Campo Santo de Yungay, Peru
A trágica notícia do deslizamento de terra nas Filipinas, que matou cerca de 1800 pessoas, me fez lembrar de um dos lugares mais estranhos que já conheci.

Em meio à paisagem grandiosa dos Andes peruanos, no sopé do Nevado Huascarán (6.768 m), montanha mais alta do Peru e quinta das Américas, se esconde a simpática e colorida vila de Yungay, uma das principais cidades do Callejón de Huaylas, o vale agrícola cortado pelo Rio Santa, que percorre todo o lado oeste da Cordillera Blanca.

Trata-se, na verdade, da “Nueva” Yungay. Um quilômetro ao sul, está a localidade conhecida como Campo Santo de Yungay. Eram 15:21 h, do dia 31 de maio de 1970. O Peru enfrentava o México pela Copa do Mundo em que o Brasil se sagraria, semanas depois, tricampeão. Um tremor de terra de 7,8 graus na Escala Richter, com epicentro a 150 km de distância dali, moveu o mundo. Os gigantescos pilares graníticos da Face Oeste do Huascarán se desprenderam, liberando 75 milhões de metros cúbicos de rocha e gelo que, despencando quatro mil metros, literalmente sepultaram Yungay e seus 18 mil habitantes. No total, em toda a região da Cordillera cerca de 80 mil pessoas perderam suas vidas, naquela que é considerada a maior catástrofe de todos os tempos no continente americano.

O Campo Santo é uma planície ampla de terra nua, um grande anfiteatro, cercado por montanhas, tendo o descomunal Huascarán ao fundo. Da antiga cidade, restam três palmeiras que parecem tentar escapar de um afogamento com a terra pelo pescoço, as ferragens contorcidas de um ônibus e a ponta da torre da velha igreja.
É um lugar desconfortável e, ao mesmo tempo, intensamente pacífico. O vento é constante e há um silêncio profundo que eu sentia, ao mesmo tempo, cheio de vozes. É inevitável remeter-se àquela data e tentar imaginar as sensações e a rapidez da morte desses milhares de pessoas, sepultados em suas casas, ao lado dos rádios.
Quem já esteve numa grande montanha, sabe o temor reverente que inspiram. Fico imaginando uma montanha dessas, de repente, ganhando vida. E os seres humanos pequenos, muito pequenos, impassíveis e impotentes, aguardando seu destino.