“Há, então, casos onde um fato não pode vir de todo a não ser que exista uma fé preliminar em sua vinda. E onde a fé em um fato pudesse ajudar a criar o fato, seria um lógico insano quem dissesse que a fé correndo adiante da evidência científica é ‘a mais baixa espécie de imoralidade’ na qual um ser pensante pode cair.” (William James, Desejo de acreditar.)
“É melhor arriscar a perda da verdade do que a possibilidade de erro: essa é a posição exata de quem veta a fé.” (idem.)
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Rimbaud, numa carta de 1871:
“Digo que se deve ser um visionário – que é preciso tornar-se um VISIONÁRIO. (…) O poeta se torna um visionário através de uma longa, imensa e refletida desordenação de todos os sentidos. Ele busca todas as formas de amor, de sofrimento, de loucura…“
Eu diria que os poetas conseguem essa “desordenação de todos os sentidos” exatamente por tentar ordená-los. É alguém que busca e, no caminho dessa busca, esbarra em amores, sofrimentos e loucuras. O poeta é alguém que teve o azar — acredite, neste nosso mundo é um azar — de ter uma percepção privilegiada.
“O Anticristo é o fantasma de toda a humanidade, gerado durante toda a sua evolução histórica. Ele é o ‘super-homem’ que domina a consciência de todos os que procuram elevar-se apenas pelo esforço próprio, sem a graça.” (Meditações sobre os 22 Arcanos Maiores do Tarô, autor anônimo.)
Taí uma descrição que se encaixa bem na personagem Grace (Graça!), do filme Dogville. Ela é o Anticristo.
Se o José Dirceu fosse japonês, já teria cometido o sepuku (ou harakiri) há muito tempo. Será que algum político nipônico já sobreviveu a tal queimação de filme? Aliás, taí uma boa forma de revelar qual o grau de influência da genética na cultura. Deveríamos fazer uma experiência: descobrir mais sujeiras ligando o Gushiken ao Waldomiro Diniz. Caso ele não cometa sepuku, é porque genética nada tem a ver com cultura. Ou será que a “brasilidade” é tão envolvente assim?
Esta semana já estive na França e na China. Em sonhos, claro, que é bem mais barato, mas bati ótimos papos. Até tentaram me ensinar chinês, veja só. Na França, em meio a algum evento cultural, eu dizia para uma garota que me acusou de não gostar de cachorros: mas se eu já morei com 80 cachorros! E ela ficou espantadíssima. E lhe contei dos cães da Hilda Hilst. Também lhe falei sobre quando a mulher do Paulo Caruso me escreveu reclamando do meu texto ao estilo “Eu odeio os irmãos Caruso!!“, no qual eu realmente me mostrei demasiado grosseiro. “Mas se ninguém curte aquelas charges”, acrescentei. “Acho que só mesmo a mulher dele.” E a garota: “Vai ver é preciso dar pro Paulo Caruso pra gostar do que ele faz”. À nossa volta, mil olhares de censura…
Esta noite tive um sonho muito nítido. Estava num grupo que esperava a visita de Paramahansa Yogananda. Estávamos todos sentados num enorme tapete, num pátio ao ar livre. Yogananda chegou com sua irmã e um outro acompanhante que não sei quem era. Conversou com cada um de nós individualmente. Lembro de algumas coisas que ele me disse, mas não irei afirmar que acredito ter sido uma experiência real. (Extrafisicamente falando, é claro.) Ando muito relapso para merecer tais atenções. Depois, sonhei que estava no apartamento do João Gilberto! Claro, pura piração onírica. Passamos por três portas cheias de trancas e travas, uma coisa totalmente paranóica. Lá dentro rolava uma feijoada e tinha uma mulher pê da vida porque alguém estava soltando rojões dentro de casa…
Não imaginei que ficaria tão decepcionado com a trilogia Matrix. E não é porque os últimos dois filmes “não têm conteúdo”, “são apenas filmes de ação” ou críticas do gênero. O primeiro Matrix foi uma espécie de clave de sol que a orquestra, nas duas sequências, interpretou como clave de fá. Se tivessem se afinado com o primeiro filme, eu até poderia não concordar com a cosmogonia dos caras, mas bateria palmas. E não tem nada a ver culpar o virtuosismo técnico do John Gaeta, dizer que os efeitos especiais oprimiram a idéia original. O problema é bem outro: os irmãos Wachovsky tentaram juntar zen-budismo com messianismo salvador, uma coisa que nem o Li Hongzhi da Falun Gong ainda se atreveu a fazer. E, claro, só podiam mesmo criar um monstro de mil e uma cabeças de Mister Smith. Aliás, o maior símbolo da decadência da trilogia é a figura de Morfeus. No primeiro filme, ele é um Mestre, um Iniciado em Altos Mistérios. No segundo não é senão um militar. E no último, apenas o namorado espantado de uma garota que dirige feito doida. Sim, os brothers rimaram Buda com bunda…
Posso dizer que antes eu era assim. Sim, porque ver coisas que supostamente não existem, além de pegar mal pra nossa imagem, ainda deixa esse mundo muito mais complicado do que já é. Mas agora convenhamos: viver fora da LEI, ignorando o SLTP (Spiritual Life Transfer Protocol), é que realmente dá uma puta paranóia…
Meu período brasiliense (1992-1997) foi o que mais me aproximou da realidade. Provavelmente porque eu nunca me inteirava dos mesquinhos acontecimentos mundiais e tampouco, é claro, das nossas inúmeras besteiras nacionais. Dos fenômenos, apenas o imediato me importava. Do universal, me bastavam as idéias, os conceitos, os princípios, as essências… Daí tanta gente me achar um nefelibata, principalmente os politicamente engajados, que me viam como um alienado. E isso me incomodava? Nadica de nada. Certa feita, cheguei a passar todo um dia achando as pessoas inexplicavelmente sombrias, depressivas, para só entender — por intermédio de um amigo com quem dividia apartamento no Centro Olímpico da UnB — para só entender o que se passava tarde da noite: Ayrton Senna havia morrido. Da mesma forma, em 1994, passei horas e horas folheando livros e mais livros numa biblioteca estranhamente deserta, toda minha. Um dia de leitura paradisíaco. Na lanchonete do subsolo compreendi o mistério: o Brasil acabara de se classificar para a final da Copa do Mundo! Mas como, se eu nem sabia que a seleção estava na semifinal? As pessoas e seus interesses… A realidade é mais em cima e mais dentro do próximo. Desligar a televisão é o primeiro passo para a meditação…
Foi durante uma conversa em que eu narrava minhas experiências de projeção astral que o Bruno Tolentino me definiu “honestidade intelectual”: nunca dizer que sabe o que não sabe, nem dizer que não sabe o que sabe. E eu lhe disse que aprendi isso com certa “brincadeira do copo”, quando então, em 1995, enganei dois amigos por quase duas horas de conversas com “espíritos”. Desmenti no dia seguinte, mas ainda hoje, sempre que “realmente me afogo”, eles pensam que sou aquele garoto que “finge se afogar”. Não pretendo mais perder meu crédito com ninguém. Aliás, o Waldo Vieira é honestíssimo e discorre acuradamente sobre os vários tipos e níveis de experiências extrafísicas. Acredite, Bruno: essas coisas acontecem.