Outro livro excelente, que li semana passada, foi O Penitente, de Isaac Bashevis Singer, Prêmio Nobel de 1978. Toda a trajetória de seu protagonista-narrador, com suas devidas críticas ao mundanismo e ao secularismo, fazem coro com os pensamentos de qualquer pessoa deste planeta que tenha a alma sã. Muito embora, assim como o próprio autor o confessa na introdução, eu tampouco concorde com a solução abraçada por ele, narrador. Alguém deveria lhe dizer: não odeie o mundo, não fuja dele, já foi feito o upgrade da Revelação…
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Tenho um amigo – professor de filosofia e chefe do departamento de jornalismo de uma universidade – que sempre cita Hanna Arendt em nossas conversas sobre política. Cheguei a pensar, maldosamente, é claro, que ele não pensava com a própria cabeça, mas com a dela. Eu jamais poderia lhe dizer tal coisa, pois ele teria um leque de autores para me acusar de haver roubado o cérebro: Allan Watts, D.T.Suzuki, Spengler, Nietzsche, Goethe, Dostoiévski, Henry Miller, Pauwels e Bergier, Olavo de Carvalho, Fernando Pessoa, Hilda Hilst, etc. Poderia até me chamar de urantiano. Mas a questão é que, ao ler A Condição Humana, de Hannah Arendt, vou observando o que me chama a atenção e, de quebra, o que – pelas conversas que tivemos – parece ter chamado a atenção dele. (Mas isso é algo a ser discutido pessoalmente.) Por enquanto ressalto o que atraiu meu interesse:
“Sempre que a relevância do discurso entra em jogo, a questão torna-se política por definição, pois é o discurso que faz do homem um ser político.” (O que prova que, em nossas discussões, quando falávamos de política, cada qual entendia algo completamente distinto. Daí a necessidade de definir os conceitos previamente.)
“A condição humana não é o mesmo que a natureza humana, e a soma total das atividades e capacidades que correspondem à condição humana não contitui algo que se assemelhe à natureza humana.”
“(…) literatura de ficção científica, tão destituída de respeitabilidade (e à qual, infelizmente, ninguém deu até agora a atenção que merece como veículo dos sentimentos e desejos das massas.” (O que confirma a boa idéia que estou tentando levar adiante num livro que venho escrevendo.)
“(…) se temos uma natureza ou essência, então certamente só um deus pode conhecê-la e defini-la; e a condição prévia é que ele possa falar de um ‘quem’ como se fosse um ‘quê’.” (Daí eu concluo também que, se não adianta especular sobre o que é Deus, necessário é aceitá-Lo – como um quem – e lidarmos com Ele.)
“A mudança mais radical da condição humana que podemos imaginar seria uma emigração dos homens da Terra para algum outro planeta.” (Disso também já estou tratando…)
“A inversão hierárquica na era moderna tem em comum com a tradicional hierarquia a premissa de que a mesma preocupação humana central deve prevalecer em todas as atividades dos homens, posto que, sem um único princípio global, nenhuma ordem pode ser estabelecida. Tal premissa não é necessária nem axiomática; e o uso que dou à expressão vita activa pressupõe que a preocupação subjacente a todas as atividades não é a mesma preocupação central da vita contemplativa, como não lhe é superior nem inferior.” (Concordo. Mas devo dizer também que o único princípio global que nos une é aquele que chega por revelação – daí não ser axiomático – a saber, nossa filiação divina e conseqüente fraternidade humana, já que a fraternidade, sem paternidade, é impensável. Tampouco há paternidade impessoal e paz duradoura sem fraternidade. Logo…)
“A queda do Império Romano demonstrou claramente que nenhuma obra de mãos mortais pode ser imortal, e foi acompanhada pela promoção do evangelho cristão, que pregava uma vida individual eterna, à posição de religião exclusiva da humanidade ocidental. Juntas, ambas tornavam fútil e desnecessária qualquer busca de imortalidade terrena; e conseguiram tão bem transformar a vita activa e o bios politikos em servos da contemplação que nem mesmo a ascendência do secular na era moderna e a concomitante inversão da hierarquia tradicional entre ação e contemplação foram suficientes para fazer sair do oblívio a procura da imortalidade que, originalmente, fora a fonte e o centro da vita activa.” (Bem, a própria Hanna Arendt admite: Jesus não negava a ação e foi Paulo quem colocou a salvação como centro da doutrina. Aliás, o cristianismo não é a religião que Jesus, enquanto homem, seguia e ensinava. É o que dela restou. Quanto à dicotomia imortalidade/eternidade, Ernest Becker discorreu muito bem a respeito. Escrevi um artigo sobre o tema.)
Enquanto vou lidando com minha depressão pós-perda-do-HD, eis um artigo dos mais interessantes: The Neurotic Artist: Romanticizing Depression. O autor, um psiquiatra norte-americano, expõe suas especulações que podem ser assim resumidas: e se Kierkegaard e Nietzsche tivessem tomado Prozac? O que teria rolado? Perderiam a criatividade, a clareza moral, a inspiração? A depressão é unha e carne com a personalidade criadora? É um aspecto indissociável do temperamento artístico? Por que não se critica também o tratamento de tuberculose, sífilis ou epilepsia enquanto inibidor de uma suposta criatividade associada a todas essas doenças? Confira.
Outro dia, li uma entrevista da Lygia Fagundes Telles, na qual ela confessava ter abandonado o computador, uma vez que este “comera o conto” que estava escrevendo. Ri comigo mesmo, “ah, essa geração dos anos 50…”. Para castigar minha empáfia, eu – que feito os construtores da Torre de Babel andei me vangloriando do meu conhecimento técnico – acabei por perder, esta semana, todo o disco rígido onde estavam diversos contos e três livros em andamento. Claro que, com a ajuda de e$peciali$ta$, irei recuperar ao menos meus arquivos de becape. Assim, engolindo em seco e assumindo uma certa humildade, resolvi deixar de lado meu Desktop e passarei a escrever o tal romance em meu novo Notebook. Veja a foto:
Há algo de romântico em escrever assim. (Aliás, quase todo meu primeiro livro foi escrito num caderno espiral.) As mil e uma garatujas e rabiscos dão uma certa nostalgia e a sensação de que o caderno, digo, o netebook irá parar ao menos no museu dos meus futuros descendentes. “Olha só, coitado do biso, pensava que era escritor…”
A velhinha de Taubaté existe, mas ainda não é velhinha e tampouco se mudou pra Taubaté: chama-se Marilene Felinto. A figura é tão obtusa que deve ser a única a realmente acreditar na suposta grandeza do governo Lula e do PT. Os demais fãs da estrela vermelha não crêem, apenas mentem para si mesmos, para os outros ou ambos. Aliás, conheci a Marilene Felinto quando ela acreditou que faria – segundo ouvimos lá na Casa do Sol – a “entrevista do século” com a Hilda Hilst. A Hilda, porém, como conhecia a fama da figura, encheu a sala de gente – eu inclusive – e deixou sua nobreza natural ali contrastando com a alma plebéia dessa futura velhinha de Taubaté. Não rolou entrevista do século coisíssima nenhuma. Como poderia? A Hilda não é pra qualquer bico…
Como não sou um bom leitor de jornais, só fiquei sabendo que a Lygia Fagundes Telles ganhou o Prêmio Camões através do J.Toledo. E a Lygia merecia, não só por sua obra, mas por sua pessoa. E, claro, como quase todo escritor, por suas nece$$idades. São 100 mil Euros para aplacar, ao menos, seus problemas materiais. Do resto ela sabe tratar muito bem. Sim, Toledo, brindemos a ela!
As pessoas não têm a menor noção do quão semelhante a esmigalhar com as mãos uma casa de marimbondos é, após ter convivido com ela, escrever sobre Hilda Hilst. Há sempre à espreita uma ou outra viúva ofendida…
Clique aqui e saiba como foi assistir ao filme O Exorcista, na Casa do Sol, acompanhado pela escritora Hilda Hilst, pelo poeta, ex-professor de Oxford e ex-detento da ilha do diabo inglesa, Bruno Tolentino, e mais quinze cães.
Qualquer um que tenha, digamos, a ousadia de – após a publicação de seu primeiro livro – se auto-intitular escritor – eu por exemplo – não pode senão ficar envergonhado diante da informação de que Georges Simenon escreveu, ao todo, “75 romances e 28 contos com seu mais célebre personagem (Maigret), além de 120 romances psicológicos, 200 romances populares, alguns livros de memórias e inúmeros artigos jornal”. E o pior é que o cara recebeu a maior consideração da parte de seus colegas:
“(…) não há necessidade alguma de separar o monarca da plebe: toda autoridade é igualmente má. Há três espécies de déspota. Há o que tiraniza o corpo. Há o que tiraniza a alma. Há o que tiraniza o corpo e a alma. O primeiro chama-se Príncipe. O segundo chama-se Papa. O terceiro chama-se Povo.”
Oscar Wilde, in A alma do homem sob o socialismo.