Não vou entrar no mérito de ser ou não essa viagem para o espaço um gasto inútil, uma propaganda eleitoral ou coisas do gênero. Como disse em 1996, no conto Paralíticos e Desintegrados, pela boca dos personagens Mauro Austris e Roberto Eca

Eca(professoral): Esse extremo e avançado desenvolvimento tecnológico não é outra coisa senão uma característica da Cultura Ocidental. A técnica noutras culturas era desenvolvida para realizar uma função pré-determinada. Era mais uma das características daquela cultura. Mas a técnica, na Cultura Ocidental, é uma de suas maiores expressões. Aqui não se cria um aparato para simplesmente realizar determinado trabalho. Thomas Alva Edison é apenas uma exceção que confirma a regra. Porque aqui o que interessa é a “vitória”, é a “busca do infinito”. Não se descobriu a fissão nuclear para se construir usinas ou bombas, mas para “dominar” um fenômeno da natureza, para vencê-la. Não se “conquista” – atente bem para esta palavra – a lua ou Marte para que pesquisas científicas pretensamente essenciais sejam realizadas, mas para provar que isto é possível para a mais capaz das culturas. No fundo, tudo não passa de fórmula Indy, de competição com a natureza e com os deuses abandonados.

Austris: Não é à toa que essas naves espaciais tenham essas formas fálicas. Inclusive aquele foguete que foi a Marte era roxo…(risos). Só faltou escreverem nele: Nós somos Machos!! (risos).

Enfim, o Brasil só quer pegar o vácuo de seus superiores.

E já que citei esse conto aí, vale citar também este outro, escrito há dez anos, no qual especulo de leve sobre um possível astronauta brasileiro. Na “cena”, narro momento em que o rei que vivia na barriga do cientista foge através do Boitatá Quântico, ou seja, do teletransporte que ele havia inventado:

De repente uma cena aterradora. De dentro da barriga de Sopal saiu um homúnculo correndo. Vestia uma capa vermelha e tinha uma coroa dourada na cabeça. Leves e Fêndix, estarrecidos, saíram no encalço do estranho ser, que, por sua vez, já transpusera a porta dos fundos da casa. Quando chegaram na sala, viram o reizinho subir numa cobra luminosa que saia de dentro do aparelho de Leves. Era o Boitatá Quântico.

“God save my Kingdom!”, berrou o anão, desaparecendo em seguida.

Os outros ficaram paralisados.

“Aquela… aquela coisa… foi pro trono da rainha da Inglaterra”, murmurou Fêndix.

“Negativo”, replicou Leves. “O aparelho ainda não tava regulado pra isso. Hoje de manhã, eu o usei pra mandar lixo pro espaço. Aquela coisa deve estar em alguma órbita da Terra agora. Foi pro espaço…”

O geneticista fez uma careta:

“Por que todos os astronautas tem de ser gringos? Nunca vi alguém do hemisfério sul ter esse privilégio…”

Encararam-se. Em menos de dois segundos começaram a gargalhar histericamente. Realmente não dava pra imaginar um astronauta brasileiro. Ou dava?