blog do escritor yuri vieira e convidados...

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Paulo Francis

Nunca fui fã do Paulo Francis. Mas tenho que admitir que o texto abaixo é muito bom.

O marxismo foi, por certo, uma revelação, só comparável ao valor sacrossanto que o cristianismo descobriu na pessoa humana. Mas Marx é o que Merleau-Ponty disse: um clássico. Suas verdades e erros fazem parte de um todo, onde o aplicável e o inaplicável não alteram ou destróem a grandeza geral, mas devem ser vistos à distância, com um detachment brechtiano, e jamais como uma camisa-de-força da nossa realidade, inclusive da ampliação de conhecimento da natureza humana que adquirimos a partir de 1914.

Paulo Francis. Certezas da dúvida. Paz e Terra, 1970. Graças ao Leon Rabelo.

Encontros de Literatura Contemporânea

Fui convidado para participar como debatedor neste evento a ocorrer em São Paulo, na Casa Mário de Andrade, entre os dias 22 e 25 de Julho. Além de mim, estarão presentes os escritores Miguel Sanches Neto, Flávio Izhaki, Luis Eduardo Matta, Ivana Arruda Leite, André de Leones, Flávia Rocha, Douglas Diegues, Annita Costa Malufe, Antonio Prata, Fabrício Carpinejar e Elisa Andrade Buzzo. Para mais detalhes, veja a programação no Digestivo Cultural.

Lawrence Durrell

Será que uma frase é suficiente para a gente se apaixonar por um autor?

Como todos os jovens eu decidi ser um gênio, mas felizmente o riso interveio.

Vou comprar alguma coisa desse cara imediatamente.

Grafite — 17

O amor nos tempos da Internet

A banda Dire Straits tem essa música — dos meus tempos adolescentes — que se encaixa perfeitamente ao momento atual: So far away (vide letra mais abaixo). Basta trocar a palavra “telephone” por MSN, Google Talk, email, Skype, Second Life, Orkut, FaceBook, etc. e você verá o quão relevante ela é…

(Siga a bolinha luminosa.)

So far away

Here I am again in this mean old town
And youre so far away from me
And where are you when the sun goes down
Youre so far away from me

So far away from me
So far I just cant see
So far away from me
Youre so far away from me

Im tired of being in love and being all alone
When youre so far away from me
Im tired of making out on the telephone
And youre so far away from me

So far away from me
So far I just cant see
So far away from me
Youre so far away from me

I get so tired when I have to explain
When youre so far away from me
See you been in the sun and Ive been in the rain
And youre so far away from me

So far away from me
So far I just cant see
So far away from me
Youre so far away from me

São Paulo em 1943

Uma ótima dica do ex-blog do Cesar Maia: um documentário produzido pelos norte-americanos sobre a cidade de São Paulo.

Concertos Heineken

Heineken

Clássicos em papel higiênico

Eca(sorrindo): “E não é o final dos tempos? O que é o Apocalipse? Não é o Livro da Revelação? As coisas hoje estão se revelando para quem quiser ver — revelando-se em sua inconsistência e mediocridade. Nada mais é feito para durar além do tempo que dura um modismo. Você vê por exemplo essa idéia de editar clássicos da literatura em papéis higiênicos… Nada mais significativo.”

Gazeta Uenebense
: “Mas se não fosse essa idéia eu jamais teria lido Joyce e Maupassant.”

Austris: “E também jamais teria cagado na obra de ambos.”

As declarações acima foram emitidas por Roberto Eca e Mauro Austris — personagens do meu conto “Paralíticos e Desintegrados” — em 1997, ano em que foi escrita A Tragicomédia Acadêmica. Tal como outras previsões malucas encontradas nos contos do mesmo livro, segue-se mais esta, anunciada como grande novidade pelo próprio Jornal Nacional. (Veja no G1.) Se eu cobrasse royalties por invenções desse tipo, estaria bem de vida. (Sim, William Bonner, eu já tinha inventado isso 11 anos atrás.)

The Velvet Underground – “Jesus”

Jesus, help me find my proper place
Jesus, help me find my proper place
Help me in my weakness
‘Cos I’m falling out of grace
Jesus
Jesus

A Cidade Encarnada

O quarto tem espelho até no teto. Espelho demais para quem a princípio não quer recordar esta noite. Mas, quando ela apaga a luz, os neons vão entrando pela janela e colorindo o escuro com uma cor esotérica, um espectro que permeia e transcende nossos reflexos. O momento ganha o caráter de um estranho ritual sagrado. Eu penso que ela vai fechar a janela, mas ela se despe também para os edifícios, mostrando que não quer que eu seja o único destinatário da sua nudez. Sua pele branca bem pode ser uma espécie de chama, o centro do ritual, que vai aos poucos se aproximando e ganhando um contorno nítido de corpo feminino. As sobrancelhas, eu as diviso antes que os olhos, porque são mais escuras e sobressaem na pele por contraste. Só depois os olhos me tomam e me absorvem no pequeno transe. Quando eu desligo o som, já ouço a canção verdadeira, aquela que vem do cheiro marinho e acanelado do seu corpo. É essa a música que não cessa, quando sinto seus cabelos cobrindo meu rosto e seu corpo se apoderando avidamente do meu. Abro os olhos levemente exasperado, porque algo dentro de mim ainda quer entender minimamente o que se passa. Então vejo as luzes que escorrem pelo seu corpo, as letras reluzentes da cidade, as promessas de futuro, de prazer e de limite. Compreendo vagamente que não é ela que me possui, é a cidade que escolhe um corpo de mulher para me absorver e consumir numa noite sagrada. Me entrego novamente ao escuro, a minha canção mais íntima flui pelo meu corpo com a delicadeza e a precisão de uma chuva. É a prova de que algo dentro de mim compreende e aceita o amor daquela cidade. Depois a garota está sentada na cama, já vestida, o pequeno capuz lhe cobre as sobrancelhas. Ela permanece em silêncio quando pago a conta, e decido guardar a pequena nota como um registro histórico da nossa noite. Em casa, revejo a nota e a foto que tiramos horas antes num bar – eu sorrio e olho para a câmera, ela está séria, fitando o nada, como se intuísse o que havia de inevitável no nosso encontro. Só então me dou conta do absurdo que tento fazer. Tento manter em papel algo que só cabe à minha pele, e talvez à mucosa fina dos meus lábios. Rasgo a nota, a foto, e o que mais havia de lembrança falsa daquela noite improvável. Decido não tomar banho, para que algo dela fique gravado nos lençóis. Mas, no dia seguinte, já nem os lençóis testemunham a canção sagrada que meu corpo entoou naquela noite. No bolso da jaqueta, encontro um número de telefone. Mas sei que do outro lado vou encontrar apenas uma mulher, não mais a maravilha irrepetível de uma cidade em carne e osso. Porém não há nada na TV, é um dia de chuva e não quero ficar sozinho. Disco os número, resignado.

— Quem é? — Ela me humilha com sua desconfiança.

— Sou eu — respondo, derrotado. — Eu mesmo… apenas eu.

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