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A verdade constrangedora sobre Paulo e Sabina

A verdadeira história de Paulo e Sabina é bastante constrangedora. Paulo buscava mulheres mais bonitas e inteligentes que Sabina. Mas elas buscavam homens mais bonitos e ricos que Paulo. Então ele foi ficando com Sabina, que não era assim tão bonita, mas pelo menos beijava bem. Também não era muito inteligente, não gostava de ler, preferia ficar no msn conversando com as amigas. Às vezes esse gosto pela futilidade incomodava Paulo. Ele queria uma mulher culta, que pudesse conversar sobre Dostoievski, Aldous Huxley, sobre as teorias filosóficas que ele tanto apreciava. Sabina não gostava nem de filme de arte. Achava chato, muito parado, e ninguém pedia ninguém em casamento. Filme, para ser bom, tinha que ter pelo menos um pedido de casamento. Paulo tentou, pela internet, conhecer outra mulher. Tinha que haver pelo menos uma que gostasse de ler. E, de fato, havia muitas. Elas liam Clarice Lispector, eram introspectivas, tinham sensibilidade para descrever em detalhes o temperamento de uma pessoa. Paulo ficava encantado, mas quando via as fotos, percebia que não poderia namorar uma garota daquelas — porque eram feias. Acabou se acostumando aos papos chatos de Sabina. Como não tinha nenhuma cultura, ela só sabia conversar sobre o que os amigos e os parentes tinham feito durante a semana. Não falava sobre personagens interessantes de livros. Quando descrevia um filme, dizia apenas que era “muito legal” ou “muito ruim”, era incapaz de se lembrar de detalhes da trama. Se Paulo reclamava, ela respondia “Ai, eu sou burrinha, né? Ha, ha, ha…” Um dia Paulo explodiu, e acabou contando a verdade. Nunca sonhara com Sabina. Ficara com ela apenas porque as mulheres mais bonitas e mais inteligentes que ela estavam interessadas em homens mais ricos e mais bonitos que ele. Sabina levou um susto. “Então aconteceu com você também?”, perguntou. “Como assim?”, respondeu Paulo, confuso. É que eu também buscava homens mais bonitos e ricos que você, mas eles não quiseram nada comigo. Os dois caíram na risada. O namoro deles era fruto das circunstâncias. Mas Sabina lembrou que Paulo beijava bem, e demorava um pouco para gozar — até dava para gozar com ele. E Paulo lembrou que Sabina tinha um corpinho muito gostoso, era bem quentinha na cama, não tinha vergonha, não ficava com grilos. Ficar com ela era bem melhor que ficar sozinho. Os dois se abraçaram, foi Paulo quem começou a falar. “Desculpa, tá. Na verdade eu tenho de agradecer por ter você. Quando eu estava sozinho, eu era muito triste…” Parou por aí porque sentiu que estava se emocionando demais. Sabina ficou comovida, seus olhos se encheram d’água, mas não sabia direito o que dizer. Acabou dizendo “eu te amo”, o que deixou Paulo um pouco assustado. Ele se sentiu pressionado, achou que a garota queria que ele também dissesse que a amava, mas não era exatamente isso que ele queria dizer. “Eu também te amo”, acabou dizendo, sem saber como se livrar daquela pressão.

Até hoje Paulo não sabe se ama Sabina, mas os dois continuam juntos. E essa é toda a verdade sobre eles. As coisas que eles escrevem nos cartões, as coisas que eles dizem para os amigos, as coisas que eles falam um para o outro quando estão ao telefone, essas são apenas as mentiras que vocês já conhecem.

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9 Comments

  1. cerise

    adorei

  2. Paulo Paiva

    Muito bom, cara! A estória vai tomando um rumo inesperado e ao final fiquei sem saber se o relacionamento dos dois valia ou não a pena (considerando todas as circunstâncias…), o que é um testemunho da qualidade de seu mini conto. Abração.

  3. Rita

    Ótimo!!
    :))

  4. Ronaldo Brito Roque

    Sabe qual o problema, Paulo? Acho que nem eles sabem se o relacionamento vale a pena. É por isso que continuam juntos. Não querem arriscar a busca de um novo amor, para depois descobrirem que eram felizes e não sabiam.

    Valeu,
    Rbr

  5. Pedro Henrique

    Era para se indentificar com algum deles…

    Talvez um dia.

    Mas porque eu?

  6. Jack

    Assim são as pessoas, bem como as criaturas.

  7. Cadê seu livro, Ronaldo?
    Abração
    Yuri

  8. Muito garoto. Valeu a pena ler. Isso é mais comum do que parece. Um abraço e parabéns.

  9. Eu quis dizer “Muito BOM garoto!”

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