O Garganta de Fogo

blog do escritor yuri vieira e convidados...

Bússula Eleitoral

Essa vem direto do blog do Hermeneuta. O cientista político holandês Andre Krowel criou uma survey on-line chamada electoral compass para medir o grau de parentesco entre as posições políticas dos candidatos à presidência dos EUA e as nossas. Basta responder ao questionário e o resultado aparecerá imediatamente. O meu deu próximo ao Obama. Gosto o hermenauta também quando ele desce o cacete no Tio Rei, mas essa é outra história.

Sir Edmund Hillary (1919-2008)

Meu mundo nunca teve muitos heróis. Sou de uma geração pobre deles. Não porque morreram de overdose como os do Cazuza e seus contemporâneos. Não. Eles simplesmente desapareceram num mundo de “celebridades” tão escadalosamente fluorescentes quanto voláteis. Isso é mais triste que parece. É solitário viver sem heróis. Ficamos sarcásticos e cínicos quando crescemos iconoclastas. Até os super heróis dos quadrinhos têm segredos sórdidos, preferências sexuais pouco ortodoxas, medos incontidos. Nada escapa aos olhos crus de uma adolescente órfã de heróis.

Meio desesperada e ainda adolescente, adotei alguns dos meus pais e sofri com a morte moral de um deles recentemente, o Genoíno. Já adulta, tomei outros do meu irmão, mais fortes e interessantes com suas conquistas extremas, mas distantes da minha realidade de café e sofá.

Apenas um deles ficou e se tornou mais próximo quando me mandei de mala e cuia pras Antípodas. Sir Edmund Hillary, o primeiro ocidental que nos anos 50 escalou o Everest.

Esse ícone nacional da Nova Zelândia, estampado na nota de 5 dólares neozelandeses e exemplo do que se pode chamar de cultura kiwi ou “kiwi lifestyle” assumiu um papel importante na minha “educação” para um mundo melhorado, povoado por pessoas com valores fundamentais que não mudam com o tempo. Um mundo com heróis finalmente!

Quando vim pra cá morar ao pé do Ruapehu (o vulcão), soube que Sir Ed (como era chamado por aqui), aos 16, numa excursão da escola ao Ruapehu, ficou fascinado pela montanha. Não o culpo. Eu, que vim do Planalto Central, sofri uma espécie de epifania diante “dele”, coberto de neve, radiante numa noite clara de verão.

É quase ridículo assumir publicamente que me senti próxima do herói. Eu, uma medrosa profissional, de repente, entendi melhor meu irmão e suas aventuras, suas conquistas e, finalmente, seus heróis – Shackleton, Scott, Klink, Blake, Cousteau…Hillary.
Depois, à medida em que ia me aclimatando, o jeito “kiwi” de viver pareceu menos absurdo e rude. O DIY (Do it yourself), o andar descalço, o prático antes do bonito… E, mais uma vez, Sir Ed, que se definia como um “ordinary kiwi bloke” (um neozelandês comum), serviu de modelo.

Ele subiu o Everest, chegou ao Pólo Sul, subiu o Ganges e muito mais. Sobreviveu a todos os tipos de intempéries naturais e interiores até falecer hoje, aos 88 anos, na mesma casa de fazenda em que nasceu, nos arredores de Auckland, e para onde sempre voltou depois de cada viagem.

O Himalaia tomou-lhe bons anos de vida (incluindo as expedições e depois a construção de hospitais e escolas com os fundos de ajudou a levantar mundo afora), a mulher e a filha adolescente (mortas num acidente de avião nas montanhas nos anos 70), a alegria de viver (uma depressão que durou anos depois do acidente). Mas o herói, e mais herói por isso, sempre contou do que as montanhas lhe deram, do que aprendeu perambulando por lugares longínquos e, principalmente, por entre as pessoas que lá vivem, como os Sherpa, que, segundo ele, resgataram-lhe a paz de espírito.

Fiquei triste com sua morte hoje. Não é fácil saber da morte de um herói, ainda mais com tão poucos. Procurei consolo falando dele pra minha filha, que me ouviu com olhinhos arregalados e curiosos de bebê. “Kiwi” como Hillary, Clarice crescerá ouvindo muito sobre o herói de seus pais até que encontre os seus próprios. Até lá, Clarice, como diria Sir Ed, “be determinate, aim high”!

Como você interpreta?

Por conta do doutorado tornei-me uma máquina de ler e escrever. Nada a ver, infelizmente, com o mundo cotidiano. Embora meu tema seja o jornalismo, sua interpretação acadêmica afasta-se bastante do que ocorre no dia-a-dia da redação, embora nunca deixe a distância tornar-se intransponível, ou meu trabalho servirá apenas para calçar mesa.

Dentre as leituras obrigatórias para minha tese está Paul Ricoeur. Num texto sobre a relação entre hermenêutica e ciências sociais há uma passagem muito legal; motivo deste post.

Portanto, de acordo com certo ponto de vista, a hermenêutica é compreendida como a reconstrução de um significado endereçado a um intérprete na forma de uma mensagem. Este tipo de hermenêutica é animada pela fé, por uma predisposição para ouvir, e é caracterizada pelo respeito ao símbolo como forma de revelação do sagrado. De acordo com outro ponto de vista, porém, a hermenêutica pode ser compreendida como a desmistificação de um sentido apresentado pelo interprete sob a forma de um disfarce. Esta forma de hermenêutica é animada pela suspeita, por um ceticismo em relação ao dado, e é caracterizada pela desconfiança em relação ao símbolo, entendido como uma dissimulação do real.

As implicações desta distinção são muito interessantes. Denota não apenas uma diferença de método, mas de maneiras próprias – e até mesmo opostas – de encarar a atividade intelectual e a própria existência. Alguns de nós somos mais propensos a desconfiar, enquanto outros ouvem com maior “caridade”. Obviamente alternamos entre um e outro pólo dependendo do assunto. Não vejo como interpretar proposições políticas senão do segundo modo. Entretanto, não se pode, ao meu ver, entender arte senão do primeiro modo. Em todo caso, ao assumirmos qualquer das posições parecemos já ter escolhido a maneira como nos dispomos em relação ao assunto ou ao autor. Eu, do meu lado, costumo me fiar mais do que desconfiar. E vocês?

Isaac Bashevis Singer

Li meu segundo livro desse ganhador do Nobel de 1978, a coletânea de contos “Um amigo de Kafka”. Simplesmente nota dez! Isaac Bashevis Singer é uma prova de que talento, humor, imaginação e religiosidade podem se fundir num mesmo autor e mexer fundo com nossa cabeça. A genialidade desse cara, sublinhada por uma tensão dialética entre fé e despudor, deixaria o judeu “esclarecido” Woody Allen morrendo de inveja. Veja o que ele diz, em poucas palavras, durante seu discurso ao receber o Nobel, sobre o porquê de insistir em escrever numa língua quase morta, o iídiche.

Enquanto a caravana passa…

Francisco Guides, um visitante deste blog, num post sobre o “desabafo de Alexandre Garcia” contra a corrupção geral dos nossos políticos, a falta de segurança, a Constituição Cidadã idiota, os impostos e assim por diante, escreveu: “Enquanto os cachorros latem, a caravana passa”. Isto é, o Alexandre Garcia — e por conseguinte nós, deste blog — somos os cães a latir enquanto a caravana petista comandada por Lula passa. Repliquei: “A caravana dos porcos, faltou dizer. [Vide A Revolução dos Bichos (O Triunfo dos Porcos), de George Orwell, e conheça a radiografia dos lulistas, petistas e esquerdopatas de plantão.]” Mas a verdade é que os esquerdopatas daqui logo logo irão aprender com o amigo do Lula, Evo Morales, a fazer o mesmo que a caravana boliviana de ponchos rojos, literalmente a tribo dele, anda fazendo com os cachorros de lá…

Ah, a gente faz o mesmo com vacas e galinhas, né mesmo? Eu sei, se viva estivesse, a Hilda Hilst cairia morta ao ver uma cena dessas, mas, no fundo, tudo não passa de um mero choquezinho cultural… (Não! O problema, senhoras e senhores, é que eles estão apenas demonstrando o que pretendem fazer com seus oponentes políticos caso seus interesses sejam contrariados.)

Dois docs políticos

A amiga Carolina Paraguassu, diretora e produtora, finaliza seu doc Resistência.doc, sobre a trajetória política do governador goiano Mauro Borges. O trailer pode ser conferido aí acima e o material promete.

Além dele, o polêmico Guerrilha do Araguaia – As Faces Ocultas da História, dirigido pelo Eduardo Castro, terá sua versão televisiva exibida no próximo dia 27, às 21 horas, na TV Cultura, para todo o país. Veja também o trailer na tela acima.

Mova a câmera!

Movimentos inesperados e surpreendentes de câmera, sobretudo planos sequência bem feitos, são um dos componentes fundamentais da magia do cinema. Aliás, aqui um belíssimo texto sobre grandes planos sequência com links para alguns deles no You Tube. Na tela acima, um excerto de Soy Cuba, de Mikael Kalatozov, uma pérola da produção comunista, com alguns dos mais espetaculares planos sequência já realizados (a história deste filme é retratada em “O Mamute Siberiano”, do brasileiro Vicente Ferraz).

Muitos de nós, jovem cineastas, entretanto, talvez influenciados por uma certa valorização do experimentalismo que confunde inovação estética com pobreza técnica e operação de câmera porca, parecemos achar que enquadramentos bizarros e câmeras tremidas a ponto de causar enjôo no espectador são coisas desejáveis em nossos filmes.

Talvez isso se deva também ao fato de acharmos que movimentos de câmera elaborados demandam necessariamente gruas, dollies e steadicams de milhares de reais. Na verdade, com criatividade e alguma habilidade manual, é possível improvisar movimentos de câmera que agregam enorme valor a nossos filmes, ou ainda construir equipamentos que fazem praticamente o mesmo que suas contrapartes caras.

Um exemplo disso é o Steadycam de 14 dólares, que qualquer um que saiba o endereço de uma ferragista pode construir em casa. O essencial é compreender o princípio de funcionamento de um steady, nada mais do que simplesmente fornecer um contrapeso à câmera, evitando que ela rotacione em seu eixo horizontal (em movimento indesejado de tilt). Vejam, por exemplo, este filme demonstrativo e comprovem a eficácia da traquitana.

Steady

Outra peça genial é o livro “Killer Camera Rigs that You Can Build”, que detalha projetos relativamente simples de gruas, braços e suportes para gravações em carros, entre outras peças, que revolucionarão seus filmes. Veja também que beleza os filmetes demonstrativos.

Metrô

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Estação Consolação, São Paulo

Salvador

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Salvador, no fim de ano. Clique na foto

Quando queremos desaparecer?

Artigo do Professor José Eli da Veiga na Folha de hoje.

Ambientalismo, entre crença e ciência

JOSÉ ELI DA VEIGA

“SALVAR O planeta” é uma expressão tão falsa quanto presunçosa. Pois nada que a espécie humana possa fazer afetará o planeta na escala geológica de tempo, de milhões de anos.
Diferentemente do que pretende esse slogan, não é a Terra que está sendo posta em perigo por drásticos impactos ambientais contemporâneos, como aquecimento global, erosão da biodiversidade ou escassez e degradação dos recursos hídricos.
O que está na berlinda é a possibilidade de a espécie humana evitar que o processo de sua própria extinção seja acelerado pela depleção de boa parte dos ecossistemas que constituem a biosfera. Essa fina e delicada camada que envolve o planeta.
Na mesma toada, também é falso e presunçoso o discurso que apresenta a conservação da natureza como forma de “superar as ameaças à vida no nosso planeta”. A continuidade da maior parte das formas de vida -das bactérias às baratas, passando pelas amebas- nem de longe está ameaçada pela capacidade destruidora adquirida pela espécie humana.

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