Passei umas boas três horas conversando com Gustavo Barcellos, que traduziu alguns dos livros do RPG Vampire. Mas quero me limitar a apenas uma constatação: segundo nossa análise (feita em meio a muita risada, é claro), o alinhamento do deputado José Dirceu – bom, parte dele, ignoramos destreza, inteligência, carisma, etc. aquelas coisas do sistema D20 – nossa análise mostra que ele é “leal” e “mau”. Isto é, ele é leal à sua própria visão maléfica da realidade. E ainda fica usando essa sua lealdade à própria biografia (biografia esta dedicada a uma ideologia que matou mais de 100 milhões de pessoas no século XX) como se isso, por si só, fosse um aspecto positivo. Como diz o Gustavo – e qualquer jogador de RPG sabe disso – um personagem “leal-mau” é muito pior que um “caótico-mau”. Este último é desprovido de método e sangue frio, elementos que o primeiro tem de sobra, o que faz com que sua maldade seja mais eficiente. E pior: o “leal-mau”, com certa dose de inteligência, é excelente para manipular personagens “caóticos-neutros” de sabedoria 0 ou -3, tipo o Lula. As pessoas deveriam jogar mais RPG. Nada como identificar o alinhamento dos personagens do nosso Globe Theatre, o planeta Terra. (Ai, dirão alguns, quanta baboseira esse maniqueísmo! E eu: maniqueísmo não, RPG. Pergunte ao Mestre: alinhamentos não são absolutos – vivendo e aprendendo a jogar…)
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Isto é do Manuel Bandeira:
“Se queres a felicidade de amar, esquece a tua alma.
“A alma é que estraga o amor.
“Só em Deus ela pode encontrar satisfação.
“Não noutra alma.
“Só em Deus – ou fora do mundo.
“As almas são incomunicáveis.
“Deixa o teu corpo entender-se com outro corpo.
“Porque os corpos se entendem, mas as almas não.”
Esta comunidade orkutiana eu vi por acaso no blog de uma figura bonita, “chata e neurótica”. Chama-se Descansem em paz e traz listas com os perfis de membros do Orkut já falecidos. Sinceramente, não acho mórbido não. Se a Hilda Hilst estiver correta e a transcomunicação for algo banal para quem está do lado de lá, taí uma boa maneira de mandar uns recadinhos… (Entre nos perfis de algumas dessas pessoas e veja como a galera já está botando a idéia em prática.)
Entre 1997 e 1999, publiquei crônicas mensais na revista Guia da Farmácia, da ABAFARMA (Associação Brasileira do Atacado Farmacêutico), editada pela Editora Price e com distribuição nacional. (Cada farmácia associada recebia ao menos um exemplar.) Eu ainda não encontrei os disquetes com as cópias desses textos, mas, como venho dizendo ao longo desta semana, a cada dia me deparo com algo novo nas caixas que havia deixado aqui em São Paulo. Hoje encontrei algumas provas gráficas dessas crônicas em papéis do tipo Imation Matchprint, gentilmente cedidas, na época, pelo Rogério Franco, sócio da editora. Seria muito melhor, claro, se eu transcrevesse texto por texto para o site. Mas estou morreeeeeendo de preguiça de tal trabalho mecânico. Por isso, por enquanto, me limitarei a escolher algumas e colocar suas cópias escaneadas neste blog. A primeira se chama A visitante do planeta X e foi publicada na edição de Julho de 1998.
Ralph Waldo Emerson, a respeito do poeta Wordsworth, que reencontrou durante uma viagem à Inglaterra em 1848:
“Julga o Rio de Janeiro o melhor lugar do mundo, para uma grande capital…”
Minhas peregrinações pelo centro de São Paulo começaram em 1985, quando eu ainda ia completar 14 anos de idade. Eu e o Dante estávamos sempre inventando uma missão – comprar uma peça de reposição de autorama (Mabushi, Estrela, etc.), o disco de uma banda punk (Cólera, Inocentes, Garotos Podres, etc.), um relógio com joguinho, um tênis ou qualquer outro badulaque importado da Galeria Pajé, etc., etc. – o que sempre nos levava a perder todo um dia em mil e um becos e cenários decadentes da capital paulistana. Às vezes, sem mais nem menos, pegávamos o trem na Estação da Luz e íamos até Ribeirão Pires ou qualquer outra cidade, apenas porque no trem era possível fazer o que não se pode no metrô: passar de um vagão para o outro durante a viagem. (Na verdade, nossa primeira grande epopéia foi a travessia de boa parte da Zona Sul, a pé, em 1982 ou 1983, apenas para comprar um ioiô Super da Coca-Cola, que aliás foi mais difícil de encontrar que o Graal, já que nos bares e lanchonetes do percurso só havia o modelo Profissional. Eu teria ficado satisfeito – como de fato fiquei, pois adquiri mesmo um Profissional – mas nããããããão, o Dante nãão, claro que não, era o Super que ele tinha de comprar. Por conta disso, eu, que via minha querida rua Mariana Calache como centro do universo, me vi jogado num mundo hostil, alheio e interminável, cheio de “maloqueiros” tentando nos tomar a grana do ioiô e, mais tarde, o próprio ioiô. Mas isso é uma outra história…)
Meio sem querer querendo acabei virando um dos guias turísticos da cidade de São Paulo no Google Earth. Eu não sabia que a Google iria colocar minhas dicas no banco de dados central do programa. Para vê-las, selecione na guia Layers a opção Keyhole Community BBS. Depois observe as dezenas e dezenas de informações. Claro, não sou o único palpiteiro da cidade, mas caso vc encontre, por exemplo, o Pátio do Colégio (marco da fundação de São Paulo), a Biblioteca Mário de Andrade, a Biblioteca Latino-americana Victor Civita, o Centro Cultural São Paulo, o Parque do Nabuco (onde eu brincava quando criança), o Jardim Botânico, a Praça Benedito Calixto, o Largo São Francisco, o Mosteiro e Colégio São Bento, o Cemitério da Consolação (onde estão os “indícios” de que um certo Monteiro Lobato passou por aqui), etc., saiba que o Yuri Vieira que aparece na dica sou eu mesmo.
Quem passou pela adolescência física e mental – isto é, o período que vai dos 14 aos 25 anos de idade aproximadamente – antes do advento da internet, entenderá o título desta entrada. Nesta fase de intensa ebulição interior, é muito fácil – falo daqueles que sempre se interessaram por literatura, filosofia, ciência e arte – é muito fácil acreditar que se é um tipo de gênio, uma luz em meio à escuridão massificada. Principalmente se, aos dezesseis, enquanto vivia ilhado numa província da província Brasilis, devorou “Homens representativos”, de Ralph Waldo Emerson. Aliás, ainda bem que não havia internet entre 1985 e 1996. Talvez eu até tivesse ficado “famoso” – como muitos blogueiros hoje acreditam ser – com o registro de minhas especulações, viagens e surtos (hoje muito bem guardados), e , no entanto, nos dias que correm, com a chegada desses lampejos de maturidade que ora me assediam, eu estaria envergonhado comigo mesmo e certamente passaria mais tempo deletando textos e entradas de blog que propriamente escrevendo… Sim, embora a Vontade de Criar possa nos aproximar muito da Vida, na medida mesma dessa aproximação, mais e mais vamos nos sentindo como que elevados diante dos demais. E tudo, claro, não passa de vaidade, vaidade das vaidades. Antes da internet eu achava que meus, digamos, pares ou já estavam mortos ou muito próximos de morrer. Com uma única exceção, que não vem ao caso, praticamente não tinha interlocutores. Claro, possuía amigos e professores cuja inteligência admirava, mas nunca encontrava “pretensões de criar” tão grandes quanto a minha. Depois, com a internet – e já morando com a Hilda Hilst – descobri que esses pares não constituem dezenas, senão milhares de pessoas espalhadas pelo mundo, a maioria muito mais disciplinada e produtiva do que consigo ser. E os maiores dentre eles, percebi, não são os que se colocam mais ao alto, junto a seus ídolos, e sim exatamente aqueles que, em sua sabedoria escrita, demonstram a verdade da fraternidade de todos os homens, isto é, que somos todos nós, terráqueos, pares no sentido mais universal do termo. Enfim, obrigado, internet, por não me deixar enlouquecer (de novo), obrigado por ajudar a provar a mim mesmo que não sou nenhum suprassumo da humanidade, mas um mero contador de “causos”. (Adeus, aborrescência!!) Se Nietzsche tivesse um blog à sua disposição, teria certamente trocado idéias com Dostoiévski – cujo livro “Notas do subterrâneo” ele leu – e o grande romancista russo o teria então alertado sobre o maior (e talvez único) de seus erros. Qual? Amadureça e descubra. (Até lá medite sobre o arcano 16, A Torre, do tarô…)
A Hannah Arendt sempre aparece com um “detalhe” conceitual para mudar nossa ótica das coisas. Hoje descobri que os únicos humanos que ainda trabalham, segundo ela, são os artistas, o que deve chocar muita gente. (Vide A Condição Humana.) Os demais ou estão na atividade do labor (a maioria, incluindo os profissionais liberais) ou da ação. Bem, o labor seria a atividade humana condicionada pela necessidade, tendo, portanto, como finalidade única a manutenção da nossa vida biológica. O trabalho seria a atividade que cria o mundo “artificial” em que vivemos, ou seja, a atividade propriamente humana. Já a ação seria a atividade mediada pelo discurso, aquela que ocorre entre humanos sem mediações de ordem material. Para Arendt, depois que a esfera social engoliu a esfera privada e a pública, o consumo – característica própria do nosso corpo, cujo metabolismo é um perene consumo de recursos – o consumo tornou-se regra e, hoje, consumimos bens e serviços tal como um corpo absorve e metaboliza água e comida. Daí a maior parte das atividades humanas estarem representadas pelo labor. Já a arte é, digamos, um luxo, não é necessária à manutenção da vida material. Segundo essa lógica creio que se poderia afirmar que arte não é profissão e que quem tem por ofício “produzir” arte não tem nada de artista. Rilke certamente concordaria com ela. (Bom, poderia entrar em outros aspectos, mas estou viajando e esqueci o livro em casa…)
O blog anda meio devagar esta semana pois estou em São Paulo, na Vila Madalena, hospedado na casa do meu bróder Rodrigo Fiume, subeditor do caderno Vida& do Estadão. E o cara não tem internet em casa!!! Bom, estou vendo se meu destino vira uma esquina. Se for da vontade da Primeira Fonte e Centro, é claro…