seus filhos ao cristianismo. Cristo curou um punhado de doentes, por isso os doentes buscam o cristianismo. Cristo curou uma mulher estéril, por isso as mulheres estéreis buscam o cristianismo. A religião é um discurso sobre o que há depois da morte, mas seu sucesso depende, inquestionavelmente, do que ela promete para a vida atual. Se Cristo tivesse dito a um cego, “você vai continuar cego, mas irá para o céu”, o cristianismo quase não teria adeptos hoje. E aquela mulher estéril? Ah, se Cristo tivesse dito: para quê ter filhos? Adote um! Mas Cristo a curou e isso garantiu o sucesso de sua religião. E hoje em dia os protestantes têm mais sucesso ainda, porque além da cura prometem a prosperidade material. Então também não há dúvidas de que o deus cristão sobreviverá. Ele promete bastante e as pessoas precisam disso. Hoje existe uma tendência de se negar cristo publicamente, mas basta o cara ficar doente que ele vai lá no cantinho dele pedir a cura ao bom e velho Jesus. Outra coisa engraçada são esses ateus que morrem abraçados em santas, tipo o João Cabral. Isso mostra a incapacidade do homem de contar apenas consigo mesmo. E quanto mais o homem tenta negar isso mais fortemente ele se converte depois. A regra não falha. É impressionante.

Outra coisa importante no cristianismo é a monogamia. As mulheres sonham com a monogamia desde o momento em que nascem até o último segundo de suas vidas. Nada é mais aterrorizante para uma mulher do que a idéia de quem um homem pode amar várias mulheres ao mesmo tempo. Elas querem ser amadas acima de tudo, querem ser o centro da família, o deus privado do seu parceiro, etc. Basta ler esses cansativos livros sobre muçulmanas para você ver que até as muçulmanas querem um casamento monogâmico. O cristianismo é a única religião que defende isso com clareza e convicção. Quando Jesus falou que devíamos ser monogâmicos, os judeus responderam: então é melhor não casar! E ele disse: Deus tinha permitido mais de uma mulher por causa da dureza de vossos corações, mas agora a mamata acabou. Se vc já leu o evagelho sabe que essas palavras são absolutamente verdadeiras. Então, a mulher, na sua fome insaciável de monogamia, não tem outra religião a defender que não o cristianismo. Essa onda de livros sobre mulheres muçulmanas acabou reforçando o cristianismo muito mais do que se imagina. As mulheres cristãs – ou mesmo atéias – quando lêem esses livros raciocinam mais ou menos assim: meu Deus, se o cristianismo acabar é essa merda que vai entrar no lugar, então é melhor manter Cristo onde está! As mulheres ocidentais não são loucas de pregar outra religião, pois o cristianismo é a religião que mais deu direitos à mulher. Sendo assim, por suas promessas, por sua moral favorável à mulher, por sua simplicidade e por muitas outras qualidades o cristianismo ainda vai durar muito no mundo e quem pensa o contrário só vai se decepcionar. Não me esqueço de uma entrevista brilhante que o José Simão (macaco Simão) deu à televisão. Ele falou assim: quando eu era jovem, eu vi o bissexualismo, as drogas e tudo que era diferente ganhando espaço nas ruas e na mídia. Eu previ que nos anos 90 o ídolo pop do Brasil seria um cara tipo David Bowe. Um misto de homem e mulher que curtisse algum tipo de libertação transcendental através das drogas. E um dia eu acordei nos anos 90 e o ídolo do Brasil era o Padre Marcelo!

As brutais incoerências lógicas do cristianismo aparecem apenas para quem gosta de filosofia e exige alguma coerência das idéias. A imensa maioria das pessoas quer apenas saber se ganha ou se perde alguma coisa quando se coloca uma determinada idéia em prática. Basta vc passar a impressão de que ela ganha e isso fará com que a idéia permaneça por muito tempo na terra.

Mas é interessante notar que o cristianismo encontrou um porta-voz, que conseguiu resolver o problema de suas contradições internas. Um sujeito que entendia bastante de ciência e de filosofia para expor o cristianismo sob uma nova linguagem, demonstrando a validade científica de idéias bastante duvidosas, como o céu, o inferno e os demônios. Esse gênio filosófico-teológico chama-se Emmanuel Swedenborg e vc pode encontrar facilmente suas obras na internet. Esse sujeito teve formação científica, depois passou por uma revelação mística que lhe permitiu vislumbrar o que havia depois da morte e voltar para contar a história sem se basear unicamente em alegorias e símbolos. Ele também é responsável pela mais lúcida interpretação do apocalipse que já vi. Mas ele não é muito popular, pois, durante sua vida, não curou cegos nem mulheres estéreis. Mas se vc é estudante de filosofia e se engalfinha com as contradições irritantes do cristianismo, vc não vai encontrar leitura melhor.

Eu tinha até mais coisa para dizer, mas chega, né. Termino com a indicação de Swedenborg e fico por aqui.

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2 Comments

  1. Marilena Santos

    A leitura foi extensa, mas irresistível.
    E não posso deixar de te dar razão, ainda que-como cristã- prefiro sentir do que pensar no tema.

  2. Marilena Santos

    Por favor, Ronaldo, continue!

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