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O blog do Orwell

Idéia muito legal. Os diários do escritor George Orwell, autor de 1984, viraram um “blog” —com um “pequeno” intervalo de 70 anos.

MARRAKECH 27.9.38

The other local daily paper read here is La Presse Marocaine, which is somewhat more right-wing (at any rate more anti-Russian and more pro-Franco) than the Petit Marocain.

There are said to be about 15,000 troops in Marrakech.

Manuelzão relembra Guimarães Rosa

Primeira parte:

Segunda parte:

Terceira parte:

A alma e a dança

Erixímaco

– Observei há tempo isto: tudo o que penetra no homem se comporta logo em seguida como apraz aos destinos. Dir-se-ia que o istmo da garganta é o umbral de necessidades caprichosas e do mistério organizado. Ali, cessa a vontade, e o império certo do conhecimento. Eis porque renunciei, no exercício de minha arte, a todas essas drogas inconstantes que o comum dos médicos impõe à diversidade de seus doentes; e atenho-me estritamente ao uso de remédios evidentes, conjugados um contra o outro segundo sua natureza.

Sócrates

– Que remédios?

Erixímaco

– Há oito: o quente, o frio; a abstinência e seu contrário; o ar e a água; o repouso e o movimento. É tudo.

Sócrates

– Mas para a alma só há dois, Erixímaco.

Fedro

– Quais então?

Sócrates

– A verdade e a mentira.

Fedro

– Como assim?

Sócrates

– Não se comportam entre eles como a vigília e o sono? Não procuras o despertar e a nitidez da luz, quando um mau sonho te atormenta? Não nos ressuscita o sol em pessoa, e não nos fortifica a presença de corpos sólidos? – Mas, em contrapartida, não é o sono e aos sonhos que pedimos que dissolvam as aflições e que suspendam as dores que nos agrilhoam no mundo do dia? E, assim, fugimos de um para o outro, invocando o dia no meio da noite; implorando, ao contrário, as trevas enquanto temos luz; ansiosos de saber, felizes demais por ignorar, procuramos, no que é, um remédio ao que não é; e no que não é, um alívio para o que é. Ora o real, ora a ilusão nos recolhe; e a alma, em definitivo, não tem outros meios exceto o verdadeiro, que é sua arma – e a mentira, sua armadura.

Paul Valéry

Otto Lara Resende entrevista Nelson Rodrigues

Primeira parte:

Segunda parte:

O Rolex e o Celular

Digamos, por motivos de pura ironia, que seu nome era Christian, uma vez que se mostrou tão irritado — em outra conversa velha de um ano, que agora não vem ao caso — ao tratar das “desprezíveis” raízes cristãs (the christian roots) do Ocidente. Christian, um diretor de cinema brasileiro, basicamente de curtas-metragens, me foi apresentando como sendo curador de um relevante festival de cinema do Rio de Janeiro. “Não se preocupe”, me disse, “pelo que ouvi falar a respeito do seu filme, com certeza irei gostar muito”. Eu não estava preocupado, mas quis saber o que ele ouvira. “Ué, bróder, me disseram que o filme era uma porrada no estômago. Fiquei curioso. Se eu curtir, ele poderá ser selecionado pro meu festival.” Estávamos na festa de encerramento de mais uma edição da Goiânia Mostra Curtas, taças de vinho à mão, enquanto, ao nosso lado, uma fila se formava para o bufê que já começara a ser servido. Era noite e o pátio da Secretaria de Cultura estava abarrotado de cineastas, atores, políticos, empresários e culturetes em geral, todos muito satisfeitos em participar de um evento do gênero. Era como se uma atmosfera cosmopolitana tivesse subitamente descido sobre a cidade. Nada como testemunhar que o cinema goiano, em particular, e o brasileiro, em geral, parecia ter finalmente tomado impulso — muito embora não se soubesse exatamente em qual direção…

O rega-bofes patrocinado involuntariamente pelo contribuinte seguia seu curso, enquanto eu, Christian e o também cineasta João Novaes prosseguíamos rindo e conversando sobre temas diversos. A certa altura, lembrando-me da polêmica recente a respeito do sucesso do longa “Tropa de Elite”, decidi indagar:

“E aí, Christian, você gostou do Tropa de Elite? Seria interessante saber de um cineasta carioca se o filme afinal é fiel ou não à realidade.”

O cara mudou de cor instantaneamente, ficou branco, em seguida vermelho, então franziu o cenho e começou a disparar mil petardos contra o filme. Falava na velocidade de uma metralhadora, uma dessas que os traficantes costumam usar nos morros. Mais baixo que eu, Christian às vezes me olhava por cima dos óculos, o que tornava suas sobrancelhas mais ameaçadoramente expressivas. Dizia que o “Tropa” era o filme mais mentiroso e ridículo de todos os tempos, uma enganação com DNA hollywoodiano à qual apenas a massa estúpida poderia dar algum crédito.

“Acho que então faço parte da ‘massa estúpida'”, comentei, “porque achei o filme excelente.”

Vinicius de Moraes e Tom Jobim bêbados

Camus vai ao futebol

O Poder vermelho

Mamãe cortava, lixava, arrancava cutículas. Eu, no meu canto, só podia pensar que aquilo era bobagem. Por que não resolver tudo com um simples cortador de unha? Pele, água quente, esmalte, a dor, sim, era quase nenhuma, mas e o tempo? Porque não gastá-lo com um livro ou filme? Por que o trabalho inútil de criar mais uma superfície onde já havia uma casca bastante eficiente, ainda que dura e fria? E depois, a corrosão. A segunda casca se desfazia e era preciso gastar mais uma tarde para uma nova camada de tinta. Desde cedo eu sabia que seria muito diferente de mamãe. Minhas unhas ficariam expostas, não havia motivo para cobri-las. Os homens que se conformassem. E as mulheres, eu as olhava de cima, não desperdiçava meu tempo e meu dinheiro com cores inúteis. Eu tinha mais o que fazer com minhas tardes de domingo.

Mas, quando ele apareceu, eu vi nos seus olhos alguma coisa mais firme e convicta que minha petulância. Ele parecia satisfeito consigo mesmo, e isso me assustava, eu que tanto tentava me transformar. Eu queria descobrir que força era aquela que o sustentava, que chão ele tinha achado para pisar no meio de tanta onda imprevisível. Mas ele não se revelava, ele apenas me olhava daquele jeito limpo e sereno. E fui aos poucos percebendo que era preciso encontrar outro meio de indagá-lo, era preciso submetê-lo a algum inquérito definitivo e silencioso, e o problema é que eu não tinha nem idéia de como começar. Foi quando aquelas lembranças vieram à minha mente com a força imprevista de um pequeno impacto. Procurei mamãe, vi as suas mãos cruas e pálidas, e senti medo. Pensei em lhe perguntar por que não havia mais cor, mas logo percebi que a resposta não me saciaria. Eu estava inquieta, arisca, obscuramente revoltada. Eu precisava de um ritual, não de uma explicação. Desci as escadas correndo – nem sei por que fui pelas escadas – e confesso que me senti um pouco derrotada quando paguei pelos pequenos vidros vermelhos. Mas depois, trancada no quarto, fui aos poucos recuperando minha confiança e lucidez. O contorno tinha de ser nítido; a cor, uniforme e compacta. Aquela pequena superfície tinha o dever intransferível de atestar toda a minha solidez. Saí do quarto sentindo uma alegria estranha e completamente nova para mim. Acho que pela primeira vez na vida senti vontade de mostrar algo à mamãe. Ela pegou minhas mãos, reparou nelas, contemplou-as como quem contempla de longe o vôo de um pequeno pássaro. Senti que uma nova compreensão, profunda e silenciosa, se instalava entre nós. Quando ele me ligou, não fiquei surpresa. Eu também tinha achado um chão onde pisar. As ondas começavam a se tornar previsíveis, como a órbita da lua, que as gera e justifica. O ritual estava concluído.

Poesia, Arte e Mito

Preste muita atenção:

“Quando a poesia exprime os mitos que a tradição lhe propõe, ela não é autônoma, não tem em si a mesma soberania. Ela ilustra humildemente a narrativa cuja forma e sentido existem sem ela. Se é obra autônoma dum visionário, ela define aparições furtivas que não tem a força de convencer e não têm verdadeiro sentido senão para o poeta. Assim, a poesia autônoma, fosse ela aparentemente criadora do mito, não é em última análise senão uma ausência de mito. De fato, este mundo em que vivemos já não engendra novos mitos, e os mitos que a poesia parece fundar, se não são objetos de fé, só revelam finalmente o vazio: falar de Enitharmon não revela a verdade de Enitharmon, é confessar mesmo a ausência de Enitharmon neste mundo a que a poesia o chama em vão.”
Georges Bataille, em “A Literatura e o Mal”.

E isto ocorre com todo e qualquer gênero artístico. A arte, em suma, deve fincar raízes no Mito e este, assim como toda energia consumida na Terra vem do Sol, recebe sua vitalidade de fora deste mundo…

Verissimos

Do escritor Luis Fernando Verissimo, hoje no Estadão:

O escritor Luis Fernando Verissimo relembra o pai, Erico. “Uma vez, após um enfarte, meu pai foi convidado a se candidatar à ABL e respondeu: “Mas eu já sou quase uma vaga!? Quando o amigo Vianna Moog insistiu, disse: ‘Está bem, Moog. Vou me candidatar para a tua vaga’. Moog nunca mais tocou no assunto. Meu pai era contra qualquer tipo de formalidade”. Verissimo, o filho, vai na mesma linha: “Eu não me candidato porque não tenho obra literária que mereça a honra nem o físico para o fardão, ainda mais depois que o (Moacyr) Scliar me contou que a gente não fica com a espada. Mas também tenho amigos lá dentro e respeito a instituição”.

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