Aqui onde é a sala, era o meu quarto. As bonecas disputavam espaço com os ursos, e sempre ganhavam. Mas perdiam para mim quando eu queria dançar. Mamãe reclamava da música alta, mas não da bagunça, porque eu já era organizada. Diferente da Táti, que não sabia guardar nem o seu riso destrambelhado. Mas as outras meninas moravam longe, e eu brincava com a Táti mesmo. Eu era sempre a princesa, porque era mais bonita. Em troca, ela puxava meu cabelo, e eu chorava, chorava, chorava até a hora de a gente brincar de novo. O rancor não cabia no meu coração de seis anos.
Aos domingos mamãe me levava ao culto. Eu ainda não sabia cantar os salmos, mas adorava dar a “paz de Cristo”. Não gostava era dos meninos, que vinham me mostrar besouros e percevejos. Mas mamãe me protegia, e me dava pipoca doce pr’eu não chorar. Mais tarde meu corpo se arredondou, e os meninos continuaram a me incomodar, mas agora queriam me mostrar carros e músculos. Dei meu primeiro beijo, rasguei minha primeira foto, e fiquei muito triste, porque a vida não estava parecendo as estórias bonitas que minha mãe me contara. Mas minhas amigas também rasgavam algumas fotos, e isso me dava certo alívio. Juntas nós ríamos das lágrimas que chorávamos sozinhas.