O Garganta de Fogo

blog do escritor yuri vieira e convidados...

Prática de conversação online

Apenas para avisar aos poucos que se interessam por tecnologias revolucionárias: o Second Life agora tem Voice Chat, isto é, você pode bater-papo nas mais diversas línguas sem tirar a bunda da cadeira. Sim, você pode treinar seu ouvido e sua dicção com pessoas que vai encontrando ao acaso. Sem falar que, agora, as palestras e discussões literárias, políticas e filosóficas ficarão mais dinâmicas. (Antes só o palestrante tinha acesso à transmissão de áudio, as perguntas eram feitas por escrito.) Como também há o recurso do chat comum, sempre que você não entender algo, seu interlocutor pode – como diziam lá no Equador – “dibujar” pra você, colocar tudo em letras de forma. Uma ótima escola de línguas para autodidatas. (Agora só falta a força de vontade.)

Aliás, cá entre nós, a técnica de aprender idiomas fazendo sexo – aprimorada por Sir Richard Francis Burton no século XIX – terá agora toda a segurança da virtualidade. Brave New World

Os atletas cubanos

Realmente um absurdo essa história de deportar atletas cubanos. Pô, os caras estão tentando fugir da Ilha Prisão!! Ao chegar em Cuba, serão presos ou fuzilados. Fiquei pensando nessa palhaçada ontem. (Enquanto eu pensava, o Reinaldo Azevedo escrevia.) Onde estão nossos atletas que não parecem se interessar pelo caso? Não vão defender os colegas? Da torcida brasileira – a mais bárbara e maliciosa de todos os eventos esportivos já ocorridos no mundo (vaiava apenas para desconcentrar os adversários dos brasileiros) – dela não se pode esperar nada, afinal, ficará satisfeitíssima com a eliminação de mais “inimigos” dos nossos atletas.

Ê povinho bunda.

Títulos

Primeiro, o comentário do ombudsman da Folha, ontem:

Cada cabeça, uma sentença.

A minha: é de uma infelicidade antológica o título principal da capa de Turismo. Desrespeita-se quem ainda chora os mortos de Congonhas e quem se angustia com as incertezas da aviação.

Segundo, a explicação: o caderno mostra que a temporada de cruzeiros é uma opção ao caos aéreo; a capa tem uma foto enorme de um navio.

Agora, o motivo, isto é, o título do caderno:

Balança, mas não cai

Um mergulho aristotélico-stanislavskiano

Trecho de mais um artigo imprescindível, Quando a alma é pequena:

“(…) Esse medo, por sua vez, revela-se da maneira mais inconfundível na literatura de ficção nacional. Repassando mentalmente as produções maiores da nossa criação romanesca – índice seguro da imaginação das classes letradas –, o que me chama a atenção em primeiro lugar é a falta absoluta de problemas, de enigmas, de perplexidades. O romancista brasileiro limita-se a retratar situações vistas segundo a ótica de uma filosofia ou ideologia preexistente, de modo que tudo no fim parece óbvio e explicado. Não estou falando de escritores ruins, mas justamente dos melhores. Tomem o excelente Graciliano Ramos no mais bem sucedido dos seu livros, São Bernardo , no mais popular, Vidas Secas , ou no mais ambicioso, Angústia . O que se vê nos dois primeiros são equações de sociologia desenvolvidas com a lógica de uma demonstração matemática, a condição de classe dos personagens determinando suas escolhas e produzindo inevitavelmente o destino correspondente: o senhor de terras age como um senhor de terras, a professorinha como uma professorinha, o camponês diante da autoridade como um camponês diante da autoridade. É tudo muito bem observado, muito bem construído, mas não suscita um único “por que?”. No terceiro romance a fórmula parece complicar-se um pouco mediante a introdução de elementos de psicopatologia, mas no cômputo final estes se somam aos dados sociológicos e explicam tudo. Ninguém nega que esses livros sejam obras-primas à sua maneira, mas, se eles nos ensinam algo sobre a vida brasileira e algo sobre como se escreve um romance, não abrem nossa inteligência para nenhuma questão que ali já não esteja de algum modo respondida. Não têm a força fecundante da grande arte literária. O mesmo pode-se dizer de quase toda a produção de Raul Pompéia, José Lins do Rego, Jorge Amado, Lima Barreto, Guimarães Rosa, José J. Veiga, Antônio Callado, Herberto Sales, Josué Montello e outros tantos.

“Você não pode ler o teatro grego, Shakespeare ou Dostoiévski sem perceber que ali se encontra algo de perfeitamente real e ao mesmo tempo inexplicável, lógico e ao mesmo tempo absurdo. Os ensaios de interpretação podem se multiplicar ao longo dos séculos sem jamais dar conta do mistério. A grande literatura de ficção mostra-nos como é a vida humana, mas não pode nos explicar o porquê. Para fazê-lo, teria de subir um grau na escala de abstração, tornando-se análise e teoria, abandonando portanto a contemplação da vida concreta, que é o seu terreno específico. Mesmo os romances mais complexos do século XX, que incorporam elementos de análise filosófica, como A Montanha Mágica de Thomas Mann, Os Sonâmbulos de Hermann Broch, O Homem Sem Qualidades de Robert Musil ou a trilogia de Jacob Wassermann ( O Processo Maurizius , Etzel Andesgast e A Terceira Existência de Joseph Kerkhoven ) não têm por resultado uma teoria explicativa mas a expressão formal concreta de um aglomerado de tensões sem solução. Daí o fascínio mágico que continuam exercendo sobre o leitor por mais que este, eventualmente filósofo ele próprio, se esmere em transformar o egnima em equação. A equação resolvida é sempre genérica, não esgota nunca a infinidade de sugestões embutidas na trama particular e concreta.

“Nada disso se observa em geral na ficção brasileira, uma literatura de segunda mão que nasce do recorte da experiência pelo molde de explicações previamente dadas. A análise das obras esgota rapidamente a problematicidade da sua cosmovisão, não sobrando outro enigma senão, é claro, o do talento individual que encontrou soluções tão boas para a transposição estética de uma vivência espiritual tão pobre.(…)”

Cansados 2

Da Folha:

ENTREVISTA
PAULO ZOTTOLO

Ricos não são menos brasileiros que pobres, diz o líder do “Cansei”

Empresário afirma que não é menos brasileiro por ter dinheiro e nega que movimento pretenda depor o governo Lula
GUILHERME BARROS
COLUNISTA DA FOLHA

No dia 27, a Philips do Brasil publicou anúncio nos principais jornais manifestando seu apoio ao “Cansei”. A carta da Philips foi alvo de muitas críticas, inclusive do governo. O presidente da Philips, Paulo Zottolo, 51, nega que o movimento tenha qualquer motivação política ou que vise derrubar o governo -e sugere que o presidente Lula se engaje no movimento.
“Eu posso ter minhas diferenças com o PT, isso é uma coisa, mas o que eu não concordo é achar que qualquer movimento que se faça de cidadania neste país ou é de oposição ou é de elite”, diz Zottolo. Ele afirma que vai continuar a apoiar o movimento, apesar das críticas. “Não preciso me sentir culpado porque sou rico”, afirma.

FOLHA – Como nasceu o “Cansei”?
PAULO ZOTTOLO – O Jesus Sangalo me ligou dizendo-se indignado com a situação no país e me perguntou se poderia contar com o meu apoio na criação de um movimento de indignação contra isso. Eu indiquei o João Dória Jr, que seria a melhor pessoa para canalizar o movimento. O João Dória me ligou logo depois de ter conversado com o Jesus: “O cara está bravo”. Eu disse para o João Dória que o melhor era segurar o cara porque ele estava querendo fazer um movimento que não seria benéfico para ninguém. Dória marcou então uma reunião.

FOLHA – O que foi decidido?
ZOTTOLO – O João Dória disse, na reunião, que esse movimento não poderia ser partidário.

FOLHA – Mas ele apoiou Alckmin.
ZOTTOLO – O que eu estou contando foi o que aconteceu. Ele disse que não poderia ser um movimento político nem um movimento para derrubar presidente ou para provocar o impeachment, o que tinha de ser é um movimento de indignação. Assim começou a história. Nessa reunião eu também dei a idéia de trazer a África [do Nizan Guanaes] para nos ajudar.

Sicko

Ainda não assisti ao novo documentário do Michael Moore – Sicko – mas já ouvi alguns comentários. O cara agora está pegando no pé das empresas de convênio médico que, conforme sabemos, costumam merecer as críticas que recebem. Contudo, cá entre nós, o cara levar um grupo de voluntários que trabalhou no resgate das vítimas do WTC, e que teve seqüelas por isso, para se tratar “gratuitamente” em Cuba diz mais sobre o próprio Michael Moore do que sobre as empresas de saúde norte-americanas…

Fui simpsonizado!

Melissa, minha irmã caçula, me simpsonizou. Será que fiquei realmente parecido comigo mesmo?

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Espelho – quase lá

Nosso curta-metragem Espelho – cujo roteiro escrevi e que dirigi com a Cássia Queiroz – está quase terminado. No momento, estamos à espera da trilha sonora. Assim que tiver notícias sobre – como dizer? a estréia? o lançamento? a avant-première? – darei um toque aqui. (Vale lembrar que dois colaboradores deste blog participaram como atores: o Pedro e o Paulo. Não, não é um filme sobre apóstolos…)

Abaixo, no escurinho do cinema, os excelentes atores Renata Mello e Sandro Torres.

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O artigo do Rubem Fonseca

O artigo do maestro Rubem Fonseca no Digestivo CulturalA literatura de ficção morreu? – me lembrou esta máxima do Oscar Wilde (cito de memória): “A vida artística não é senão o desenvolvimento da própria personalidade”. Ora, porque viveram outras personalidades antes de mim minha vida não faz sentido e por isso não mereço viver? Um escritor contemporâneo deve apenas responder a essa questão. Quanto a ser sua personalidade – sua imaginação! – vasta ou medíocre, eis um problema para o leitor, não para ele. Um dedo não pode tocar a própria ponta.

Cansados

Da Folha de hoje:

Cansei de “basta!”

JANIO DE FREITAS

O que mais deseja a riqueza do país, além das condições inigualáveis que o governo Lula lhe proporcionou?

O ODOR EXALADO pelo movimento “Cansei”, ainda que nem todos os seus fundadores tenham propósitos precisamente iguais, é típico do golpismo que sempre foi a vocação política mais à vista na riqueza, não importa se cansada ou não. A fonte de onde surge não lhe nega a natureza pressentida: um escritório de negócios em São Paulo, tal como se identificaria nos primórdios de todos os golpes e tentativas de golpe desde 1944/1945, pelo menos.

Também denominada “Movimento Cívico pelo Direito dos Brasileiros” -batismo que os padrinhos relegaram, por considerarem o apelido “Cansei” mais representativo dos seus propósitos- o que a iniciativa sugere, de fato, é uma interrogação.

O que mais deseja a riqueza brasileira, além das condições inigualáveis que o governo Lula lhe proporcionou? O fim da inflação, o emudecimento do sindicalismo e das reivindicações sociais; concessões transgênicas para todos os tipos de grandes empresas e negócios, Bolsa farta e imposto baixinho ou a zero; e, sobretudo, a transferência gratuita de um oceano de dinheiro dos cofres públicos para os da riqueza privada, por intermédio dos juros recordistas concedidos pelo próprio governo aos títulos de sua emissão. Ainda não basta?

O que deseja a riqueza não pode ser a correção das deformidades socioeconômicas, institucionais e políticas que refreiam o Brasil, enquanto países do seu aparente status desenvolvem-se a níveis exuberantes. É da não-correção que vem grande parte das facilidades pelas quais a riqueza se multiplica sem cessar: a fraqueza ética do Congresso, a corrupção administrativa que só tem o corrupto e não o corruptor, as eleições movidas a marketing endinheirado, e por aí.

Além disso, nunca se viu a riqueza movendo-se, de fato, por correções e reformas a serviço do interesse do país. Os seus lobbies e outros meios só se movem, historicamente, por alterações que privilegiem os interesses da própria riqueza privada. Assim é a história parlamentar e administrativa do Brasil, para dizer o mínimo, do último meio século.

O governo Lula deu e dá à riqueza privada a situação que a ela deu o “milagre econômico” da ditadura, porém, agora sem os inconvenientes produzidos pela força. A quem vive no Brasil em nível de primeiríssimo mundo, conviria, portanto, demonstrar um pouco mais de compostura. Se não para aparentar recato que lhe falte, por um grão a mais de esperteza.

“Cansei” -e daí? Vai fazer ou, pelo menos, propõe o quê, de objetivo, prático e necessário? Disse um dos “cansados”: “Queremos despertar em cada indivíduo o que ele pode fazer para mudar o país”. Pois façam isso no seu próprio movimento. Sem que, para tanto, o seu alegado cansaço exale sentidos que, intencionais ou não, negados ou não, vão até onde não devem.

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