Aconteceu num agosto…
Não faço idéia de que tipo era — se Boeing ou Airbus, etc. Havia na cabine, além das poltronas de piloto e co-piloto, duas outras, menores, nas quais nos abrigamos. Voltava de Buenos Aires pela Transbrasil — faz uns 10 anos já. Estava comigo um conhecido que trabalhava na finada empresa. Ele me fez a pergunta que eu não ouvia desde garoto: “Quer conhecer a cabine?”
Era noite. O tempo estava magnífico. Poucas nuvens, apenas suficientes para embelezar a vista. O comandante foi nos explicando o básico do funcionamento da aeronave, para que serviam alguns daqueles reloginhos, botões, alavancas… Não gravei muita coisa, mas foi uma conversa agradável.
O melhor mesmo foi aquela visão toda. Bem mais ampla do que nas janelinhas dos passageiros. E víamos para onde estávamos indo, a uns 900 km/h e nem sei quantos de altitute.
Sobrevoámos o oceano e víamos no litoral concentrações luminosas. “Ali é São Vicente”, mostra o co-piloto. “Ali, Santos. Depois, o Guarujá.” Era bacana ver as marcas incandescentes margeando a grande e contínua mancha escura — o Atlântico.
Mais à frente, uma escuridão enorme e pequeninos pontos de luz espalhados — a Serra do Mar. Atrás dela, veio uma enorme mancha luminosa, grande mesmo. A metrópole é bem bonita do alto. Fomos nos aproximando enquanto o co-piloto continuava a descrever os pontos — “A Billings”; “Ali é o centro”; “O Jockey fica ali”; “A Paulista lá”; “A Berrini”.
Dá para ver as várias nuances, as diferenças entre as regiões. Lá de cima, é fácil notar onde estão as áreas mais ricas. Como num gráfico, o desenvolvimento é delineado pela luminosidade; quanto mais luz, mais infra-estrutura.
O comandante nos pediu licença e passou a conversar com a torre, enquanto as ruas de São Paulo ficavam mais próximas. “Esses caras não vão nos expulsar daqui?”, pensei.
“Senhores passageiros, nosso pouso foi autorizado.” Só então vi, ainda distante, a pista iluminada de Cumbica.
É uma operação tranqüila pousar um avião — naturalmente, o tempo perfeito colaborou. Foi uma sensação tão suave… Mal senti o gigante tocar o solo. De volta à primeia classe — minha única vez ali —, peguei meus pertences e parti rumo ao desembarque, lentamente, passo a passo, levemente.