Ontem à noite, no canal Animal Planet, assisti à incrível saga do gringo que veio até a amazônia realizar seu mais acalentado sonho: agarrar uma sucuri de cinco metros! E não só agarrá-la: abraçá-la, enrolar-se nela, esfregar-se em suas escamas, banhar-se a dois, enfim, curtir uma transa, uma sacanagem com uma serpente gigante. Isto é o que eu chamo de inversão de valores. Quem já passou dos trinta deve se lembrar do programa O Mundo Animal, no qual o apresentador, ao contrário dos seus cinegrafistas, certamente não saía ou do jardim da sua casa ou do zoológico da cidade. Nem posso imaginar o que eu – como diria meu amigo Leo Razuk, eu, com minha “mente doentia” – iria pensar, quando criança, se percebesse toda aquela ânsia de se atracar a uma sucuri no simpático e ingênuo apresentador do Muuundo Animaaaal. Coitado daquele velho. Ele provavelmente já não se atracava sequer com a esposa, quanto mais com uma sucuri de cinco metros. Se ainda fosse uma índia, eu até entenderia: “Aaah, quer saber?, tô morrendo de vontade de ir até a amazônia me agarrar às tetas caídas duma ianomami…” Mas a uma cobra?! E quem viu esse episódio sabe que a surpresa não é só minha: a cobrona ficou de cara, juro. Ela mal pôde acreditar naquela situação: foi o índio branco, magro, alto e de cabelo amarelo que nadou atrás dela e a abraçou e não o contrário! Aposto que as demais sucuris, ao ouvi-la, até hoje burlam-se dela e ficam cochichando umas com as outras cada vez que ela se aproxima: “Lá vem aquela maluca que diz ter sido agarrada por um índio branco, coitada…” Alguém deveria ensinar um pouco de ética a esse biólogo documentarista. Ele pode causar danos psicológicos terríveis às pobres cobrinhas gigantescas. Tudo se passa como numa abdução por extraterrestres: a vítima tem de esconder a verdade para não cair vítima do ridículo e do ostracismo social. Vocês precisavam ver o cara, por assim dizer, fazendo amor com a bicha. Que coisa…