Após a conclusão do discurso de despedida feito aos onze, Jesus conversou informalmente com eles e relatou novamente muitas experiências que lhes diziam respeito como grupo e como indivíduos. Afinal, esses galileus estavam começando a perceber que o seu amigo e instrutor iria abandoná-los e, nas suas esperanças, eles agarravam-se à promessa de que, após um curto período de tempo, ele estaria de novo com eles, no entanto estavam propensos a esquecer que essa visita de volta era também por pouco tempo. Muitos dos apóstolos e principais discípulos realmente pensavam que essa promessa de voltar por um período curto (o curto intervalo entre a ressurreição e a ascensão) indicava que Jesus estava indo embora para uma breve visita ao seu Pai, após o que ele voltaria para estabelecer o Reino. E tal interpretação do seu ensinamento conformava-se tanto às suas crenças preconcebidas, quanto às suas esperanças ardentes. Posto que, desse modo, as suas crenças de toda uma vida e esperanças de ver os desejos satisfeitos estavam de acordo, não era difícil para eles encontrarem uma interpretação para as palavras do Mestre que justificasse as suas aspirações intensas.
Depois de terem analisado o discurso de despedida e de terem começado a assimilá-lo nas suas mentes, Jesus chamou novamente os apóstolos à ordem e começou a fazer-lhes exortações e a dar-lhes os seus conselhos finais.
1. ÚLTIMAS PALAVRAS DE CONFORTO
Quando os onze tomaram seus assentos, Jesus permaneceu de pé e dirigiu-se a eles: “Posto que eu esteja convosco na carne, não posso ser senão um indivíduo em meio a vós ou no mundo inteiro. Mas, quando eu tiver sido libertado dessa veste de natureza mortal, serei capaz de retornar como um espírito que residirá em cada um de vós e em todos os outros crentes deste evangelho do Reino. Desse modo o Filho do Homem tornar-se-á uma encarnação espiritual nas almas de todos os verdadeiros crentes.
“Quando eu tiver voltado para viver em vós e trabalhar por vosso intermédio, eu poderei conduzir-vos melhor nesta vida e guiar-vos pelas várias moradas na vida futura, nos céus dos céus. A vida na criação eterna do Pai não é um descanso sem fim, de indolência e sossego egoísta, mas é, antes, uma progressão incessante na graça, na verdade e na glória. Cada uma, entre tantas estações na casa do meu Pai, é um local de permanência para uma vida destinada a preparar-vos para a próxima, que está à frente. E assim os filhos da luz irão, de glória em glória, até que alcancem o estado divino no qual estarão espiritualmente perfeccionados, como o Pai é perfeito em todas as coisas.
“Se quiserdes me seguir, quando eu vos deixar, empreendei os vossos esforços mais honestos para viver de acordo com o espírito dos meus ensinamentos e com o ideal da minha vida – fazer a vontade do meu Pai. Fazei isso, em vez de tentar imitar a minha vida natural na carne, como eu fui, por necessidade, solicitado a viver neste mundo.
“O Pai enviou-me a este mundo, mas apenas poucos de vós escolheram receber-me plenamente. Eu irei verter o meu espírito sobre toda a carne; no entanto, não serão todos os homens que escolherão receber esse novo instrutor como guia e conselheiro da alma. Todos os que o receberem, todavia, serão iluminados, purificados e confortados. E esse Espírito da Verdade tornar-se-á, neles, um poço de água viva, fazendo-os crescer para a vida eterna.
“E agora, estando para deixar-vos, eu gostaria de dizer palavras de conforto. Eu deixo a paz convosco; a minha paz eu vos dou. Faço essas dádivas não como o mundo dá – medindo-as –, eu dou a cada um de vós tudo o que podeis receber. Que os vossos corações não se perturbem, e que não fiquem temerosos. Eu venci o mundo, e em mim todos vós ireis triunfar pela fé. Eu preveni-vos de que o Filho do Homem será morto, mas eu asseguro-vos de que eu retornarei antes de ir para o Pai, ainda que seja apenas por momentos. E, depois que tiver ascendido ao Pai, eu irei seguramente enviar o novo instrutor para estar convosco e para residir nos vossos próprios corações. E quando virdes tudo isso acontecer, não vos desanimeis, acrediteis antes, porquanto de tudo isso sabíeis de antemão. Eu vos amei com um grande afeto, e não gostaria de abandonar-vos, mas é essa a vontade do Pai. A minha hora é chegada.
“Não duvideis de nenhuma dessas verdades, mesmo depois que estiverdes dispersos pelas perseguições e abatidos por causa de muitos sofrimentos. Quando sentirdes que estais sós no mundo, eu saberei do vosso isolamento, do mesmo modo que sabereis dos meus sofrimentos, quando estiverdes dispersos, todos vós, em caminhos diferentes, deixando o Filho do Homem nas mãos dos seus inimigos. Todavia eu nunca estou só; o Pai está sempre comigo. Mesmo em uma hora como esta, eu orarei por vós. E todas essas coisas eu vos disse para que possais ter paz e tê-la mais abundantemente. Neste mundo vós tereis tribulações, mas tendes coragem e alegria; eu triunfei no mundo e vos mostrei o caminho do júbilo e do serviço eterno”.
Jesus dá a paz àqueles que junto com ele fazem a vontade de Deus, mas não na ordem das alegrias e satisfações deste mundo material. Os materialistas descrentes e os fatalistas apenas podem esperar gozar de duas espécies de paz e de conforto de alma: ou eles devem ser estóicos, possuídos de uma determinação de enfrentar, com uma resolução inquebrantável, o inevitável, e de resistir ao pior; ou devem ser otimistas, abandonando-se sempre à esperança que brota eternamente do peito humano, aspirando em vão ter uma paz que nunca realmente virá.
Uma certa quantidade tanto de estoicismo quanto de otimismo é útil para viver a vida na Terra, mas nenhum dos dois nada tem a ver com aquela paz esplêndida que o Filho de Deus confere aos seus irmãos na carne. A paz que Michael dá aos seus filhos na Terra é aquela mesma paz que preencheu a sua própria alma quando ele próprio viveu a vida mortal na carne e neste mesmo mundo. A paz de Jesus é o júbilo e a satisfação de um indivíduo, conhecedor de Deus, que alcançou o triunfo de aprender plenamente como fazer a vontade de Deus, enquanto vivia a sua vida mortal na carne. A paz da mente de Jesus funda-se em uma fé humana absoluta na realidade do cuidado sábio e compassivo do Pai divino. Jesus teve dificuldades na Terra, ele foi até mesmo falsamente chamado “homem dos sofrimentos”, mas, em todas essas experiências, ele desfrutou do conforto daquela confiança que sempre lhe deu o poder de continuar com o seu propósito de vida, na certeza plena de que ele estava realizando a vontade do Pai.
Jesus era determinado, persistente e profundamente devotado à realização da sua missão, mas ele não era um estóico insensível e endurecido; ele sempre buscou os aspectos mais positivos das experiências da sua vida, contudo ele não foi um otimista cego que se enganava. O Mestre sabia de tudo o que o esperava, e era destemido. Após ter outorgado essa paz a cada um dos seus seguidores, ele podia dizer consistentemente: “Não deixes o teu coração perturbar-se, nem te deixes amedrontar”.
A paz de Jesus é, então, a paz e a firmeza de um filho que crê plenamente que a sua carreira pelo tempo e pela eternidade está segura e inteiramente sob os cuidados e a guarda de um espírito-Pai Todo-sábio, Todo-amoroso e Todo-Poderoso. E esta é, de fato, uma paz que transcende a compreensão da mente mortal, mas que pode ser gozada plenamente pelo coração humano crente.
2. EXORTAÇÕES PESSOAIS DE DESPEDIDA
O Mestre tinha terminado de dar as suas instruções de despedida e de fazer as suas exortações finais aos apóstolos como um grupo. E então ele tratou de despedir-se individualmente e de dar a cada um uma palavra de conselho pessoal, junto com a sua bênção de despedida. Os apóstolos estavam ainda sentados à mesa, como quando eles primeiro sentaram-se para compartilhar a Última Ceia e, à medida que o Mestre ia contornando a mesa e falando com eles, cada um punha-se de pé quando Jesus dirigia-se a ele.
A João, Jesus disse: “Tu, João, és o mais jovem dos meus irmãos. Tens estado muito próximo de mim e eu te amo com o mesmo amor que um pai tem para com os seus filhos, além de tudo, tu foste designado por André como um dos três que deveriam sempre estar perto de mim. E tu tens atuado por mim e deves continuar a atuar assim, em muitas questões que concernem à minha família terrena. E eu vou para o Pai, João, tendo a confiança plena de que tu continuarás a velar por aqueles que são os meus na carne. Vela para que a tua confusão atual a respeito da minha missão não impeça de nenhum modo que lhes estendas toda a simpatia, conselho e ajuda, como sabes que eu faria se fosse permanecer na carne. E, quando todos eles vierem para ver a luz e entrar integralmente no Reino, ainda que todos vós dêem jubilosas boas-vindas a eles, eu dependo de ti, João, para dar-lhes as boas-vindas por mim.
“E agora, ao entrar nas horas finais da minha carreira terrena, permanece por perto e disponível para que eu possa deixar contigo qualquer mensagem para a minha família terrena. No que diz respeito à obra colocada nas minhas mãos pelo Pai, agora ela está terminada, exceto pela minha morte na carne, e eu estou pronto para beber deste último cálice. Mas quanto às responsabilidades passadas a mim por José, meu pai terreno, eu as tenho cumprido durante a minha vida, no entanto, devo depender de ti para agir em meu lugar em todas essas questões. E eu escolhi a ti para fazer isso por mim, João, porque tu és o mais jovem e, portanto, viverá mais do que os outros apóstolos.
“Certa vez nós te chamamos e ao teu irmão de filhos do trovão. Tu começaste conosco muito autoritário e intolerante, mas tu mudaste bastante desde que quiseste que eu fizesse descer o fogo sobre as cabeças de descrentes impensados e ignorantes. E tu deves mudar ainda mais. Tu deverias transformar-te no apóstolo do novo mandamento que eu vos dei esta noite. Dedica a tua vida a ensinar aos teus irmãos como vos amar mutuamente, como eu vos amei”.
João Zebedeu permanecia na sala superior, com as lágrimas rolando pelo seu rosto e, olhando para o rosto do Mestre, ele disse: “E assim eu farei, meu Mestre, mas como posso aprender a amar mais os meus irmãos?” E então Jesus respondeu: “Tu aprenderás a amar mais os teus irmãos quando aprenderes primeiro a amar mais o Pai no céu e após teres te tornado realmente mais interessado no bem-estar deles no tempo e na eternidade. E todo esse interesse humano é fomentado pela compaixão compreensiva, pelo serviço desinteressado e pelo perdão irrestrito. Nenhum homem deveria desdenhar-te pela tua juventude, e eu exorto-te a dar sempre a devida consideração ao fato de que a idade muitas vezes representa experiência, e de que nada nos assuntos humanos pode tomar o lugar da experiência real. Esforça-te para viver pacificamente com todos os homens, especialmente os teus amigos, na fraternidade do Reino celeste. E, João, lembra-te sempre, não lutes tanto com as almas que gostarias de ganhar para o Reino”.
E então o Mestre, contornando o próprio assento, parou um momento ao lado do lugar de Judas Iscariotes. Os apóstolos ficaram muito surpresos de que Judas não tivesse voltado antes, e estavam bastante curiosos para descobrir o significado do semblante triste de Jesus, enquanto ele permaneceu diante do assento vago do traidor. Mas nenhum deles, exceto, possivelmente, André, tinha a mais leve idéia de que o tesoureiro deles havia saído para trair o seu Mestre, como Jesus sugerira-lhes, mais cedo naquela tarde e durante a ceia. Tantas coisas estavam acontecendo que, naquele momento, eles tinham esquecido completamente o anúncio feito pelo Mestre de que um deles iria traí-lo.
Jesus nesse momento foi até onde estava Simão zelote, que se levantou para ouvir esta exortação: “Tu és um verdadeiro filho de Abraão, mas quanto tempo eu gastei tentando fazer de ti um filho deste Reino celeste. Eu amo a ti e a todos os teus irmãos também. Sei que tu me amas, Simão, e também que amas ao Reino, mas tu ainda estás determinado a fazer este Reino vir de acordo com o teu desejo. Eu sei muito bem que tu irás finalmente captar a natureza espiritual e o significado do meu evangelho, e que tu irás fazer um trabalho valente na proclamação dele, mas eu fico angustiado com o que pode acontecer a ti quando eu partir. Gostaria de me regozijar de saber que tu não irias hesitar; e ficaria feliz se pudesse saber que, depois que eu for para o Pai, tu não deixarias de ser meu apóstolo, e que tu irias comportar-te aceitavelmente como um embaixador do Reino celeste”.
Mal Jesus acabou de falar a Simão zelote quando o patriota ardente, secando os seus olhos, replicou: “Mestre, não tenhas nenhum temor pela minha lealdade. Eu dei as minhas costas a tudo aquilo a que eu pudesse dedicar na minha vida para o estabelecimento do teu Reino na Terra, e não hesitarei. Tenho sobrevivido a todos os desapontamentos até agora, e eu não te abandonarei”.
E, então, colocando sua mão no ombro de Simão, Jesus disse: “De fato, é reanimador ouvir-te falar assim, especialmente em um momento como este, mas, meu bom amigo, tu ainda não sabes do que estás falando. Nem por um momento, eu duvidaria da tua lealdade, da tua devoção, sei que tu não hesitarias em continuar na batalha e morrer por mim, como todos os outros também não (e eles todos acenaram em uma aprovação vigorosa), mas isso não será exigido de ti. E, repetidamente, tenho-te dito que o meu Reino não é deste mundo e que os meus discípulos não terão de lutar para que ele seja estabelecido. Eu te disse isso muitas vezes, Simão, mas te recusas a enfrentar a verdade. Não estou preocupado com a tua lealdade a mim e ao Reino; e sim com o que irás fazer quando eu me for e quando então afinal te despertares para a compreensão de que não captaste o significado dos meus ensinamentos e de que deves ajustar as tuas concepções erradas à realidade de uma outra ordem mais espiritual de assuntos do Reino?”
Simão queria falar ainda mais, mas Jesus levantou a sua mão e, refreando-o, continuou a dizer: “Nenhum dos meus apóstolos é mais sincero e honesto de coração do que tu, mas nenhum deles ficará tão perturbado e desalentado quanto tu após a minha partida. Durante todo o teu desencorajamento, o meu espírito residirá dentro de ti, e os teus irmãos não te abandonarão. Não te esqueças do que eu te ensinei a respeito da relação entre a cidadania na Terra e a filiação ao Reino espiritual do Pai. Pondera bem sobre tudo o que eu te disse quanto a dar a César as coisas que são de César e a Deus aquilo que é de Deus. Dedica a tua vida, Simão, a mostrar quão aceitavelmente o homem mortal pode cumprir a minha injunção a respeito do reconhecimento simultâneo do dever temporal aos poderes civis e do serviço espiritual na irmandade do Reino. Se fores instruído pelo Espírito da Verdade, nunca haverá conflito entre as exigências da cidadania na Terra e a filiação ao céu, a menos que os dirigentes temporais presumam exigir de ti a homenagem e o culto que pertencem a Deus.
“E agora, Simão, quando tu finalmente vires tudo isso, e depois que te vires livre da tua depressão e que tiveres saído para proclamar este evangelho, com um grande poder, nunca te esqueças de que eu estive contigo, mesmo durante os teus momentos de desencorajamento, e que eu irei contigo até o fim mesmo. Tu serás meu apóstolo para sempre, e depois que tu te tornares disposto a ver com os olhos do espírito e que estiveres mais disposto a submeter a tua vontade à vontade do Pai no céu, então tu voltarás a trabalhar como meu embaixador e ninguém tirará de ti a autoridade que eu te conferi, por causa da tua lentidão em compreender as verdades que eu te ensinei. E assim, Simão, uma vez mais eu te previno de que aqueles que lutam com a espada perecem pela espada, enquanto aqueles que trabalham com o espírito alcançam a vida eterna no Reino vindouro, com júbilo e paz no Reino em que estão agora. E quando o trabalho colocado nas tuas mãos terminar na Terra, tu, Simão, sentar-te-ás comigo no meu Reino. Tu realmente verás o Reino que almejastes, mas não nesta vida. Continues a crer em mim e naquilo que eu revelei a ti, e tu receberás a dádiva da vida eterna”.
Depois que acabou de dizer isso a Simão zelote, Jesus encaminhou-se até Mateus Levi e falou: “Não mais recairá sobre ti a tarefa de prover o tesouro do grupo apostólico. Em breve, muito em breve, todos vós estareis dispersos; não vos será permitido desfrutar da ligação confortante e encorajadora com nenhum dos vossos irmãos. À medida que fordes pregando este evangelho do Reino, tereis de encontrar novos colaboradores para vós. Eu vos enviei dois a dois durante os tempos do vosso aperfeiçoamento, mas agora que vos estou deixando, após terde-vos recuperado do choque, saireis sozinhos, e até os confins da Terra, proclamando as boas-novas que declaram: Os mortais vivificados pela fé são os filhos de Deus”.
E então Mateus falou: “Mas, Mestre, quem nos enviará, e como saberemos aonde ir? Será que André nos mostrará o caminho?” E Jesus respondeu: “Não, Levi, André não mais vos dirigirá na proclamação do evangelho. Ele irá, na verdade, continuar como vosso amigo e conselheiro até aquele dia em que o novo instrutor vier e, então, o Espírito da Verdade conduzirá cada um de vós pelo mundo a fim de que trabalheis para a expansão do Reino. Tu passaste por muitas mudanças, desde aquele dia na aduana, em que tu primeiro decidiste seguir-me; mas muitas mais devem acontecer-te antes de te fazeres capaz de ter a visão de uma irmandade na qual os gentios assentam-se ao lado dos judeus em uma ligação fraternal. Mas sai e, com o teu ímpeto, vai ganhar os teus irmãos judeus até ficares satisfeito plenamente e, então, volta-te com força aos gentios. De uma coisa podes estar certo, Levi: Tu ganhaste a confiança e o afeto dos teus irmãos; eles todos te amam”. (E todos os dez acenaram com a sua aquiescência às palavras do Mestre.)
“Levi, muito eu sei sobre as tuas ansiedades, sacrifícios e lidas para manter o tesouro repleto e, disso tudo, os teus irmãos não sabem, e eu me rejubilo de que, embora aquele que leve a bolsa esteja ausente, o embaixador publicano está aqui, na minha reunião de despedida com os mensageiros do Reino. Eu oro para que tu possas discernir o significado do meu ensinamento, com os olhos do espírito. E, quando o novo instrutor vier ao teu coração, segue como ele te conduzir e deixa que os teus irmãos vejam – e todo o mundo mesmo – o que o Pai pode fazer por um coletor de impostos, odiado, que ousou seguir o Filho do Homem e acreditar no evangelho do Reino. Desde o princípio, Levi, eu te amei como estimei esses outros galileus. Sabendo, então, muito bem, que nem o Pai nem o Filho têm preferência por pessoas, zela para que não faças nenhuma distinção entre aqueles que se tornam crentes no evangelho por intermédio da tua ministração. E assim, Mateus, dedica toda a tua vida de serviço futuro a mostrar a todos os homens que Deus não tem preferência por pessoas; que, aos olhos de Deus e na fraternidade do Reino, todos os homens são iguais, todos os crentes são filhos de Deus”.
Então, andando até onde estava Tiago Zebedeu, o qual ficou de pé, em silêncio, Jesus disse: “Tiago, quando tu e o teu irmão mais jovem vieram até a mim buscando a preferência nas honras do Reino, eu disse que tais honras eram para o Pai conceder e eu perguntei se seríeis capazes de beber do meu cálice, ambos responderam que o éreis. Ainda que não fôsseis capazes então, e se ainda não fordes capazes agora, em breve, estareis preparados para tal serviço, pela experiência que estais por passar. Com esse comportamento deixastes os vossos irmãos enraivecidos naquele momento. Se eles não tiverem já perdoado-vos plenamente, eles o farão quando virem que bebereis do meu cálice. Seja a tua ministração longa ou breve, mantém a tua alma paciente. Quando o novo instrutor vier, deixe que ele te ensine o equilíbrio da compaixão e aquela tolerância de simpatia que nasce da confiança sublime em mim e da submissão perfeita à vontade do Pai. Dedica a tua vida a demonstrar o afeto humano, combinado à dignidade divina do discípulo conhecedor de Deus e crente no Filho. E todos que viverem assim revelarão o evangelho, até mesmo pela sua maneira de morrer. Tu e o teu irmão João tomarão caminhos diferentes, e um de vós pode assentar-se comigo no Reino eterno muito antes do outro. De muita ajuda seria para ti se tu aprendesses que a verdadeira sabedoria abrange a prudência do discernimento tanto quanto a coragem. Tu deverias aprender a ser sagaz para conviver bem com a tua agressividade. Aproximam-se aqueles momentos supremos nos quais os meus discípulos não hesitarão em dar as suas vidas por este evangelho, mas em todas as circunstâncias comuns seria muito melhor aplacar a ira dos descrentes, para que possas viver e continuar a pregar as boas-novas. À medida que estiver ao teu alcance, vive longamente na Terra para que essa vida de muitos anos possa ser cheia de frutos em almas conquistadas para o Reino do céu”.
Depois que o Mestre terminou a sua fala a Tiago Zebedeu, ele contornou a mesa até o fim, onde André estava sentado e, olhando o seu fiel ajudante nos olhos, Jesus disse: “André, tu me tens representado fielmente como o dirigente atuante dos embaixadores do Reino do céu. Embora tu tenhas algumas vezes duvidado e outras vezes manifestado uma timidez perigosa, ainda assim, tu tens sido sempre sinceramente justo e eminentemente equânime ao lidar com os teus companheiros. Desde a tua ordenação e dos teus irmãos como mensageiros do Reino, tu tens sido auto-suficiente e autônomo, todas as decisões administrativas para o grupo foram tuas, exceto a tua designação, como dirigente desses homens escolhidos, que foi feita por mim. Em nenhuma outra questão temporal eu atuei no sentido de dirigir ou de influenciar as tuas decisões. E essa escolha eu a fiz com a finalidade de prover a liderança para dirigir todas as deliberações grupais subseqüentes. No meu universo e no universo dos universos do meu Pai, os nossos irmãos-filhos são tratados como indivíduos, em todas as suas relações espirituais, mas em todas as relações grupais nós provemos infalivelmente uma liderança definida. O nosso Reino é um domínio de ordem, e onde duas ou mais criaturas de vontade atuam em cooperação, há sempre que ser providenciada a autoridade da liderança.
“E agora, André, por seres o dirigente dos teus irmãos com a autoridade de uma designação feita por mim, e porque tens servido assim, como o meu representante pessoal, e como eu estou na iminência de deixar-vos e voltar para o meu Pai, eu libero-te de toda responsabilidade que diga respeito a esses assuntos temporais e administrativos. De agora em diante tu só podes exercer jurisdição sobre os teus irmãos naquilo que tiver sido conquistado pela tua capacidade como líder espiritual, e que os teus irmãos reconheçam livremente. Desse momento em diante tu não podes exercer nenhuma autoridade sobre os teus irmãos, a menos que eles restaurem essa jurisdição, dando-a a ti por meio de uma ação legislativa definida, depois que eu tiver ido para o Pai. Mas essa liberação da responsabilidade, como dirigente administrativo desse grupo, não diminui, de nenhum modo, a tua responsabilidade moral de fazer tudo o que estiver ao teu alcance para manter os teus irmãos juntos com um pulso firme e amoroso durante os tempos de provação que estão pela frente; aqueles dias que estarão entre a minha partida na carne e o envio do novo instrutor que irá viver nos vossos corações, e que afinal vos conduzirá a toda verdade. Enquanto me preparo para deixar-vos, eu gostaria de liberar-te de toda responsabilidade administrativa que teve o seu começo e autoridade na minha presença, como um entre todos. Doravante eu irei exercer a autoridade apenas espiritual sobre vós e entre vós.
“Se os teus irmãos desejarem manter-te como conselheiro deles, eu te instruo que deverias, em todas as questões temporais e espirituais, fazer o melhor para promover a paz e a harmonia entre os vários grupos de crentes sinceros do evangelho. Dedica o restante da tua vida a promover os aspectos práticos do amor fraterno entre os teus irmãos. Sê bom para os meus irmãos na carne quando eles vierem a crer plenamente neste evangelho; manifesta devoção amorosa e imparcial aos gregos no oeste e a Abner no leste. Já que esses meus apóstolos logo irão, todos, estar espalhados por todas as regiões da Terra, para proclamarem as boas-novas da salvação pela filiação a Deus, tu deves mantê-los juntos, durante os tempos de provações que temos pela frente, durante aquele período de testes intensos no qual tu deves aprender a crer neste evangelho sem a minha presença pessoal, enquanto pacientemente esperas a chegada do novo instrutor, o Espírito da Verdade. E assim, André, embora possa não caber a ti fazer as grandes obras, como vistas pelos homens, fica contente de seres tu o instrutor e conselheiro daqueles que fazem tais coisas. Prossegue com a tua obra na Terra até o fim, e então irás continuar essa ministração no Reino eterno, pois não tenho eu dito muitas vezes a ti que possuo outras ovelhas que não são deste aprisco?”
Jesus então dirigiu-se aos gêmeos Alfeus e, de pé entre eles, disse: “Meus filhinhos, vós sois um dos três grupos de irmãos que escolheram seguir-me. Todos os seis fizeram bem ao trabalhar em paz junto com os da vossa mesma carne e sangue, mas ninguém o fez melhor do que vós. Tempos difíceis estão à nossa frente. Podeis não compreender tudo o que sobrevirá a vós e aos vossos irmãos, mas nunca duvideis de que fostes, um dia, chamados para a obra do Reino. Durante algum tempo não haverá multidões para administrar, mas não vos desencorajeis; quando o trabalho da vossa vida tiver acabado, eu vos receberei no alto, onde, na glória, vós contareis sobre a vossa salvação às hostes seráficas e ao grande número de altos Filhos de Deus. Dedicai as vossas vidas ao engrandecimento do trabalho pesado comum. Mostrai a todos os homens na Terra e aos anjos do céu quão alegre e corajosamente pode o homem mortal, após ter sido chamado a trabalhar por um bom tempo no serviço especial de Deus, retornar aos trabalhos dos dias anteriores. Caso, agora, o vosso trabalho com os assuntos exteriores do Reino tenha chegado ao fim, deveis voltar à vossa faina anterior com o esclarecimento novo da experiência da filiação a Deus e com a compreensão elevada de que, para aquele que conhece a Deus, não existem coisas tais como um trabalho banal e a faina secular. Para vós que trabalhastes comigo, todas as coisas tornaram-se sagradas, e toda a lida terrena tornou-se um serviço mesmo a Deus, o Pai. E quando ouvirdes os novos feitos dos vossos antigos companheiros apostólicos, rejubilai com eles e continuai o vosso trabalho cotidiano como aqueles que aguardam a Deus e que servem enquanto esperam. Vós tendes sido os meus apóstolos, e sempre sereis, e eu me lembrarei de vós no Reino que virá”.
E então Jesus encaminhou-se até Filipe, que, levantou-se para ouvir esta mensagem do seu Mestre: “Filipe, tu me fizeste muitas perguntas tolas, mas eu empenhei-me em responder a todas, e agora eu gostaria de responder à última das indagações que surgiram na tua mente honestíssima, mas ainda não espiritual. Em todo esse tempo que levei para contornar a mesa e chegar a ti, tu tens estado a perguntar a ti próprio: ‘O que farei se o Mestre for embora e nos deixar sozinhos no mundo?’Ó, quão pouca fé tens! E tu tens ainda tanta fé quanto muitos dos teus irmãos. Foste um bom intendente, Filipe. As tuas falhas foram raras, e uma delas nós a utilizamos para manifestar a glória do Pai. A tua função de intendente está praticamente terminada. Deves em breve fazer mais plenamente o trabalho para o qual foste chamado a fazer – a pregação deste evangelho do Reino. Filipe, tu sempre quiseste que as coisas te fossem mostradas, e muito em breve tu verás grandes coisas. Muito melhor seria se tu tivesses visto tudo isso pela fé, mas por teres sido sincero, mesmo com a tua visão material, tu viverás para ver as minhas palavras serem cumpridas. E então, quando fores abençoado com a visão espiritual, vai adiante com o teu trabalho, dedicando a tua vida à causa de guiar a humanidade na busca de Deus e na busca de realidades eternas, com o olho da fé espiritual e não com os olhos da mente material. Lembra-te, Filipe, tu tens uma grande missão na Terra, pois o mundo está cheio daqueles que olham para a vida exatamente como tu tinhas a tendência de olhar. Tu tens uma grande obra a fazer e, quando ela estiver completa na fé, tu virás a mim no meu Reino, e eu terei um grande prazer em mostrar-te aquilo que o olho não viu, nem ouviu o ouvido, nem a mente mortal concebeu. Nesse meio tempo, seja como uma criança pequena no Reino do espírito e permite-me, por meio do espírito do novo instrutor, guiar-te para a frente no Reino espiritual. E, desse modo, eu serei capaz de fazer por ti muito daquilo que eu não fui capaz de realizar quando permaneci contigo como um mortal deste reino. E lembra-te sempre, Filipe, aquele que tiver visto a mim terá visto o Pai”.
Então o Mestre foi a Natanael. Quando Natanael levantou-se, Jesus pediu-lhe que se sentasse e, sentando-se a seu lado, disse Jesus: “Natanael, tu aprendeste a viver acima do preconceito e a praticar uma tolerância maior, desde que te tornaste meu apóstolo. Mas há muito mais que deves aprender. Tu tens sido uma bênção para os teus companheiros, porque eles sempre foram aconselhados pela tua firme e coerente sinceridade. Quando eu tiver ido, pode ser que a tua franqueza te impeça de ter um bom relacionamento com os teus irmãos, tanto os antigos quanto os novos. Devias aprender que, mesmo a expressão de um bom pensamento, deve ser modulada de acordo com o status intelectual e com o desenvolvimento espiritual do ouvinte. A sinceridade é muito útil na obra do Reino, quando é aliada à prudência do discernimento.
“Se quiseres aprender a trabalhar com os teus irmãos, poderás realizar coisas mais permanentes, entretanto, se saíres à procura daqueles que pensam como tu, dedica a tua vida a provar que o discípulo que sabe de Deus pode tornar-se um edificador do Reino, ainda que esteja só no mundo e totalmente isolado dos seus companheiros crentes. Sei que tu serás fiel até o fim, e algum dia eu dar-te-ei as boas-vindas, ao serviço engrandecido do meu Reino, no alto”.
Então Natanael falou, fazendo esta pergunta a Jesus: “Tenho ouvido ao teu ensinamento desde a primeira vez que me chamaste ao serviço deste Reino, todavia, honestamente eu não posso compreender o significado pleno de tudo o que nos dizes. Não sei o que esperar em seguida, e penso que a maior parte dos meus irmãos está também perplexa, mas eles hesitam em confessar a sua confusão. Podes ajudar-me?” Jesus, colocando a sua mão no ombro de Natanael, disse: “Meu amigo, não é estranho que tu fiques perplexo na tentativa de captar o significado dos meus ensinamentos espirituais, já que tu és tão limitado pelos teus preconcebimentos da tradição judaica, e tão confundido pela tua tendência persistente de interpretar o meu evangelho de acordo com os ensinamentos dos escribas e dos fariseus.
“E eu muito te ensinei por meio da palavra pessoal, e passei a minha vida entre vós. Fiz tudo o que pode ser feito para esclarecer as vossas mentes e liberar as vossas almas, e o que tu não fostes capaz de apreender dos meus ensinamentos e da minha vida deveis preparar-te para agora adquirir das mãos desse mestre de todos os instrutores – a experiência factual. E eu te precederei em toda essa nova experiência que te aguarda, e o Espírito da Verdade estará contigo. Não temas; o que não conseguires compreender, o novo instrutor, quando vier, revelará a ti durante o resto da tua vida na Terra e durante a tua reeducação nas idades eternas”.
E então o Mestre, voltando-se para todos eles, disse: “Não vos desanimeis porque deixastes de captar o significado pleno do evangelho. Vós sois apenas homens finitos, mortais, e aquilo que eu vos ensinei é infinito, divino e eterno. Sede pacientes e tende coragem, pois tende as idades eternas diante de vós, e nelas podereis continuar a vossa realização da experiência progressiva, de tornar-vos perfeitos, como o vosso Pai no Paraíso é perfeito”.
E então Jesus dirigiu-se para junto de Tomé, que, levantando-se, ouviu-o dizer: “Tomé, a fé tem faltado-te com freqüência; contudo, quando tiveste os teus momentos de dúvida, nunca a coragem te faltou. Eu sei muito bem que os falsos profetas e os instrutores espúrios não te enganarão. Depois que eu tiver ido, os teus irmãos irão apreciar mais o teu modo crítico de ver os ensinamentos novos. E, quando estiverem todos espalhados até os confins da Terra, nos tempos que virão, lembra-te de que ainda és meu embaixador. Dedica a tua vida à grande obra de mostrar como a crítica da mente material do homem pode triunfar sobre a inércia da dúvida intelectual frente à demonstração da manifestação da verdade viva. Essa mesma verdade viva que atua na experiência dos homens e mulheres nascidos do espírito, e que produz os frutos do espírito nas vidas deles, fazendo-os amarem-se mutuamente, como eu vos tenho amado. Tomé, eu estou contente de que tu te tenhas unido a nós e sei que, após um curto período de perplexidade, tu continuarás no serviço do Reino. As tuas dúvidas têm deixado os teus irmãos perplexos, mas elas nunca perturbaram a mim. Tenho confiança em ti e preceder-te-ei mesmo nos confins da Terra”.
Então o Mestre seguiu até onde estava Simão Pedro, que se levantou enquanto Jesus dirigia-se a ele: “Pedro, sei que tu me amas, e que tu dedicarás a vida à proclamação pública deste evangelho do Reino, tanto a judeus quanto a gentios, no entanto eu fico angustiado com o fato de que os teus anos de contato tão íntimo comigo não te ajudaram a pensar mais antes de falar. Por qual experiência deves passar antes de aprenderes a colocar uma vigilância nos próprios lábios? Quantos problemas não nos trouxeste com as tuas palavras impensadas e com a tua autoconfiança presunçosa! E tu estás destinado a trazer muito mais complicações ainda para ti mesmo, se não dominares essa fragilidade. Sabes que os teus irmãos te amam a despeito dessa fraqueza. E deverias também compreender que esse defeito de nenhum modo prejudica a minha afeição por ti, mas ele diminui a tua utilidade e não deixa de trazer complicações para ti. Mas tu irás sem dúvida receber uma grande ajuda da experiência que terás a partir mesmo até desta noite. E o que eu agora te digo, Simão Pedro, do mesmo modo eu digo a todos os teus irmãos aqui reunidos: Nesta noite todos vós correreis um grande perigo de tropeçar por minha causa. Sabeis que está escrito: ‘O pastor será golpeado, e as ovelhas dispersadas’. Quando eu estiver ausente, haverá um grande perigo de que alguns de vós sucumbais às dúvidas e tropeceis em vista daquilo que sobrevirá a mim. Mas eu prometo-vos agora que voltarei a vós por um breve momento, e que então eu estarei diante de vós na Galiléia”.
Então Pedro disse, colocando a sua mão no ombro de Jesus: “Não importa se todos os meus irmãos sucumbam às dúvidas por tua causa, eu prometo que não tropeçarei em qualquer coisa que possas fazer. Irei contigo e, se for necessário, morrerei por ti”.
Enquanto Pedro permanecia diante do seu Mestre, todo trêmulo, com a emoção intensa e transbordante de amor verdadeiro por ele, Jesus olhou diretamente dentro dos seus olhos molhados e disse: “Pedro, em verdade, em verdade, eu te digo, nesta noite o galo não cantará antes que tu me tenhas negado três ou quatro vezes. E, assim, o que tu não conseguiste aprender de uma ligação pacífica comigo, tu irás aprender por meio de muita complicação e de muitos sofrimentos. E, depois que tu tiveres realmente aprendido essa lição imprescindível, deverias fortalecer os teus irmãos e continuar levando uma vida dedicada a pregar este evangelho, embora possas ir para a prisão e, talvez, seguir-me e pagar o preço supremo pelo serviço de amor na edificação do Reino do Pai.
“Mas lembra-te da minha promessa: Quando eu ressuscitar, permanecerei convosco algum tempo antes de ir para o Pai. E, nessa mesma noite, eu farei uma súplica ao Pai para que fortaleça cada um de vós naquilo por que devereis agora tão em breve passar. Eu vos amo a todos, com o amor com que o Pai me ama e, portanto, deveríeis doravante amar-vos uns aos outros como eu vos amei”.
E por fim, depois de cantarem um hino, eles partiram para o acampamento no monte das Oliveiras.
Fonte: Livro de Urântia, Documento 181.
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