blog do escritor yuri vieira e convidados...

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Interpenetração literária

No artigo Amigos do Brasil (Na Antevespera, pág. 164), escreveu Monteiro Lobato (com sua grafia própria, sem acentos “inúteis” e etc.):

“A interpenetração literaria é o que há de mais proficuo na aproximação dos povos. Só ela suprime as muralhas que a estupidez dos governos ergue. Só ela demonstra que somos todos irmãos no mundo, com as mesmas visceras, os mesmos defeitos, os mesmos ideais. Se a França tornou-se amada entre nós a ponto de bombardear Damasco e esmagar Abd-el-Krim sem que isso nos arrepie as fibras de indignação, deve-o aos senhores Perrault, La Fontaine, Hugo, Maupassant, Taine, Anatole e quantos mais nos trouxeram para aqui esta sensação da irmandade do homem. Se a Alemanha não se gosou de identicas simpatias é que viamos os atos de violencia dos seus homens de governo e não havia dentro de nós, para atenuar-lhes a repercussão, o coxim de veludo da literatura alemã, bem absorvida como temos a francesa. (…) Os morcegos passam e os livros ficam.”

Um erro

Num artigo intitulado Krishnamurti, escreveu Monteiro Lobato:

“Erro pensar que é a ciência que mata uma religião. Só pode com ela, outra religião.”
(in Na Antevespera, pág. 199.)

Dias intranqüilos em Clichy

Henry Miller, que viveu alguns de seus melhores anos em Clichy (Dias tranqüilos em Clichy), jamais imaginaria que seu amado bairro viveria uma semana tão intranqüila quanto a presente. Segundo o Le Figaro, no correr desta semana ao menos 228 carros foram queimados na região de Seine Saint-Denis, onde se encontra Clichy. Tudo começou com a morte de dois jovens que fugiam da polícia. A região se levantou e já está há uma semana em meio à quebradeira. Nessas horas fico imaginando: para onde se mudariam hoje Hemingway, Joyce, Scott Fitzgerald, Gertrude Stein, Dos Passos, Henry Miller e demais coléguas, sem falar dos artistas plásticos e outros? Para onde? Embora essa gente tenha se guiado pela estética e pelo hedonismo – Paris era e é uma beleza – o que realmente os movimentou foi o bolso: no período entre-guerras a França era baratíssima e ali era possível sobreviver com um décimo do necessário para se manter, por exemplo, em Nova York. E todos sabem que escritores e artistas são uns duros…
Onde fica a Paris de hoje? Onde é possível passar meus próprios dias tranqüilos? Em Clichy é que não é. E muito menos na Vila Madalena

Mirisola, o demônio

Veja abaixo o futuro encontro do escritor Marcelo Mirisola com o Senhor Yama, o Plutão dos hindus, senhor da morte, que encaminha as almas para seus devidos lugares(loka)… 😉
Mirisola diante do Senhor Yama

Cenários de Shakespeare

Taí uma tarefa levada a cabo por um nerd que curte literatura. Um francês colocou na comunidade Keyhole (Google Earth) – num único arquivo – links que levam a 85 lugares citados em diferentes peças de William Shakespeare.

Do “blog” do Monteiro Lobato

Trecho do livro Mundo da Lua, no qual Monteiro Lobato reuniu anotações de seu diário (estou mantendo a grafia do autor, sem acentos “inúteis” e outras coisinhas mais):

Quadros da vida

Tarde linda ontem. Conversamos á janela, eu e o Quim, sobre a ação ideologica de Rui neste país e sobre a ascenção ininterrupta da grande figura nacional.
– Sobe sempre…
– Já aquele desce sempre, observou Quim.
Referia-se ao Pedro Inchado, mendigo habitual da nossa rua. Lá vinha ele, todo farrapos, imundo. Ha mendigos decentes, que guardam a compostura da miseria. Este perdeu tudo e é no moral tão roto como no fisico. Sem camisa – um trapo de paletó sobre o couro gafeirento; sem ceroulas – vêem-se-lhe pedaços de perna pelos buracos da calça imunda. Passou por nós e apanhou uma ponta de cigarro.
– Desce sempre. Ha meses pilhei-o querendo apanhar um cigarro; olhava para os lados a ver se era observado. Perdeu já este ultimo pudor…

Loterias

Contou-nos um velho vendedor de loterias coisas curiosas de sua vida de bufarinheiro de esperanças. Desde mocinho só fez aquilo: vender a esperança da riqueza. Já deu duas sortes grandes e varias pequenas. Uma vez…
– Uma vez aconteceu um caso interessante. A sorte andou por cá procurando quem a quisesse. Ninguem a quis. Vendi todos os bilhetes que tinha, menos um, o premiado. Para não ficar com esse encalhe, dei-o a um compadre meu que seguia para S. José. “Venda-o por lá.” Assim foi. Um sitiante comprou-o no caminho, mas achou feio o numero e vendeu-o a um guarda-livros de lá, muito boa peça, rapaz serio, trabalhador, pai de tres filhos. Nesse mesmo dia saiu-lhe a sorte – cem contos.
O moço foi ao Rio receber o dinheiro e lá ficou meses, a meter o pau no cobre.
Voltou um perdido, um bebado, e hoje anda por aqui, rolando…
– Por aqui? Como se chama?
– Pedro. É o Pedro Inchado, não conhece?

Hilda Hilst e os cães

Érika (Olivier?) me enviou este artigo do poeta e escritor Álvaro Alves de Faria – publicado na Caros Amigos n. 21 -, que descreve com perfeição o estado de espírito da Hilda Hilst quando a conheci em 1998. Depois que me mudei para a Casa do Sol, ela passou a ter um interlocutor diário, mas ainda caía com freqüência nesses dias de tristeza. Melhorou bastante no segundo ano, quando o Mora Fuentes também se mandou de mala e cuia para lá. Com ele, que a conhecia havia mais de trinta anos, aprendi a ampliar os limites da minha relação com a então senhora H. Demos mais jogo de cintura à nossa amizade. Mas, vale dizer, a grande tristeza da Hilda tinha muito a ver com a aproximação da morte, com a suposta indiferença de Deus e, claro, com a falta de grana, corolário de uma brilhante carreira não coroada pelo grande público. Enfim, achei o texto do Álvaro excelente. Para quem não a conheceu pessoalmente, vale como uma visita em pleno ano de 1998. Mas ainda é preciso escrever sobre seus dias de alegria…

Arte de Amar

Isto é do Manuel Bandeira:

“Se queres a felicidade de amar, esquece a tua alma.
“A alma é que estraga o amor.
“Só em Deus ela pode encontrar satisfação.
“Não noutra alma.
“Só em Deus – ou fora do mundo.
“As almas são incomunicáveis.
“Deixa o teu corpo entender-se com outro corpo.
“Porque os corpos se entendem, mas as almas não.”

O Rio de Janeiro, segundo Wordsworth

Ralph Waldo Emerson, a respeito do poeta Wordsworth, que reencontrou durante uma viagem à Inglaterra em 1848:

“Julga o Rio de Janeiro o melhor lugar do mundo, para uma grande capital…”

Contos vingativos

Meus amigos mais próximos – e principalmente duas ex-namoradas – conhecem as circunstâncias em meio às quais se desenvolveram os contos d’A Tragicomédia Acadêmica. Esta semana, ao ler a entrevista concedida por Monteiro Lobato ao jornalista Silveira Peixoto, de uma certa Gazeta Magazine, dou com o seguinte trecho:

Meus contos foram quase todos vingancinhas pessoais, desabafos. Quando eu sentia necessidade de vingar-me de um sujeito qualquer, não sossegava enquanto o não pintasse numa situação ridícula ou trágica, que me fizesse rir.

É exatamente isso. Daí eu dizer a um webamigo, num debate via email, que a raiva pode ser muito bem aproveitada na criação artística. E ele veio com o papo de que isso é feio, de que o que vale é o amor… Claro, há o amor e o frenesi pela palavra, mas não sei se uma ostra tem lá todo esse amor pelo grãozinho de areia invasor que cobre de nácar…

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