Continuo impressionado por não encontrar, onde quer que seja, algum ensaio ou artigo que inclua o Livro de Urântia no rol das principais fontes de argumentos para Role Playing Game. Para quem não sabe, RPG é aquele jogo no qual cada participante, sob a coordenação de um narrador (o Mestre), desempenha um papel, comanda um personagem. Pode ser jogado on line – muito comum hoje em dia – ou ao vivo. Aliás, quem nunca reparou nesses bandos de adolescentes que, trancados num quarto cheio de misteriosos livros em inglês e de dados com numerosas faces, permanecem absortos em algum estranho ritual? Sem falar, é claro, naqueles que não largam o vídeo-game, haja vista o sem número de títulos disponíveis para jogar contra o computador. Eu, por exemplo, joguei meu primeiro RPG num CP-400 Color, um jogo baseado apenas em texto, sem imagens. E, tal como um bom livro, era o máximo! Bom, detalhes detalhes…

Em 2001 ou 2002, sei lá – para mim esses dois anos formam um só – li em alguns sites especializados que certas seitas pentecostais estavam condenando o RPG como sendo coisa do diabo. Nunca vi maior absurdo. O RPG é uma ferramenta pedagógica incrível e, como toda ferramenta, pode ser usado para o bem ou para o mal. (Veja, por exemplo, o site da Ludus e o do psicólogo Alfeu Marcatto.) Quem já conversou com um jogador inveterado de RPG certamente percebeu o quanto ele é articulado, observador e consciente não apenas das suas reações interiores ao próximo, mas também das reações deste para consigo. Num jogo, muitas vezes a “vida” de diversos personagens pode depender da decisão de um só. Deste modo, o jogador aprende, por simulação, o que é a moral, a ética e a responsabilidade. (Não pode arrasar uma campanha de semanas por uma veleidade qualquer.) De tanto vivenciar diferentes papéis, o jogador aprende a lidar com (e a compreender) as diferenças e idiosincrasias alheias, afinal, quando experimenta uma diferente personalidade, deve agir, não segundo sua própria mentalidade, mas conforme o alinhamento das características do papel que lhe cabe. Também pode, como muitos jogadores que conheço, viver num determinado jogo um personagem “do bem” e, num outro, um personagem “do mal”. E, caso se esteja levando a “brincadeira” a sério, poderá entender muito bem o significado desses rótulos. Eu mesmo tenho um amigo (filho de uma ex-namorada) que, apesar da pouca idade, é capaz de conversar cinco minutos com uma pessoa e, em seguida, dar seu alinhamento completo, enumerando suas virtudes e falhas de caráter. Já me surpreendeu diversas vezes com seu elevado índice de acertos.

É óbvio que há muitos grupos por aí que inventam uma infinidade de jogos bobos, trash, escatológicos ou simplesmente sem pé nem cabeça. Mas basta aparecer um bom Mestre e um bom argumento pra coisa virar de ponta cabeça. E é aí que entra o Livro de Urântia. Quem o leu sabe que ele dá mais pano pra manga que as sagas do Tolkien. E isso não é exagero. O sem número de seres, mundos, histórias, sem falar na própria cosmogonia do Livro, dariam pra destilar mil e um argumentos de RPG. Se existem cerca de um trilhão de mundos habitáveis no Universo de universos, cada qual numa fase evolutiva, que tipos de aventuras não poderiam ocorrer em cada um deles? Aquele monte de Serafins, Melquisedeques, Sanobins, Querubins, Vorondadecs, medianeiros, Finalistas… Aliás, haveria melhor forma de compreender as razões que levam um Lanonandec primário ou secundário a rebelar-se contra Deus e o Filho Criador senão interpretando o papel de um deles? E como seria a experiência dum membro do séqüito de um Príncipe Planetário, um ex-mortal já evoluído que, tão acostumado ao conforto, à beleza e à bem-aventurança da Sede Central do Sistema, de repente se vê voluntariamente num planeta inóspito cercado por nativos primitivos que o tratam como um deus do Olimpo? E, me diga, segundo o próprio Livro, não seria nossa vida o mais fantástico dos RPGs? Não temos dentro de nós um Mestre – o Monitor Residente – e, adiante, um objetivo: alcançar num futuro distante a personalidade do Pai Universal?

É por essas e outras que estou, a pedido de um amigo – dono de uma das maiores redes de LAN House do país -, elaborando um MMORPG (Massive Multiplayer Online Role Playing Game) em português, baseado no Livro de Urântia, para que cerca de 150.000 pessoas (foi o que ele disse) possam jogá-lo pela Internet, 24 horas por dia. Espero que os sócios dele não se assustem com o tipo das viagens. E, se for a vontade do Pai, logo logo isto será uma realidade.

[Ouvindo: The angels fell – Dillinja]