Este post é uma resposta ao post do Pedro.
Meus avós paternos são baianos de Maraú, ao sul de Salvador, perto de Valença. Minha avó é católica e vive hoje com minha tia evangélica em Vitória, Espírito Santo. Minha avó sempre me diz que esse negócio de candomblé é coisa do pessoal de Salvador, que no restante da Bahia não dão muita atenção a isso não. Ademais, minha avó só foi tomar conhecimento do candomblé no Rio de Janeiro, quando minha tia, essa mesma com quem ela mora hoje, desapareceu numa praia da Barra da Tijuca, um local então deserto – estamos falando dos anos 50 – sendo mais tarde encontrada em transe no meio de uma roda de candomblé, as macumbas repercutindo. Ela tinha entre 7 e 10 anos de idade. Sim, minha tia foi médium durante muitos anos. (Ainda é, mas ela trata suas experiências hoje como manifestações e revelações do Espírito Santo). Cresci ouvindo meus parentes do Rio falando a respeito da “Ritinha” (um erê) e da “Vovó Maria Conga” (uma preta velha), entidades que ela recebia. (Na casa da minha avó, no Rio, havia um nicho cheio de brinquedos que eu, minhas irmãs e meus primos não podíamos tocar porque pertenciam à Ritinha. “Quem diabo é essa Ritinha que nunca vi mais gorda?”, matutava então.) Depois do candomblé, minha tia passou pela umbanda, kardecismo, seicho-no-ie, budismo, novamente catolicismo, etc. para só se encontrar na Igreja Cristã Maranata.
A principal atividade da minha tia, hoje, é consolar e confortar moribundos em hospitais, sem tentar convertê-los. Ela sempre indaga a respeito das crenças ou descrenças do doente, partindo daquilo em que eles depositam suas esperanças. Acha uma covardia se aproveitar de sua situação de fraqueza para fazer prosélitos. Os médicos e enfermeiras ficam aliviados quando ela aparece porque sempre levanta o astral dos doentes, mesmo o dos ateus. Enfim, minha tia conheceu a fundo o candomblé e, hoje, acredita que o sem fim de entidades, santos, deuses, ou como queiram chamá-los, apenas dá margem a que pessoas com certos desvios morais permaneçam nesses desvios, afinal, seus orixás de cabeça também são assim. “Se Ogum é assim, por que devo mudar?” Minha tia crê que a religião deve melhorar o ser humano, não justificá-lo. É óbvio que há muita gente honesta e sincera no candomblé, como em qualquer outra religião, mas certos pontos da doutrina podem apenas servir de becos sem saída para seus crentes.