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O artigo do Rubem Fonseca

O artigo do maestro Rubem Fonseca no Digestivo CulturalA literatura de ficção morreu? – me lembrou esta máxima do Oscar Wilde (cito de memória): “A vida artística não é senão o desenvolvimento da própria personalidade”. Ora, porque viveram outras personalidades antes de mim minha vida não faz sentido e por isso não mereço viver? Um escritor contemporâneo deve apenas responder a essa questão. Quanto a ser sua personalidade – sua imaginação! – vasta ou medíocre, eis um problema para o leitor, não para ele. Um dedo não pode tocar a própria ponta.

Admirável argumento

Estive ajudando Miriam Virna — diretora teatral de Brasília — a adaptar o livro Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley, para teatro. Eis um trecho bastante interessante quase ao final do livro (trata-se de um outro livro citado pelo personagem Mustafá):

“Envelhecemos, percebemos em nós aquele sentimento radical da fraqueza, da atonia, do mal-estar devido ao peso dos anos, e dizemo-nos doentes, embalamo-nos na idéia de que este estado penoso é devido a uma causa particular, de que esperamos curar-nos como nos curamos de uma doença. Vãs cogitações! A moléstia é a velhice, e ela é miserável. Precisamos de nos resignar… Diz-se que se os homens se tornam religiosos ou devotos com o avançar dos anos é porque têm medo da morte e do que a deve seguir. Mas tenho, quanto a mim, a consciência de que, sem nenhum terror semelhante, sem nenhum efeito de imaginação, o sentimento religioso se pode desenvolver à medida que avançamos em idade, porque, tendo-se acalmado as paixões, a imaginação e a sensibilidade menos excitadas ou excitáveis, a razão é menos perturbada no seu exercício, menos ofuscada pelas imagens ou afeições que a absorviam. Então Deus, Supremo Bem, sai de trás das nuvens, e a nossa alma sente-O, vê-O, voltando-se para Ele, fonte de toda a luz, porque, tudo desaparecendo no mundo sensível, a existência fenomenológica deixando de ser sustentada pelas impressões externas e internas, sentimos a necessidade de nos apoiarmos em qualquer coisa que permanece e não engane, numa realidade, numa verdade absoluta, eterna. Porque, enfim, este sentimento religioso, tão puro, tão doce de sentir, pode compensar todas as outras perdas…”

Meu livro no Flashpaper

Você conhece o Macromedia Flashpaper? Achei esse programa simplesmente genial. Você pode embutir um livro inteiro em seu site ou blog. Através da barra de ferramentas, é possível ampliá-lo e ocupar toda a tela do navegador, imprimi-lo, fazer buscas, etc. Muy bueno.


Adeus, Bruno!

Faleceu hoje o mestre e amigo Bruno Tolentino, que conheci em 1998, na casa da escritora Hilda Hilst, no dia do meu aniversário de 27 anos. Bruno também morou ali na Casa do Sol – por cerca de oito meses – e, além de termos feito algumas feijoadas juntos, discorremos sobre todo tipo de assunto, principalmente literatura, arte, política e religião. Juntamente com a Hilda e com o escritor Mora Fuentes, costumávamos também, ao final daquelas saudosas tertúlias diárias, assistir a clássicos do cinema. Nunca me esquecerei da expressão em seu rosto quando, certa tarde, apareceu em meu quarto para reclamar do CD que eu estava ouvindo e que, segundo deixou claro, o estava incomodando em seus afazeres: Passages, de Philip Glass e Ravi Shankar. “Essa composição está andando em círculos, não tem a saída da espiral! Isto não é música, é a música como idéia…”, comentou, parafraseando o título do livro que vinha finalizando, O Mundo como Idéia.

Amigo e mestre, vá com Deus e mande um beijo pra Hilda.

Ilustração de Cesar Kayanoki

Esta é uma ilustração de Cesar Kayanoki para meu conto O Abominável Homem do Minhocão. (Nela, vemos o protagonista acompanhado por Topo Gigio.) Clique na imagem para ver uma versão ampliada.

Abominavel

Brasil: uma terra sem sal?

Leio os Sermões do Padre Antônio Vieira desde muito antes de realmente saber o que é a fé. E isso apenas por conselho do Fernando Pessoa que, em suas Obras completas em prosa, ressalta o prazer que é escorregar a língua por aquelas belas palavras e por suas excelentes construções sintáticas. Sim, lia por razões puramente estéticas. (Aliás, vale notar a influência do estilo de Vieira nos ensaios estéticos de Pessoa.) A questão é que, em 1997, após deixar a UnB e sua biblioteca, fiquei algum tempo sem ler os Sermões. Então, anos mais tarde, comprei no Sebo do Messias, em São Paulo, um volume publicado pela editora do Mário Ferreira dos Santos, a Editora Logos. E cá estou a ler novamente o Vieira, não apenas sob a perspectiva estética, mas, agora, também sob o ponto de vista moral e religioso. (Atenção, sou um cristão com upgrade, sou “urantiano”.) E encontrei, no Sermão de Santo Antônio – pregado na cidade de São Luís do Maranhão, no ano de 1654 – uma excelente descrição dos dias atuais, isto é, uma época de corrupção generalizada, na qual, estivesse Santo Antônio vivo, estaria pregando tal como Vieira diz que ele certa vez pregou, ou seja, aos peixes, já que os humanos estão todos surdos. O humor de Vieira é notável. Seu sermão é também todo ele dirigido aos peixes, o que me faz imaginar um monte de colono com cara de “mané” e “jaquim” a ouvir de má vontade o irônico padre.

Quem já leu o Evangelho, sabe que Jesus disse: “Vós sois o sal da Terra”. Eu sempre pensei que isso tivesse algo a ver com o fato de sermos, por assim dizer, a quintessência da vida do planeta, aqueles que dão sabor a essa vida que de outra forma seria puramente zoológica. Outros dizem que ser o “sal da terra” significa simplesmente “fazer a diferença”, uma vez que a comida sem sal é uma coisa completamente sem graça. Mas este “fazer a diferença” é um conceito puramente anglo-saxão… Vieira, por outro lado, afirma que ser o sal da Terra é fazer parte daqueles que conservam o mundo contra a corrupção e a putrefação, uma vez que o sal, desde épocas imemoriais, sempre foi utilizado antes como conservante que como tempero. Os peixes e as carnes sempre foram salgados, não para ficarem mais gostosos, mas para não apodrecerem. Se Jesus estivesse andando por aí, nos dias de hoje, certamente diria: “vós sois a geladeira da Terra, o refrigerador, o freezer…”

Nessa perspectiva, não é nada difícil perceber que o Brasil tornou-se, nas últimas décadas, uma terra completamente sem sal. Os humanistas podem espernear e bradar por uma moral sem raízes religiosas, mas isto não entra na cabeça de mentalidades simplórias e, principalmente, na de mentalidades cínicas e perversas. Sem uma paternidade espiritual, sem uma fraternidade fundada em princípios indestrutíveis, não há clima de confiança que consiga manter a sociedade unida. E o Brasil, por melhor que ande a economia e seus juros, está cada dia mais mergulhado em corrupção. Até já exporta a dita cuja. O Isaac, editor do meu curta-metragem, que morou muitos anos nos EUA, me disse que grande parte desses brasileiros que voltam com as burras cheias de dinheiro apenas fazem o seguinte: trabalham seis meses e, em seguida, vão a um banco pedir um empréstimo. Os bancos, acostumados com uma sociedade de tradições puritanas, confia naqueles que os procuram e emprestam a grana. E os tais brasileiros retornam a seu país de origem com 50.000 dólares que jamais serão devolvidos… Daí os bancos americanos não estarem mais autorizando empréstimos a brasileiros que vivam há tão pouco tempo naquele país. Porque brasileiros não são confiáveis. Porque são naturalmente corruptos e crêem estar levando vantagem sobre os americanos otários. São, enfim, pessoas oriundas de uma terra cada vez mais sem sal…

Profissão de Fé

No site do Mário Ferreira dos Santos (1907-1968), há uma página com os próximos livros a serem relançados. Um deles se chama “Cristianismo, a religião do Homem“, do qual podemos ler o seguinte excerto:

“A única esperança que nos resta de salvar a humanidade da destruição é o cristianismo. Nunca teríamos de lutar tanto quanto hoje. O meu desejo era este, vou confessar agora, eu sempre desejei à minha volta pessoas capazes de um dia ajudar num trabalho de pregação religiosa, mas de pregação séria, independente das seitas, independente das diversas igrejas, nesse verdadeiro sentido do cristianismo, a religião do homem abrindo as portas, porque nós estamos hoje vivendo uma época de desenvolvimento técnico e de desenvolvimento científico, de desenvolvimento cultural em muitos aspectos, mas completamente esvaziada de espiritualidade e sem essa espiritualidade tudo isso é falho, tudo isso é fraco. Só o cristianismo nos poderá dar esta base que nos está faltando: o homem não pode viver sem religião”.

Culto laico

Do escritor romeno Vintila Horia, Viagem aos centros da Terra:

“É evidente que a psicologia, sobretudo a freudiana – e Jung pressentiu-o logo desde o primeiro encontro com Freud -, se transformou, com o tempo, numa filosofia, no sentido mais vulgar do termo. O homem para quem ‘Deus morreu’, como reza o desespero contemporâneo, tem que se refugiar numa algaravia. E aquele que não se quer politizar, ou vender a alma ao diabo, põe-se a acreditar na psicanálise ou nos seus sacerdotes. É todo um culto laico, engendrado por um profeta do século XX, de cuja propaganda se encarregaram, pelo menos ao princípio, as mulheres, como acontece na fase inicial de todas as religiões.”

Ah, apenas um adendo: Harold Bloom acredita que, mais dia menos dia, as pessoas perceberão que não há, num sentido estrito, ciência alguma nos escritos de Freud. Para ele, Freud será lido como um grande ensaísta nos moldes de Montaigne.

Günter Grass no New Yorker

Para quem curte o escritor alemão Günter Grass, e acompanhou a polêmica em torno da sua autobiografia, o site da revista New Yorker publicou um relato do cara sobre sua juventude na Luftwaffe, bastante detalhado. Para quem não sabe, Grass alistou-se no exército alemão durante a Segunda Guerra Mundial. Entre relatórios e notícias do front, visitas regulares à família nos finais de semana e devaneios literários – a cabeça delicadamente apoiada numa metralhadora anti-aérea 88-mm -, Grass vai confessando intenções e sentimentos nem sempre muito nobres a respeito dos motivos e consequências das suas decisões. O trecho sobre seus pais é especialmente revelador.

The two-room hole. The family trap. Everything there conspired to constrain the weekend visitor. Not even the mother’s hand could smooth away the son’s distress. True, he was no longer expected to sleep in his parents’ bedroom like his sister, but even on the couch made up for him in the living room he remained a witness to the married life that continued unbroken from Saturday to Sunday. That is, I could hear—or thought I could hear—sounds I had heard, muffled as they were, from childhood on, sounds that had lodged in my mind in the form of a monstrous ritual: the anticipatory whispers, the lip-smacking, the creaking bedsprings, the sighing horsehair mattress, the moaning, the groaning, the entire aural repertory of lovemaking, so potent, especially in the dark. I had a clear picture of all the variations on marital coupling, and in my cinematic version of the act the mother was always the victim: she yielded, she gave the go-ahead, she held out to the point of exhaustion.

The hatred of a mother’s boy for his father, the subliminal battleground that determined the course of Greek tragedies and has been so eloquently updated by Dr. Freud and his disciples, was thus, if not the primary cause, then at least one of the factors in my push to leave home.

Havia também o tédio e o romantismo guerreiro do Sturm und Drang alemão.

All winter long, the front moved closer to home. The Wehrmacht’s high command tried to tone down the retreat by dubbing it a front-straightening operation. Victory bulletins virtually ceased, and more and more bombardment victims were seeking refuge in our city and its environs. The urge to break away, to flee to any front that would have me, had lost its force. My desire was moving in another direction: I read Eichendorff and Lenau at their most romantic, pored over Kleist’s “Kohlhaas” and Hölderlin’s “Hyperion,” and stood guard by the ack-ack guns, lost in thought, my eyes wandering over the frozen sea.

Há uma história em movimento nestes relatos de vida pessoais durante este período na Alemanha – de Viktor Klemperer a Albert Speer. Para além das análises históricas de longo alcance ou das detalhadas biografias de grandes personalidades, a percepção da vida cotidiana como síntese da totalidade da experiência de uma época faz ressurgir – ressuscitar, como diria Michelet – o sentido mais essencial do viver. Há uma autenticidade neste relatos que nenhum texto moralista, por exemplo, poderia proporcionar, principalmente ao esclarecer como o “medonho” plasmou-se ao viver cotidiano. Por isso, talvez, nos cause estranheza a imagem do Hyperion de Hölderin, aberto, rabiscado, apoiado sobre os canhões enquanto o olhar do leitor/soldado mira o “mar gelado”. Vale a leitura.

Brian K Vaughan

Dia 18 de Maio rolou uma entrevista com Brian K Vaughan, roteirista de quadrinhos ou, como se diz hoje, autor de “novelas gráficas”. Sim, foi no Second Life, aquele “joguinho”. (Não me lembro dos nomes, mas algumas personalidades acreditaram que invenções tais como o telefone e o rádio também não passavam de brincadeiras. A própria IBM acreditava que esse negócio de Personal Computer não era senão uma tremenda perda de tempo. Em suma, a caravana passa…)

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