No mês passado, eu sanei uma velha dúvida. E foi na prática mesmo, sem nada de teoria.
Fui ao Rio fazer um frila e, numa quarta-feira de manhã, peguei a ponte aérea de volta a São Paulo. Para poder chegar à minha poltrona, a 5a, na janela, pedi licença à passageira da 5b, a do meio, que prontamente se levantou para que eu pudesse passar. De cara, eu a reconheci, apesar de seus imensos óculos de sol.
Numa discreta blusa branca e preta, a senhora retirou um grosso livro (em inglês) de sua bolsa (Prada, deu pra ver bem) e passou a viagem lendo. Confesso que ela me deixou um pouco tenso. E se eu cometesse alguma gafe? Sei lá…
Resolvi, assim, ficar “na minha” o máximo que conseguisse. Ou seja, mal abri a boca. Acho que o “máximo” que fiz foi pedir-lhe a revista da Gol que estava no “porta-coisas” à sua frente. “Posso?”, perguntei-lhe. “Claro”, respondeu-me.
Nem aceitei a barrinha de cereal; pedi apenas água com gelo. Ela só aceitou o suco de manga. “Light”, frisou.
Daí que, chegando a São Paulo, me distraí olhando pela janela a imensidão de concreto e asfalto. Foi quando a minha antiga dúvida se resolveu.
Como não notei que o comissário me dirigia a palavra, pedido o copo já vazio, a senhora me chamou a atenção. Não disse uma palavra, na verdade. Apenas tocou meu ombro — e com certa força, não foi ligeiramente — usando dois dedos, o indicador e o do meio.
Agora já posso dizer à Débora, minha filha, que tá liberado o cutucão. Se a Gloria Kalil cutuca, nós também podemos cutucar, não?