Em 1960, o escritor argentino Adolfo Bioy Casares, comparsa de Borges, escreveu Diario de la guerra del Cerdo. Neste livro, as ruas de Buenos Aires são tomadas por uma implacável onda de violência perpetrada por gangues de jovens contra idosos. Toda a ação deste romance perturbador é vista da perspectiva solitária e angustiada de Isidoro Vidal, pacato aposentado, e seus amigos.
Com um arrepio na espinha, leio a manchete da página A23 da Folha de hoje: “Argentina vive onda de violência contra idosos”.
Na ficção, os ataques se enraizavam em motivos menos pragmáticos. A guerra é uma alegoria do embate entre uma tradição cada vez mais perdida e desmoronante num mundo velozmente modernizado. Na versão real da “Guerra do Porco”, como a intitulou Casares, os motivos para essa onda aparentemente são, além da situação econômica do país, com o aumento da pobreza, o fato de Buenos Aires ser proporcionalmente a capital mais “idosa” da América Latina. A isso, somam-se a fragilidade e susceptibilidade dos mais velhos e o hábito, adquirido por muita gente, de guardar dinheiro em casa, em função da perda de confianca nas instituições bancárias após o desastre econômico e o corralito.