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A Resistência do Vinil

E por falar no making of da Mostra Curtas, quero tocar rapidamente no nome do nosso amigo Eduardo Castro, autor das imagens do dito cujo e diretor do divertidíssimo documentário A Resistência do Vinil. Foi ótimo dirigir o Eduardo. Tudo o que eu tinha a fazer era interromper a conversa que ele estava tendo com alguém, em geral comigo mesmo, e lhe pedir para gravar. O resto era praticamente automático. Daí o apelido “piloto automático” e tal. 🙂 Aliás, logo logo o cara vai arrebentar com um documentário bomba que está montando – com dez anos de imagens e entrevistas gravadas (em VHS, miniDV e HDV) – sobre a Guerrilha do Araguaia.

Segue abaixo A Resistência do Vinil, em duas partes de 10 minutos cada. (Tem um bobo lá dizendo que o capitalismo é culpado pelo “fim” do vinil. O problema é que ele adquire seus discos velhos em lojas/sebos, isto é, no mercado. Cada um…)

Segunda parte:

Goiânia Mostra Curtas – making of

Eis o making of, que dirigi, da 6a. Goiânia Mostra Curtas, mais conhecido entre nós como “Onde está o Paulo Paiva?”, hehehe.

Vale lembrar que a cena onde Paulo César Peréio aparece com o dedo em riste foi excluída por motivos bastante claros – bastante claros para quem viu em que trecho tal cena aparecia…

Gosto muito da entrevista com o Juliano Moraes, durante os créditos finais. 🙂

Mais detalhes, logo abaixo do vídeo.

Making of da sexta edição da Goiânia Mostra Curtas – que inclui a 5.a Mostrinha (infantil) e a Mostra Cinema nos Bairros (exibições ao ar livre) – ocorrida entre 10 e 15 de Outubro de 2006, sob coordenação de Maria Abdala (ICUMAM). O tema da mostra foi o cinema experimental, tendo contado com as presenças de Edgar Navarro, Joel Pizzini, Jomard Muniz de Britto, Christian Saghaard e José Eduardo Belmonte. Estes dois últimos, juntamente com o compositor André Abujamra, foram os responsáveis pelas oficinas de Cinema Experimental, Direção Cinematográfica e Música para cinema, respectivamente. Dos 590 curtas-metragens inscritos, 127 foram selecionados e distribuídos em 5 mostras competitivas. Além destes, foram exibidos 19 filmes convidados dentro da mostra Cinema Experimental. A direção do making of e as entrevistas são de Yuri Vieira, com imagens de Eduardo Castro, produção de Paulo Paiva e Cássia Queiroz, e edição de Aline Nóbrega, pela Cora Filmes. A produção executiva é de Pedro Novaes.

Sentando no próprio rabo

Eu não vi o filme do Al Gore e nem quero ver, mas não me confundam com o Paulo Paiva que não acredita no papel humano nas mudanças climáticas, etc. e tal. Acho os ecologistas em geral chatos e chorões, além de herdeiros da tradição política da esquerda, que acha que são as idéias quem define as pessoas e que quem não está do nosso lado está contra nós. Fodam-se.

Mas eu também acho um pé no saco esse escárnio de quem não leu, não viu e não sabe do que se trata e fica com risadinhas, como se falar no efeito das ações humanas sobre o meio ambiente e nas relações entre economia e ecologia ainda fosse realmente coisa de hippie. Tá certo. Então o Nick Stern, o Amartya Sen, o José Eli da Veiga e Miriam Leitão são companheiros em armas de guerrilha e ficam fumando maconha e viajando nessas coisas, né?

Aí eu tava escrevedo outro dia um post sobre a relação entre ciência e política, tendo como base o aquecimento global, pra brigar com o Paulo e depois me deu uma preguiça danada e ele está aqui meio parado, porque eu entrei numa de citações e comecei a estudar e achei tudo isso muito ridículo.

Aí eu vejo um texto como esse no Mídia sem Máscara e me lembro de um texto do Alexandre Soares Silva (não sei cadê, mas procura aí que cê acha nos posts antigos) em que ele dizia que sempre que ouvia alguém falar que não era nem de esquerda, nem de direita, dava um nervoso e ele ficava olhando pros pés da pessoa com medo de que ela fosse começar a sambar.

O Paulo já tinha me falado dessa bobagem da casa do Al Gore ter um consumo imenso de energia e de se configurar em uma hipocrisia muito grande ele viver assim e vir falar do aquecimento global. Eu dei uma risadinha e perguntei se ia chover porque não estava fim de falar dessas coisas. O argumento do texto é bem bobinho. Levado ao limite, ele significa que nenhum de nós, exceto talvez um asceta nas montanhas tibetanas, pode fazer crítica a coisa alguma, porque afinal nosso telhado é sempre de vidro, ou não? Aliás, não há nada que distingua mais a tal da modernidade do que esta separação entre discurso e prática, ou não? Todos os dias, inúmeras vezes, a maioria delas sem que nos demos conta, pregamos coisas que não praticamos ou fazemos coisas que vão contra valores que nós mesmos defendemos.

Eu mesmo, e não apenas o Al Gore, temos modos de vida profundamente insustentáveis em termos ambientais, começando por coisas básicas: entre outras coisas, não separo o lixo do meu lar e trabalho a maior parte do dia em uma ilha de edição com ar condicionado a 19°C gastando preciosos kilowatts de energia produzidos no Brasil num mix que inclui termelétricas a gás, gerando gases estufa, hidrelétricas, alterando radicalmente grandes ecossistemas e emitindo gases estufa, e nuclear, ao risco que brincar com a radioatividade impõe. São apenas singelos exemplos.

Tudo bem. É evidente que o seu Al Gore tem mais responsabilidade que nós pela posição que ocupa e blábláblá. Mas realmente o que me surpreenderia seria ele ter uma casa parecida com um cupinzeiro, construída de adobe, usando técnicas de permacultura, com condicionamento de ar natural, usando técnicas herdadas dos povos pré-colombianos em suas pirâmides, aquecida por células de hidrogênio no inverno e movida a energia solar.

No limite, segundo o raciocínio de Eduardo Ferreyra, ninguém pode falar nada. Sentamos no próprio rabo o tempo todo. Criticazinha besta. Me dá raiva até de ler e gastar minha manhã de sábado escrevendo isso, quando tenho outro post mais engraçado e menos sérião pra fazer. Devo ser tão chatinho quanto esse Eduardo Ferreyra que nem sei quem é.

O Mídia Sem Máscara costuma publicar textos bem melhores.

Saco.

O hippie reacionário

Eu sempre dou muita risada ao ver o Erik Cartman, o gordinho do South Park, xingando alguém de hippie. (Isso sempre me lembra uma ex-namorada que, ao passear por feiras de artesanato, costumava reclamar: “ai, que cheiro de hippie”.) O que eu nunca imaginei é que alguém chegaria um dia a me chamar – sim, a mim, limpinho e cheiroso – de “hippie reacionário”. Pois é, isso rolou.

Como roteirista, fui apresentado a uma figura que pretende dirigir uma adaptação livre para cinema do Fausto, de Goethe. Conversamos por algum tempo sobre o livro e, ao tratarmos do final, ela me deixou claro que não quer nada semelhante a uma “redenção” do protagonista, que o cara tem é de se foder de modo absoluto, como na “vida real”. “Então não é Fausto”, eu disse. E ela me respondeu que, “como marxista”, não acredita nessas bobagens tipo “redenção”, “culpa cristã”, “alma imortal”, “pecado” e coisas do gênero. Eu ri, claro. E discordei. Pra quê… Iniciou-se um daqueles debates infrutíferos, nos quais falamos com as paredes. (Imagino que isso tem a ver com a mania dos dirigentes marxistas de acabar com as discussões no paredão.) Coletivo pra lá, indivíduo pra cá, eternidade pra cá, História pra lá e assim por diante. Eu a compreendia, juro, mas a recíproca não parecia verdadeira – ela estava indignada! A figura, para completar, ainda é professora voluntária de literatura num acampamento do MST, onde, apesar da eterna desconfiança que os sem-terra mantêm para com pessoas de fora do movimento, e a despeito das “origens burguesas” dela, esforçam-se por aceitá-la. E ela entoava isso como se o fato de ter nascido numa família classe-média fosse… um pecado! Ficou muito claro que, em meio deles, ela se vê tão deslocada quanto uma menina pobre entre as patricinhas de Beverly Hills. E, tal como essa hipotética menina, “sabe” que a culpa dessa, digamos, ausência de comunhão é apenas dela, uma mera aprendiz de revolucionária que se põe feliz como um cachorrinho cada vez que um camponês (isto é, um pobre! um proletário! um membro real do povo!) lhe dá atenção. Mas o mais incrível mesmo era vê-la defender aquela gente que, em vista de seu próprio depoimento, jamais colocaria a mão no fogo por uma “burguesa”. Afinal, ela faz parte da classe injusta e eles, da classe dos justos, uma turma que, antes das sete da manhã, se reune para berrar slogans revolucionários e dar gritos de guerra. (Segundo o documentário do João Salles, até o Lula ficou amedrontado ao presenciar isso.)

Conversa vai, conversa vem, insisti num final com a redenção de Fausto. Ela achava isso “ultrapassado” (!!), como se algo que dependesse da eternidade fosse condicionado pelo tempo. Mas explicar isto era inútil. “Ora”, repliquei, “até o Pulp Fiction do moderníssimo Tarantino, um filme de 1994, tem redenção e, de lá pra cá, ainda não conseguiram, nem mesmo o próprio Tarantino, rodar uma tragicomédia que fosse além desta, tanto em forma quanto em conteúdo”. E passei a descrever o início da conversão de Jules, capanga do Marsellus, que acreditava piamente não ter sido baleado graças a um milagre divino. E entrei, pois, a discorrer sobre fé, demostrando que a redenção de Jules foi comprovada por sua atitude corajosa e ponderada na parte final do filme.

Ela arregalou os olhos: “Yuri, você é um dos caras mais loucos que já conheci!”

“Ah, é? E por quê?”

“Cara, você é um hippie reacionário!!”

“Um hippie reacionário?!”, e desatei a rir. “Como assim?”

“Bom, segundo me disseram, você não tem onde cair morto, tá desempregado, não é mais empresário, vive de bicos “artístico-culturais”, seu pai é aposentado (ou seja, não é rico), você não tem diploma, nem sequer tem dinheiro pra ir ao cinema e tomar um chope… Você é praticamente um hippie, cara! Só que cheio de idéias anti-progressistas, conservadoras, capitalistas, liberais, religiosas, enfim, um autêntico reacionário.”

De fato, diante dela, eu era um escândalo a abalar sua fé marxista. Como era possível existir alguém cujas idéias e princípios não representavam a ideologia de sua suposta classe social? Se ela estivesse em meu lugar, certamente já teria se mudado para um acampamento do MST. Ela me encarava embasbacada. Não conseguia engolir o fato de que, se eu estava na merda financeira, isto se dava simplesmente por incapacidade e incompetência minhas – aliadas, é claro, à rapinagem e corrupção estatais (meu estúdio quebrou por ação da “máfia dos fiscais” de São Paulo) – e não por culpa dos “ianques”, dos “capitalistas exploradores” e dos “banqueiros bandidos”. Já eu não parava de pensar que “hippie reacionário” teria sido um ótimo nome para este blog…

Pecados Íntimos Derrapa e quase Capota

Pecados

“Naquele momento, Larry se deu conta de que o passado não pode ser modificado, mas o futuro, esse sim, poderia ser diferente. E a construção desse futuro distinto deveria começar naquele instante. Ele podia salvar uma vida.”

Com essa frase, ou algo muito semelhente, dita em off pelo narrador, o roteirista e diretor Todd Field quase destrói o excelente filme “Pecados Íntimos”, título este em português que aliás não faz jus ao muito melhor “Little Children” (“Criancinhas”) original em inglês. O filme é candidato aos prêmios de melhor ator coadjuvante (Jackie Earle Haley excelente no papel do pedófilo Ronnie), melhor atriz, com Kate Winslett, também em ótima atuação, e melhor roteiro adaptado, na cerimônia do Oscar hoje à noite. Aparentemente tem alguma chance no primeiro, embora Eddie Murphy seja franco favorito, chances remotíssimas no segundo, onde Hellen Mirren é quase barbada, e escassas no terceiro, onde a concorrência de “Os Infiltrados” é forte.

O uso do off, ou “voice over”, para empregar com precisão a terminologia cinematográfica, é evidentemente objeto de muita crítica. Via de regra, torna-se uma muleta para coisas que o cineasta não consegue passar através de imagens ou com naturalidade nos diálogos dos personagens. Além de denotar certa incapacidade do diretor e do roteirista, o voice over em geral implica na explicitação de pontos de vista, emoções, fatos ou “mensagens” que deveriam ser transmitidos de forma sutil ou ser subentendidos pelo espectador, sob pena do filme tornar-se didático e/ou de se tratar com estupidez e superficialidade as emoções e o raciocínio do próprio espectador.

O roteiro de “Pecados Íntimos” é pontuado em muitos momentos por observações de um narrador em terceira pessoa, a princípio até interessantes – porque complementam ao invés de substituir, como em “Dogville” e “Manderlay” do dinamarquês Lars Von Trier. Mas o escorregão no final é violento.

O filme conta a história de Sarah (Kate Winslett), Brad (Patrick Wilson) e Ronnie (Jackie Earle Haley). Os dois primeiros, oprimidos pelos casamentos e pela paternidade, têm os filhos como desculpa para se conhecerem e eventualmente se tornarem amantes. Ronnie é um condenado por molestar sexualmente crianças que, solto em liberdade condicional, passa a residir com a mãe na mesma comunidade dos subúrbios de Boston. A vida dos três se entrelaça de maneira inesperada, ressaltando a imaturidade emocional como motivador das ações não apenas deles, mas de quase todos os personagens envolvidos. Criancinhas.

O roteiro é excelente e, o tempo todo, não sente pena dos personagens, resultando em um filme forte e incômodo. Todd Field só se perde no final, quando deixa vazar seu pendor para o melodrama americano. Depois de conduzir o filme de forma impecável e cheia de surpresas até minutos antes do fim, ele não se contém e produz uma pequena epifania individual para Larry, o personagem de Noah Emmerich, que culmina com a frase citada no início do post, através da qual evidentemente ficam todos os personagens redimidos de seus pecados.

O final como um todo é discutível. Moralista? Talvez. Seguramente um pouco melodramático demais.

De toda maneira, não chega a comprometer o todo. Vale à pena assitir.

Chutes (11 erros, 10 acertos)

FILME:

  • — Babel*
  • —— Os Infiltrados*——
  • Cartas de Iwo Jima*
  • Pequena Miss Sunshine*
  • A Rainha*

DIRETOR:

  • Alejandro Iñárritu – Babel*
  • — Martin Scorsese – Os Infiltrados*
  • Clint Eastwood – Cartas de Iwo Jima*
  • Stephen Frears – A Rainha*
  • Paul Greengrass – Vôo United 93

ATOR:

  • Leonardo Dicaprio – Diamante de Sangue
  • Ryan Gosling – Half Nelson
  • Peter O’Toole – Vênus
  • Will Smith – Em Busca da Felicidade
  • — Forest Whitaker – O Último Rei da Escócia

ATOR COADJUVANTE:

  • ——Alan Arkin – Pequena Miss Sunshine* ——
  • Jackie Earle Haley – Pecados Íntimos
  • Djimon Hounsou – Diamante de Sangue
  • — Eddie Murphy – Dreamgirls
  • Mark Wahlberg – Os Infiltrados*

ATRIZ:

  • Penélope Cruz – Volver*
  • Judi Dench – Notas Sobre Um Escândalo
  • — Helen Mirren – A Rainha*
  • Meryl Streep – O Diabo Veste Prada*
  • Kate Winslet – Pecados Íntimos

ATRIZ COADJUVANTE:

  • Adriana Barraza – Babel*
  • Cate Blanchett – Notas Sobre Um Escândalo
  • Abigail Breslin – Pequena Miss Sunshine*
  • — Jennifer Hudson – Dreamgirls
  • Rinko Kikuchi – Babel*

LONGA DE ANIMAÇÃO:

  • — Carros
  • ——Happy Feet – O Pingüim——
  • A Casa Monstro*

DOCUMENTÁRIO:

Submissão

Este curta-metragem, que denuncia a opressão sofrida pela mulher sob o islamismo – com roteiro da deputada liberal holandesa Ayaan Hirsi Ali, de origem somali e ameaçada de morte -, custou a vida do cineasta Theo van Gogh.

A Rainha

a-rainha.jpgNão é bem um filme ruim. A recriação dos acontecimentos em A Rainha, de Stephen Frears, é bastante convincente. Parece até um documentário.

E Hellen Mirren como a Elisabeth II está mesmo perfeita. Tem tudo para juntar o Oscar à gama de prêmios que já recebeu pelo papel — no total, o filme teve 6 indicações: filme, diretor, roteiro original, figurino e trilha sonora original.

A Rainha retrata a comoção popular causada pela morte da princesa Diana, a relutância da família real em segui-la e o esforço oportunista do primeiro-ministro Tony Blair em consertar as coisas. O fato é que, por trás da frieza real atribuída à posição, o sentimento de Elisabeth é bem claro: Diana não era querida.

O “embate” entre o novo, representado pelo recém empossado Blair, e o velho, a milenar monarquia, confere certa diversão ao filme. Mas, pessoalmente falando, não vi tanta graça no todo. É uma situação que interessa mais aos britânicos ou aos que ainda prezam a monarquia nos dias de hoje.

O Labirinto do Fauno

labirinto-do-fauno-poster11t.jpgBelo filme. Embora se apóie em contos de fada, não é um filme infantil. É pesado, rude, violento.

Mãe e sua filha se mudam para uma área de conflitos na Espanha, durante a guerra civil. A mulher está grávida do comandante militar encarregado de extinguir os rebeldes. Na mansão, a menina descobre um labirinto de pedras.

O Labirinto do Fauno, do mexicano Guillermo del Toro, tem uma trama criativa. Os atores são muitos bons e o visual é bonito. Recebeu 6 indicações ao Oscar: filme estrangeiro, roteiro original, trilha sonora original, fotografia, direção de arte e maquiagem.

Na verdade, o filme trata da crueldade humana. Mostra-a sem concessões. E quando a realidade é o inferno, resta a fantasia.

O DC-6 do John Wayne

Dia 28 de fevereiro será reprisado, no Telecine Cult, o filme Um fio de esperança (The High and the Mighty) (1954), protagonizado por John Wayne. Trata-se, salvo engano, do primeiro filme a explorar o drama de passageiros e tripulação de um vôo comercial em pane. Ou seja: é o avô da série de filmes Aeroporto dos anos 70, que, nos anos 80, desembocou em Apertem os cintos o piloto sumiu. Bom, minha intenção não é tratar exatamente do filme, mas sim do avião Douglas DC-6 utilizado nas filmagens.

Esse avião foi comprado em 1957 por uma das maiores empresas brasileiras de aviação à época, a Lóide Aéreo Nacional, da qual meu pai foi funcionário. Em 1961, o presidente Jânio Quadros foi informado de que o coronel Marcílio Gibson Jacques – veterano da Segunda Guerra e um dos proprietários da Lóide – estava contrabandeando motocicletas para o Brasil em caixas que supostamente traziam peças de avião. Filmes como O Selvagem, com Marlon Brando, haviam alavancado o interesse por motos, mas os impostos cobrados pelo governo brasileiro tornavam a compra desse sonho de consumo mais sonho que consumo. Jânio Quadros fez então aquilo que nossos políticos chamam de política, a saber, colocou o coronel Gibson contra a parede: ou ele vendia por uma quantia irrisória a Lóide Aéreo para a Vasp (uma autarquia do governo paulista) ou iria para a prisão por contrabando. Assim, neste mesmo ano, a Vasp, para espanto do mercado, comprou sua rival várias vezes maior e mais cara que ela própria. Mas essa é uma outra história…

O DC-6 do filme tornou-se, pois, propriedade da Viação Aérea de São Paulo, com quem permaneceu até mais ou menos 1968, quando então a Vasp passou a adquirir apenas jatos da Boing. O avião, aliás, tinha uma placa de metal logo à entrada da cabine: “Este avião serviu como palco do filme Um fio de esperança, protagonizado por John Wayne”. Em 1968, já funcionário da Vasp, meu pai tentou vender o avião para uma empresa de Buenos Aires, que preferiu adquirir um dos Vickers Viscount da empresa paulista. Hoje, se o avião ainda existir, deve pertencer a alguma empresa do Peru, Bolívia ou Colômbia – meu pai não se lembra quem ao certo o comprou. Em meio à desordem dos nossos aeroportos, isto talvez signifique que não somente a Vasp, mas também todo um leque de companhias de aviação nacionais, realmente perdeu seu último fio de esperança…

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