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Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa

O Acordo Ortográfico de 1990, depois de mil e uma burocracias, está a poucos passos de entrar em vigor. Existem algumas mudanças tristes e muitas inúteis — tal como a eliminação do trema, com o qual sempre simpatizei, e a do acento diferencial entre “para” (preposição) e “pára” (verbo parar) — mas ao menos as letras K, W e Y voltarão a ter existência oficial. (Provavelmente a única vantagem do monstrengo…) Claro, esse negócio de escrever “vôo”, “enjôo”, “vêem”, “crêem”, etc. sem acento circunflexo sempre me parecerá algo um tanto esquisito, para dizer o mínimo. Embora sem unidade prosódica — ainda bem — Brasil, Portugal, Cabo Verde, Angola, Moçambique, São Tomé e Príncipe, Guiné-Bissau e Timor Leste desfrutarão agora de um arremedo de unidade ortográfica, o que, na prática, só servirá para nos confundir.

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4 Comments

  1. Ronaldo Brito Roque

    Sou radicalmente contra esse acordo. “Que” e “qüe” são diferentes. O trema está aí para indicar uma diferença real. Se a coisa existe no plano do real, deve também existir do plano simbólico. Portanto o trema tem de continuar. Se os outros países não o usam, eles é que deveriam adotá-lo, em vez de nós deixarmos de usar.

    Abraço,
    Rbr

  2. Pois é, Ronaldo, mas eu só me escandalizei mesmo com o caráter relativo das normas ortográficas quando morei no Equador. Adolescente, fiquei de cara ao descobrir que a Lei “toda paroxítona terminada em ditongo crescente é acentuada” não é uma regra absoluta. Se nós colocamos acento no vocábulo “sábia”, por exemplo, saiba que, em espanhol, o acento só entraria se a tônica fosse o “i”, ou seja, “sabía”, uma vez que lêem a palavra corretamente sem qualquer acento no primeiro “a”. Sim, é o oposto de nós, pois quando escrevem “sabia” lêem exatamente como nós a lemos quando acentuada (sábia). Se a gente se guiasse pelas regras deles, escreveríamos assim: “Eu não sabía que você falava espanhol…” Porque, sem esse acento aí, eles leriam “sábia”. Tudo não passa de convenção mesmo. No fundo no fundo, acho que os acentos e os sinais do tipo trema e quejandos só são úteis mesmo quando não conhecemos as palavras lidas. Lá na Hilda Hilst, apareceu um cara que leu um texto no qual havia a palavra “crosta”. Ele a leu com o “o” aberto: “crósta”. A Hilda quase deu uma paulada no cara: “CRÔSTA!! É CRÔSTA!!!” Algum acordo ortográfico anterior deve ter mandado o circunflexo de “crosta” para o paredão. Daí eu achar muito chato o inglês não possuir acentos e sinais. Quando nosso vocabulário é curto, a gente nunca sabe se está lendo com a ortoepia correta, um saco. A prosódia do inglês, cuja base é o pé e não a sílaba, é apreendida apenas no uso. Por isso acho que essa mudança vai incomodar mais os estrangeiros que queiram aprender o português que nós mesmos. Mas que eu achava o trema bacana, ah, eu achava. Agora, toda vez que encontrar o vocábulo “tranquilo” pensarei que está em espanhol: trankilo
    {}’s

  3. Ronaldo Brito Roque

    É exatamente para isso que serve a acentuação: para nos livrar da oralidade. Em inglês vc precisa ter ouvido uma palavra para saber como ela se pronuncia. Se vc nunca a ouviu, não sabe como se a pronuncia. Isso cria uma dependência absoluta da oralidade. Em português, estamos livres disso. Mas os imbecis querem nos escravizar novamente à oralidade. Escravo odeia a liberdade. Quanto mais liberdade, mais ele sofre.

    Abraço,
    Rbr

  4. Ronaldo Brito Roque

    Uma coisa que esqueci de dizer: uma reforma ortográfica e sempre um prejuízo, porque os livros têm de ser reeditados no novo padrão. Sem falar que a reforma quebra a continuidade histórica do idioma, atrapalhando a comunicação eficaz entre as gerações (como no exemplo da Hilda que vc citou). Enfim, essa reforma é ruim sob todos os aspectos. Continuarei a colocar o trema, e peço que vc, como editor, não o vete.

    Abraço,
    Rbr

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